A última temporada do segundo milênio, a primeira temporada desde o fim da Era Romário, a última temporada da Era Umbro, a primeira temporada da Era Nike, também a primeira da dupla Petkovic – Adriano, o ano de 2000 foi histórico para o Flamengo, com de novo muitas competições e muitos jogos, algumas alegrias e muitas decepções, e muitos, muitos craques. Mesmo sem Romário, o imortal Flamengo, com o apoio da ISL, era bem servido de craques, em cada posição: Júlio César no gol, Juan e Gamarra na zaga, Athirson como lateral, Leandro Avila como volante, Lê e Denílson nas alas, Reinaldo, Adriano e Edílson no ataque.
Mas, se o Flamengo era muito bem servido numa posição, era de uma das mais importantes no futebol do século XX, o camisa 10, o cérebro do time. E para a décima crônica dessa categoria, o Flamengo de 2000 tinha dois camisas 10, dois gênios, Petkovic e Alex. Sempre é muito difícil de jogar com dois camisas 10, dois jogadores centralizados, que precisam da bola para existir. Se alguém tem duas articulações no mesmo joelho, dificilmente ele conseguira andar sem mancar.
A temporada do Flamengo em 2000 começou com um torneio amistoso, o troféu São Sebastião, patrão de Rio de Janeiro e celebrado os 20 de janeiro. No 20 de janeiro, também dia aniversario da morte de Garrincha, Flamengo, de calça vermelha e camisa toda preta, começou a temporada da melhor maneira, com um título, em cima do Fluminense, gol de Lúcio. A estreia oficial, no torneio Rio – São Paulo, foi mais difícil. Duas derrotas, contra São Paulo e Botafogo, depois dois empates, contra Santos e Botafogo, e depois duas vitórias, de goleada, 5×2 contra São Paulo e 4×1 contra Santos.
O jogo contra São Paulo no Morumbi foi o palco do primeiro gol profissional de um dos maiores ídolos do Flamengo, nosso Didico Adriano. Trinta segundos depois de sua entrada no jogo, dominava a bola esquivando um defensor ao mesmo tempo, chutava com a perna esquerda e fazia um golaço contra uma outra lenda em início de carreira, Rogério Ceni. No jogo contra Santos, foi estreia de outro ídolo do Flamengo, também hexacampeão em 2009, Petkovic. O Pet estreou com golaço, duas fintas de pé direito, um chute cruzado de pé esquerdo. Em seguida, no antigo Maraca, um escanteio de Pet num canto onde voltaria a brilhar, um escanteio bem curvado, para o gol de Beto. Apesar das goleadas e do gênio dos futuros ídolos, Flamengo acabou sendo eliminado na primeira fase do Torneio Rio – São Paulo, conquistado pelo Palmeiras depois de um 4×0 contra o Vasco na final.
No campeonato carioca, Flamengo também começou com goleada: 5×0 contra o America. Depois, outra goleada, 4×0 contra Madureira. Nos dois jogos, Reinaldo marcou um doblete. Na Copa do Brasil, estreou com empate contra River lá no Piauí, mas não tremeu no Maracanã, Athirson fazendo o único gol da partida no início do jogo. No campeonato carioca, perdeu a invencibilidade contra o Botafogo, mas conquistou outras goleadas: 7×1 contra Friburguense e 6×1 contra Bangu, com destaque para Reinaldo e Athirson, 4 gols para cada um na soma dos dois jogos. Entre as duas goleadas, uma vitória de prestígio, de virada, contra Fluminense, de novo com gol de Athirson, que faria 12 gols em 32 jogos durante a temporada.
Depois, foi o momento da goleada sofrida, contra um arquirrival e um artilheiro bem conhecido, o Vasco de Romário. Num domingo de Pascoa, o Maraca virou centro de distribuição de chocolates, com a arrogância de Eurico Miranda, as provocações de Pedrinho e o gênio de Romário. Foi um jogo eterno, um grande jogo na história do Vasco. Parabéns para eles, ainda não era o momento da vingança para o Flamengo. Mas era para o técnico Paulo César Carpegiani a hora de sair, o técnico campeão mundial em 1981 pediu demissão no dia seguinte.
No lugar de Carpegiani, chegou um outro ídolo, ainda mais ídolo, Carlinhos, sobre quem já escrevi aqui. Ídolo como jogador, onde só jogou no Flamengo, e ídolo como técnico, onde muitas vezes foi chamado para sair de uma crise e onde ganhou o Brasileirão de 1987 e 1992. Em 2000, ajudou o clube a voltar para cima depois da goleada sofrida contra Vasco, também com a ajuda de Petkovic, que marcava a quase todo jogo, e quando não marcava, dava assistência. Petkovic foi eternizado em 2001, mas já jogou muito em 2000.
Flamengo conquistou a Taça Rio e encontrou de novo Vasco, agora na final do campeonato carioca. Agora sim, era hora de vingança. E chegou com juros e com título, Vasco sendo vice de novo. No jogo de ida, a goleada foi construída nos quinze minutos finais, mais um gol de Athirson, um golaço de falta de Fábio Baiano, e os vascaínos, já saindo do Maracanã, sem ter tempo de ver o terceiro gol, uma cabeçada de Beto. Sim, era a vingança de Pascoa. No jogo de volta, uma vitória de virada, com gol de empate de Reinaldo e depois Tuta roubando um gol de Juan. Flamengo bicampeão carioca, Vasco bi-vice. A vingança não era completa só porque o Vasco ia sofrer ainda mais no ano seguinte.
