Com todo respeito ao Clássico dos Milhões, o Fla-Flu é o maior e o melhor clássico do Rio. É mais que um jogo, como poucos no mundo, talvez Real Madrid x Barcelona, Boca x River, Celtics – Rangers, El Clásico, El Superclásico, the Old Firm, o Fla-Flu. Nesse jogo, não importa a posição na tabela, a forma dos dois times, os jogadores suspensos ou lesionados, o jejum do centroavante, a fase ruim do goleiro, só importam os 90 minutos e os acréscimos, onde tudo pode acontecer. Cada Fla-Flu, desde o 7 de julho de 1912, tem sua própria história, coloca mais um capítulo no grande livro do Fla-Flu, até o próximo Fla-Flu.
Tinha então uma infinidade de possibilidades para falar do Fla-Flu. Na verdade, não uma infinidade, mas um número bem definido: 435, como o número de Fla-Flus em mais de 100 anos de história. Na verdade, um pouco menos, esquecendo das 137 vitórias do Fluminense, o resultado menos visto na história do Fla-Flu. Ficavam 160 vitórias do Flamengo e 138 empates. Na verdade, um pouco menos, já que escrevi muito sobre o Fla-Flu: 1963, 1976, 1985, 1986, 1989, 1991, 1993 e 2017. Ainda assim, ficavam muitas, muitas possibilidades.
E eu vou de um Fla-Flu inesquecível de 2011. Os dois times vinham de vitórias importantes, Flamengo no Morumbi contra o São Paulo de Luís Fabiano que reestreava com o Tricolor nesse jogo, e Fluminense contra o Santos de Neymar com um gol no minuto 50 do segundo tempo. Assim, antes da 28a rodada, os dois times tinham 44 pontos, brigando para o G-5, Fluminense dentro, Flamengo de fora, por causa de número de vitórias menor do que o rival. Os dois times tinham desfalques importantes, Ronaldinho para Flamengo e Fred para Fluminense, ambos convocados com a Seleção brasileira. Mas o Fla-Flu é maior do que qualquer personagem.
Faltava porém um personagem muito importante na história do Fla-Flu: o próprio Maracanã, já em obras para a Copa do Mundo de 2014. Assim, o Fla-Flu foi deslocalizado no Engenhão e apenas 25.513 pessoas assistiram ao jogo no 9 de outubro de 2011. Com também as suspensões de Aírton e Willians, Vanderlei Luxemburgo escalou Flamengo assim: Paulo Victor; Léo Moura, Welinton Silva, Alex Silva, Júnior César; Maldonado (Bottinelli), Muralha, Renato Abreu; Thiago Neves, Diego Maurício (Negueba), Deivid (Jael). Para Fluminense, um técnico histórico no Flu e bem menos histórico no Fla, Abel Braga, que escalou Diego Cavalieri no gol, a dupla Rafael Sóbis – Rafael Moura no ataque e um craque no meio de campo, Deco.
O Fla-Flu era animado mas os gols começaram a chover só no segundo tempo. Na hora do jogo, Rafael Sóbis abriu o placar para Fluminense depois de bom cruzamento de Leandro Euzébio. No banco, Vanderlei Luxemburgo reagiu com três mudanças de uma vez só. Saiu Diego Maurício, que tinha perdido a bola na jogada do gol, para a entrada de Negueba, e Jael entrou no lugar de Deivid. Para ter um time mais ofensivo, saiu Maldonado e entrou Darío Bottinelli. Sempre gostei quando tinha um gringo, um argentino no Flamengo. Ilidiu-me muito com Maxi Biancucchi, que de Messi, tinha só a mesma família. Já Bottinelli era melhor de bola, às vezes até relembrava Petkovic, e era um exímio batedor de faltas. E tinha um nome parecido a um outro ídolo do Fla, de outra época, Rondinelli. Mas a hora de Bottinelli ainda não tinha chegado nesse Fla-Flu.
As escolhas técnicas e táticas de Luxa funcionaram e Flamengo reagiu rapidamente. Num cruzamento alto de Júnior César, Jael brigou no ar pela bola, que foi nos pés de Negueba, que chutou, que cruzou, quem sabe, bola foi nos pés de Thiago Neves, que fez valer a lei do ex e empatou. Abel Braga também foi feliz nas mudanças, com a entrada de Souza e do jovem argentino Lanzini. O primeiro cruzou para o segundo, que desempatou de cabeça. Faltando dez minutos no jogo, o Tricolor estava perto de ganhar seu primeiro Fla-Flu do ano. Mas agora era hora de outro argentino saindo do banco, Darío Bottinelli.
Num pique do jovem Muralha, que não jogava fazia um mês, Lanzini fez falta, a 25-30 metros do gol, bem no centro. Bottinelli alternava titularidades e jogos saindo do banco, e não tinha marcado desde o jogo contra o São Paulo, no primeiro turno. Um turno inteiro sem marcar. Thiago Neves queria bater a falta, mas o gringo insistiu. Ficava só o destro Bottinelli e o canhoto Renato Abreu. Renato Abreu deixou, Bottinelli correu, chutou, achou a gaveta de Cavalieri, com a ajuda do travessão. Um golaço.
Bottinelli já estava na história do Fla-Flu, mas três minutos depois, fez outra magia. Depois de um passe do capitão Léo Moura, Bottinelli recebeu e fez um drible curto para abrir o ângulo no pé direito. Bateu forte, bateu cruzado, bateu com efeito, bateu no gol. Bottinelli virava o jogo em três minutos, se tornava o herói improvável de um Fla-Flu inesquecível. Relembro bem que estava em Paris na casa de minha mãe assistindo ao jogo. Esse Fla-Flu foi tão marcante que ele marcou uma época para mim, perto do final de meus estudos, morando com minha mãe e minha irmã. Ganhar o Fla-Flu nunca é normal, sempre é especial, e o Bottinelli, com esses dois golaços no final do jogo, fez desse jogo um Fla-Flu ainda mais especial.








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