Eu peguei tempo para escrever essa crônica sobre a final da Copa do Brasil de 2022. Talvez porque a ficha não caiu ainda, talvez porque vivi outras emoções com o Flamengo desde o 19 de outubro, e preciso explicar antes o que vivi o 19 de outubro. Vamos então voltar a esse dia, dia de final, dia de Flamengo ser campeão.

Já falei que queria muito ganhar a Copa do Brasil, porque era o único título com o Mundial que o Flamengo não tinha vencido desde que começou a ganhar de novo tudo, em 2019. Adoro também o formato de mata-mata, tem muita emoção e teve muitas frustrações nos anos passados, contra o Athletico Paranaense duas vezes, contra o São Paulo uma vez. Mas em 2022, Flamengo passou do Athletico nas quartas, do São Paulo nas semifinais, já tinha eliminado Altos e Atlético Mineiro antes. Agora, o Flamengo, e eu também, podiam sonhar alto.

Inclusive, já estava presente no Maracanã para o jogo de volta da semifinal, meu primeiro jogo no Maracanã em 2022. E agora estava de volta para a final, minha primeira decisão do Flamengo no Maracanã de sempre, pelo menos nessa incarnação. Já tinha assistido a uma decisão no Maracanã, quando a Seleção venceu o Peru para conquistar a Copa América de 2019, mas agora eu tinha o Manto Sagrado nas costas.

A escolha do Manto Sagrado para o dia 19 de outubro era importante. Deixei várias camisas do Flamengo na França, porque claro não cabia tudo numa mala de 20 quilos. Tenho só algumas no Brasil e escolhi finalmente o Manto Sagrado de 2014. Não um ano grande para o Flamengo, mas Flamengo vestiu essa camisa como campeão da Copa do Brasil. Então para a final da Copa do Brasil, me parecia a melhor escolha possível.

No 19 de outubro, cheguei bem cedo no Maracanã. Nunca tinha assistido a uma decisão do Flamengo no Maraca, mas já imaginava as confusões. E mais, ainda não tinha o ingresso na mão. Um ingresso de valor alta, em reais e no coração. Cheguei no Maracanã mais de duas horas antes do apito inicial e chegou o primeiro susto. Estava sem internet, sem saber como podia encontrar o Ramon que tinha meu ingresso. Reparei um cara que estava ligando alguém e o pediu depois para ele ligar o Ramon para mim. Aproveito aqui para dizer que o povo brasileiro é de uma gentileza extrema, ajuda plenamente e com o coração, sem esperar nada em troca. O cara não só ligou Ramon, ele também esperou comigo, apesar da pressa dos amigos dele para entrar no estádio. Esperou uns vinte minutos, me deixando só quando eu tinha o ingresso na mão.

Eu tinha o ingresso na mão e podia entrar no Maracanã, evitando as confusões do pré-jogo. O Maraca virou minha casa, desde a semifinal de volta contra São Paulo, fui de novo para o Fla-Flu, para as vitórias contra o Red Bull Bragantino e o Atlético Mineiro. No 19 de outubro, passei das seguranças para entrar no Maracanã. Sempre tenho um pequeno estresse antes de entrar no estádio, de o ingresso não ser valido, mas agora estava bom, estava dentro do Maraca, pronto para o jogo. Eu nunca tinha chorado de verdade no Maracanã, chorei no meu primeiro gol no estádio, lá no Fla-Flu de 2017, gol de Everton, mas era lagriminha, ficando no olho. Mas no 19 de outubro, nos corredores, eram lágrimas no rosto inteiro. Tive de parar a caminhada para recuperar das emoções. Clima de decisão é diferente.

Não sei o que é melhor, ganhar um título com o Flamengo ou assistir a um jogo no Maracanã, na Norte. Por sorte, fiz os dois ao mesmo tempo. Estou agora mais acostumado com o Maracanã, fui diretamente no 43, perto da Fla Manguaça. Subindo as escadas, chorei de novo, com lágrimas no rosto. Faltava uma hora antes do jogo, e o Maraca já era cheio, cantando, vibrando, fumando. Arrepiei, chorei, estressei. E depois cantei, alto, forte, às vezes errado, mas sempre com o coração.

