Times históricos #21: Flamengo 1951

O ano de 1951 foi um ano de mudanças, de inícios também, não só pelo Flamengo, mas também para o futebol brasileiro. Alguns meses antes, nasceu o colosso Estádio Municipal, o Gigante do Derby, já rebatizado Maracanã depois do fracasso da Seleção na Copa de 1950. Mas agora Rio, e Flamengo, tinham um estádio digno das apresentações dos ídolos do clube, um estádio para conquistar ainda mais massas rubro-negras.

O campeonato carioca de 1950, o primeiro da Era Maracanã, estendeu-se até o início do ano de 1951. Flamengo estava já sem chance de título, com um campeonato muito ruim em 1950: 6 vitórias, 3 empates e 9 derrotas, perdendo até contra Madureira e Olaria! Mas Flamengo iniciou 1951 de maneira linda, com uma vitória 5×2 no Fla-Flu, três gols de Durval, um de Esquerdinha, que se chamava assim porque era canhoto, e um de Gringo, não sei porque se chamava assim porque era sergipano. Flamengo ainda tinha os ídolos Dequinha e Biguá, e dois jogadores massacrados – não tem outra palavra – depois do Maracanaço, Juvenal e Bigode.

Para fechar o campeonato carioca 1950, finalmente vencido mais uma vez pelo Vasco e seu Expresso da Vitória, Flamengo perdeu 3×4 contra Bangu, mais uma derrota, mas menos dura do que no jogo do ida, quando Flamengo perdeu 6×0 contra o Bangu de Zizinho! O antigo ídolo do Flamengo foi cedido algumas semanas antes pelo presidente Dario Melo de Pinto, que ainda tentou convencer a Nação que Zizinho era em fim de carreira. Uma jogada infeliz, que custou ao Melo de Pinto o posto de presidente. No 15 de janeiro de 1951, tomou posse talvez o mais apaixonado dos presidentes da história do Flamengo, Gilberto Cardoso. No primeiro amistoso da temporada de 1951, Flamengo ficou no 3×3 contra o Atlético Mineiro, 2 gols de Durval e um de Gringo. Dois dias depois, na já referida derrota contra Bangu, 2 gols de Durval e um de Esquerdinha. Flamengo tinha um trio mortal no ataque.

Depois de mais um empate num amistoso contra o Atlético Mineiro, com mais um doblete de Durval, Flamengo estreou no Torneio Início do torneio do Rio – São Paulo, a única edição da história, que imitava o torneio início do campeonato carioca: jogos de tempo curto, no mesmo dia, com critério de desempate o número de escanteios. Outros tempos do futebol. Mas o Maracanã já permitia de ter um publico grande, e Flamengo foi eliminado na estreia contra o Corinthians, depois de um empate 0x0, perdendo 2×1 no número de escanteios. Na final, Bangu venceu o America. Outros tempos do futebol.

Flamengo fez o primeiro jogo da história do Maracanã no Torneio Rio – São Paulo e iniciou de uma maneira linda, com goleada 5×2 contra a Portuguesa. Jogo marcou a volta como técnico de Flávio Costa, que conquistou o primeiro tricampeonato carioca de Flamengo, entre 1942 e 1944, antes de ganhar ainda mais prestígio com o Expresso da Vitória do Vasco, antes de perder prestígio com o Maracanaço. E perdeu ainda mais com uma dura goleada tomada contra Palmeiras, futuro campeão do torneio Rio – São Paulo 1951, uma derrota 7×1 com quatro gols de Liminha. Flamengo fechou a competição no quarto lugar, com melhor resultado uma vitória 4×2 contra São Paulo no Maracanã, também o primeiro jogo oficial de um futuro ídolo do clube, Índio, chamado assim por causa da origem, e que será o herói da classificação da Seleção na Copa do Mundo de 1958, fazendo o gol do empate no Peru, antes do gol decisivo de Didi no Maracanã.

O Maracanã também era o palco de jogos amistosos e Flamengo goleou em 1951 o Internacional, uma vitória 6×3 com 2 gols de Hermes e um de Índio. Em seguida, Flamengo estreou no Torneio Municipal do Rio de Janeiro. Eram outros tempos do futebol e do avião, não tinha possibilidades de um torneio nacional e os melhores times ainda ficavam no eixo Rio de Janeiro – São Paulo. Além do campeonato estadual, tinha outros torneios para os times do Rio de Janeiro. Flamengo estreou com um sucesso 1×0 contra Bonsucesso, gol de Hélio, mas perdeu no segundo jogo, de novo contra Bangu. Flamengo se recuperou com uma das maiores goleadas da sua história, um 13×0 contra uma seleção de São Lourenco. O antigo ídolo Dequinha fez quatro, Índio e Adãozinho fizeram três, Esquerdinha, Pavão e Nestor completaram a goleada. Também congelou Frigorífico 7×0, de novo com um hat-trick de Índio, um novo ídolo da Nação. Nos amistosos, eram só goleadas, 5×2 contra Rio Branco, com 4 de Hermes, e 6×0 contra Goytacaz. No Torneio Municipal, Flamengo era bem, com 3 vitórias, 2 empates e 1 derrota. E o presidente Gilberto Cardoso tomou uma decisão que mudou a história do clube.