Mas o Flamengo desses tempos sofria de transtorno bipolar, era de uma alegria pura e no instante seguinte, os torcedores sofriam com a derrota mais dura. Nas quartas de final da Copa do Brasil, foi goleado 4×0 pelo Santos, em pleno Maracanã. Flamengo acabou eliminado depois de mais uma derrota contra Santos, 4×2 no Vila Belmiro. Em mais uma outra competição, a Copa dos campões regionais, também caiu nas quartas de final, contra Palmeiras. Na disputa de penalidades, Reinaldo foi o único a errar e o Flamengo foi eliminado.
Depois era tempo de mais uma competição, o Brasileirão, nesse ano chamado de Copa Jõao Havelange, com viradas de mesa, (des)organização do Clube dos 13 e da CBF e 116 clubes participando, apenas isso. E mais uma vez no Brasileirão desses tempos bipolares, Flamengo começou mal, com apenas uma vitória em 6 jogos. De nova, era hora de estrear em mais uma competição, a Copa Mercosul, competição em alta e de qual o Flamengo era o último campeão, com vitoria na final de 1999 contra Palmeiras. Apesar de um gol de Petkovic, Flamengo estreou com derrota no Maracanã, 2×1 contra River Plate, jogou que marcou a estreia de Edílson com o Manto Sagrado.
E mesmo com tantos jogos, tantas competições, Flamengo teve o tempo de fazer uma excursão na Europa. E Flamengo tinha mais um reforço de peso, um jogador que eu adorava em 1998, Denílson. A ISL dava recursos para o Flamengo ter um timaço. Flamengo perdeu o Troféu Villa de Madrid, disputado a cada ano pelo Atlético de Madrid, apesar de um gol de Edílson, que achou de novo as redes no segundo e último jogo na Europa, uma vitória 2×1 contra Betis, jogo onde Adriano também marcou. O Flamengo prometia no Brasileirão 2000.
De volta ao Brasil, o Flamengo enfrentava o Atlético Mineiro de Cláudio Caçapa, Mancini, Valdir Bigode e Guilherme. No Mineirão, Flamengo ganhou de virada com gols de Petkovic e Edílson, e grande atuação de Adriano. Quatro dias depois, no Estadio Nacional de Santiago, Flamengo goleava o Universidad de Chile por 4×0. O Flamengo prometia, nesse jogo Edílson abriu o placar num escanteio de Petkovic, e fez mais um no segundo tempo, agora ignorando completamente Petkovic, sozinho na frente do gol. Já dava para perceber que esse Flamengo prometia brigas de ego e vaidade também.
Flamengo goleou o Santos do Edmundo e venceu Gama, num jogo eternizado aqui. Depois, foi a vez de Alex de estrear com o Manto Sagrado, mas o craque do Palmeiras fez muito pouco pelo Mengo. Na Resenha de Primeira, Alex explicou: “Primeiro, eu fiquei 45 dias. Isso já resume tudo. O Flamengo tinha sérios problemas estruturais e eu encontro um grupo de muita qualidade individual, mas que ninguém queria nada. E quando eu digo que ninguém queria nada, eu também me incluo nisso porque eu poderia ter feito ‘N’ coisas diferentes e acabei não fazendo, entrei no ‘oba-oba’ que existia naquele momento e aí o rendimento do time foi muito abaixo”. No 10 primeiros jogos do Alex, Flamengo ganhou apenas um, empatou apenas um e perdeu 8. Coisa improvável vendo a qualidade do time. Flamengo perdeu 5 jogos consecutivos no Brasileirão, uma série fatal para o técnico Carlinhos, substituído por um outro ídolo, Zagallo.
Para o primeiro jogo de Zagallo, Flamengo precisava de um empate contra Vélez Sársfield para passar da primeira fase da Copa Mercosul. E fez mais, Adriano abriu o placar depois de jogada de Petkovic, e saiu para a entrada de Roma, que fez um golaço cheio de ginga. E três dias depois, um jogo eterno contra o Vasco, na frente de mais de 60.000 torcedores no Maracanã. Antes do jogo, um cumprimento entre os antigos desafetos, Zagallo e Romário. No jogo, um golaço de falta de Petkovic, na gaveta de Helton, quase um flashforward. No segundo tempo, um gol de Adriano, um outro golaço de Petkovic, agora driblando dois jogadores do Vasco e por fim, um pênalti de Edílson. Flamengo 4×0 Vasco, mais uma vingança, ainda não completa, ainda não era o 27 de maio de 2001. Mas nesse fim do segundo milênio, a esperança voltava na Gávea, o Flamengo podia realizar um ano histórico.
Mas o Flamengo dessa época é assim, meio feliz, meio infeliz, com uma esperança na mesma altura do que a decepção. Flamengo empatou contra Fluminense, com gol de outro craque, agora zagueiro, o paraguaio Carlos Gamarra, e perdeu contra o Internacional e o Cruzeiro. Entre esses jogos, perdeu duas vezes contra o River Plate, e acabou eliminado nas quartas de final da Copa Mercosul, apesar de gols de Edílson, Juan e Petkovic no jogo de volta. Um timaço, que não saiu do papel.
Flamengo não passou da primeira fase do Brasileirão e viu o arquirrival Vasco conquistar a Copa Mercosul e o Brasileirão. Os dois últimos jogos, vitórias contra o Corinthians e Vitoria, só serviram para ver os três primeiros gols de Alex, os únicos, golaços de canhoto, e um pouco mais do gênio de Petkovic e Edílson. Só serve para se lamentar, pensando o que poderia ter feito o Flamengo de 2000.









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