O pré-jogo foi um dos maiores espetáculos que eu vi na minha vida. A entrada do time foi uma coisa pela qual não tenho as palavras suficientes, em português ou em francês, para descrever. Mas acho que meu maior jogo no Maracanã ainda é o Fla-Flu de 2017, o 3×3 na Sudamericana. Porque no 19 de outubro, a vibração da torcida caiu durante o jogo. Claro, com um ingresso tão caro, é mais difícil de ter o ambiente que já existiu no Maracanã faz tempo, que fez do Flamengo a melhor torcida do mundo. Na final contra o Corinthians, até na Norte, tinha pessoas quase não cantando durante todo o jogo. Algumas pessoas esperavam o lance do jogador, o chute perto do gol para apoiar o time, quando deve ser o contrário, é a torcida que empurra para o jogador fazer o lance decisivo.

A torcida podia ter uma responsabilidade em caso de derrota na final, como Dorival Júnior, que mexeu errado, fez o time esperar a reação do Corinthians. Flamengo fez um gol com 5 minutos de jogo, e depois esperou, esperou o Corinthians fazer o gol, que de fato aconteceu. Para minha primeira decisão do Flamengo, era um disputa de penalidades, e sem saber porquê, estava vestido de um pessimismo grande. Ainda mais quando Filipe Luís errou, na primeira tentativa.

E de novo, a torcida podia ter sido melhor, o barulho maior. É o fim do jogo, pode dar tudo que fica na voz ainda para empurrar o Flamengo, vaiar o Corinthians, mas teve de esperar o erro de Fagner para ter um ambiente digno do Maraca, digno do Flamengo. Depois, ainda mais estresse, ainda meu vestido de pessimista, nas tentativas de Gabigol e Everton Cebolinha. Mas Gabigol é ídolo da Nação, não tremeu, e fez tremer a torcida agora completamente louca. Na Norte, orações, lágrimas, abraços com o irmão desconhecido. E depois foi Rodinei, meu Rodilindo. Adoro ele, um jogador limitado, mas esforçado, de comportamento exemplar. Merecia o gol, como o Flamengo merecia o título. Chutou cruzado e fez, fez a torcida vibrar.

Depois foi um outro show nas arquibancadas que não merecia fim. Infelizmente, precisava pegar o último metrô e não foi possível de ficar muito tempo, nem de ver o time levantar a taça. Mas nesse 19 de outubro, já estava bem de emoções. Podia voltar tranquilamente, mas não evitei as confusões do pós-jogo. Na rampa, fogos eram lançados nos torcedores. Dei um pique para entrar no metrô, de novo com os olhos úmidos, mas agora por causa do gás de pimenta. O metrô chegou, e eu podia voltar a sonhar com meu Flamengo. Vi um título do Flamengo, no Maracanã, e ainda hoje, 27 de outubro, parece um sonho. Depois voltei na Rocinha, fui ver rapidamente a Roça Fla, o grupo de torcedores de lá, que espero vai virar minha casa para os jogos fora de casa. A Roça Fla que fez o show dela, com fogos e cantos. Dei um abraço para Fernando, vibramos juntos, quase duas horas depois do apito final. Ainda fui no bar onde já estou acostumado de ir, e vi a felicidade no olho da gerente, Irani, com o título do Flamengo. Flamengo ainda tem a maior torcida do mundo.

10 respostas para “Na geral #6: A Copa do Brasil eu tenho 4”.

  1. Avatar de Na geral #7: Eu fui no AeroFla – Francesguista

    […] minha maior emoção com o Flamengo desde que cheguei no RJ, e fui no Maracanã ver o Flamengo ser campeão da Copa do Brasil. Mas no AeroFla tinha uma coisa a mais, o povo era presente, com a voz alta e o coração batendo […]

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  2. Avatar de Jogos eternos #16: Flamengo 5×1 Corinthians 1983 – Francesguista

    […] último jogo entre Flamengo e Corinthians no Maracanã foi um jogo eterno, com o tetra na Copa do Brasil. O jogo de hoje também vai ser eterno, com a recepção dos tricampeões da […]

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  3. Avatar de Na geral #10: Encontrei Deus – Francesguista

    […] demonstração do que é a torcida do Flamengo. Em segundo, tem que ser um momento no Maracanã, o pré-jogo da final da Copa do Brasil contra o Corinthians. Terceiro, provavelmente um título, o da Libertadores, vivido na Rocinha. Tem […]

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  4. Avatar de Na geral #14: Fla virou e a Fla Paris comemorou – Francesguista

    […] foi um sonho, não apenas com Flamengo, mas foi um sonho ainda mais bonito com Flamengo. Ganhei a Copa do Brasil no próprio Maracanã, ganhei a Liberta com a Roça Fla. E o início de 2023 em relação ao Flamengo foi um pesadelo. […]

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  5. Avatar de Jogos eternos #80: Athletico Paranaense 0x1 Flamengo 2022 – Francesguista

    […] em 2020 e 2022, deu Flamengo. Ambos tiveram um título da Copa nesses anos, Athletico em 2019, Flamengo em 2022. Agora vem o quinto capítulo, talvez o último, para desempatar, para desfazer a […]

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  6. Avatar de Na geral #16: Meu adeus ao Maracanã – Francesguista

    […] muitas emoções na Norte, teve até título, contra o Corinthians na Copa do Brasil. Vi muitas coisas, fui muito feliz, vi Gabigol herdar da camisa 10 de Diego, vi a transformação […]

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  7. Avatar de Na geral #17: E Fla foi vice de novo – Francesguista

    […] foi a semifinal da Copa do Brasil, contra São Paulo, olha a ironia. Estava no estádio quando Flamengo foi tetra em cima do Corinthians de Vítor Pereira, agora sem ironia. Em 2023, eu estava na arquibancada do Maraca na terceira fase […]

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  8. Avatar de Jogos eternos #150: Flamengo 1×1 Corinthians 2022 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] meu caso com a final da Copa do Brasil de 2022. Já escrevi isso na crônica da época intitulada “A Copa do Brasil eu tenho 4”, foi minha primeira decisão no Maracanã e consegui um ingresso na Norte, só me interessava a […]

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  9. Avatar de Jogos eternos #207: Flamengo 2×0 Fluminense 2023 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] minha temporada ao Brasil, eu assisti no Maracanã ao título da Copa do Brasil de 2022 e tinha o sonho de ser campeão carioca, nacional e continental no Maracanã. Em 2023, Flamengo […]

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  10. Avatar de Na geral #21: O Gabigol voltou! – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] Enfim, ainda não sócio, ou mais preciso, não mais sócio, consegui ingresso para o Fla-Flu e o jogo contra Juventude na Norte, meu lugar onde assisti 25 jogos do Flamengo em um pouco menos de um ano entre 2022 e 2023. Mas para o jogo da final contra Atlético Mineiro, sabia que será impossível conseguir um ingresso sem ser ST. Então, comprei um chip brasileiro e voltei a ser sócio do Flamengo em 2024, espero mais um ano de glória para o Flamengo, sem Copa Libertadores sim, com Copa do Brasil sim. Anotei a data e hora de abertura do meu plano para os ingressos, dei uma aula de francês no topo da Rocinha e em vez de voltar de pé, peguei um mototáxi para voltar mais rápido no meu quarto, no horário marcado. Voltei na hora, liguei o celular e o computador para não perder o momento, e não tinha mais ingresso na Norte, o que não foi surpresa para mim. Mas ainda tinha em outros setores, ainda era possível para mim assistir a uma segunda final da Copa do Brasil depois da edição vencedora de 2022. […]

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O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”