Apesar do fracasso no Maracanaço, o futebol brasileiro era agora muito respeitado no mundo. Era sinônimo de futebol-arte, de dribles, de espetáculo, de estádio cheio. E pela primeira vez na sua história, Flamengo embarcou na Europa, começando a excursão na Suécia, com um jogo contra Malmö, time que o Flamengo já tinha enfrentado duas vezes no Rio de Janeiro em 1949 e que ajudou a organizar a turnê. No estádio Rasunda, futuro palco do primeiro título mundial da Seleção em 1958, Flamengo começou com uma vitória, Esquerdinha fazendo o único gol do jogo. De novo no estádio Rasunda, Flamengo goleou 6×1 AIK, um dos melhores times da Suécia, na frente de Gustavo VI, o novo Rei da Suécia, depois de um reino de 43 anos de seu pai, Gustavo V.

Flamengo voltou a jogar contra Malmö, mas no estádio Idrottsplats, onde o time sueco estava invicto há 47 jogos. E Malmö perdeu, Nestor fazendo para o time rubro-negro os dois gols do jogo. Flamengo ainda venceu dois times suecos, foi na Dinamarca onde venceu um time que era quase o time olímpico de 1948 e 1952, e voltou na Suécia, de novo, ainda, sempre, com vitórias, 2×0 contra Halmia e 6×1 contra Norrköping. Pela primeira vez de sua história, Flamengo jogou no meu país, a França, na minha cidade, Paris, no Parque dos Príncipes. Segundo o jornal francês Le Monde, Flamengo derrotou “com uma elegante facilidade”, o Racing Paris, finalista da Copa da França 1950, com dobletes de Hermes e Adãozinho e gol de Esquerdinha para um placar final de 5×1. Flamengo fazendo show na França, outros tempos do futebol.

Flamengo concluiu a excursão com uma vitória 3×0 no Portugal contra Belenenses, uma excursão perfeita: 10 jogos, 10 vitórias, 32 gols em favor e apenas 4 gols contra. Jogando com um time reserva no Torneio Municipal, Flamengo ficou no 7o lugar, mas tinha conseguido uma coisa mais valiosa: conquistou a Europa, o publico e a imprensa, e também impressionou o Jornal dos Sports, que enviou na Europa dois jornalistas para acompanhar a excursão. Na volta do time ao Brasil, o Jornal dos Sports manchetou: “Carnaval em junho: chega o Flamengo!”. Os jogadores foram aclamados por uma massa rubro-negra do aeroporto do Galeão até o Largo da Carioca, e não foram só rubro-negros que acolheram o time, até o presidente do Botafogo, Carlito Rocha, acompanhou o desembarque. O time, que incorporou o zagueiro Pavão e o atacante Adãozinho, era a alegria da torcida flamenguista e o orgulho do Brasil, um ano depois do Maracanaço.

De volta ao Brasil, Flamengo disputou o Torneio Início, outra competição entre clubes cariocas antes do campeonato estadual, também em um dia só. Flamengo venceu Madureira, America, Fluminense e Bangu, e conquistou o título. Duas semanas depois, Flamengo estreou no campeonato carioca, que não vencia desde 1944. E Flamengo iniciou o campeonato carioca 1951 de maneira linda, com bom sucesso 2×1 contra Bonsucesso, gols de Hermes, que já tinha sido o artilheiro da excursão na Europa com 9 gols em 10 jogos, e de Índio, o novo grande nome do ataque rubro-negro. Flamengo ainda era irregular, com empate contra Olaria, vitória contra Canto do Rio, mas derrotas contra Botafogo e Bangu. O favorito do campeonato ainda era o último campeão, Vasco, que tinha vencido seus 4 primeiros jogos, incluindo uma vitória 4×2 contra o Fluminense de Didi, Castilho e Telê.

Vasco era na época uma máquina, o Expresso da Vitória, vencedor do campeonato carioca em 1945, 1947, 1949 e 1950. O time era bom em todas as linhas, da defesa até o ataque, do goleiro até o centroavante. Os jogadores era de nível da Seleção, com 6 em campo com a camisa branca da Seleção brasileira no dramático 16 de julho de 1950. Esse time ganhou muitos jogos, perdeu muitos poucos. E contra Flamengo, perdia nenhum. A última vitória do Flamengo no Clássico dos Milhões vinha do Torneio Relâmpago do Rio de Janeiro no 8 de abril de 1945. Depois, Flamengo tomou um 5×1 um mês depois e nunca mais ganhou. Até o 16 de setembro de 1951, foram 20 jogos, 15 vitórias do Vasco, 5 empates, nenhuma vitória do nosso Mengo. Um longo jejum, o pior da história do Clássico dos Milhões. Esse jogo merece ser eternizado nesse blog, vamos falar aqui que Vasco abriu o placar no início do jogo, e Fla virou, com gols de Adãozinho e Índio. Na frente de mais de 120.000 espectadores no Maracanã, Flamengo pôs fim ao jejum, um jogo que consagrou Rubens, um meio-campista clássico, que fazia seu primeiro jogo com o Manto Sagrado e que merece sua crônica na categoria dos ídolos.

Flamengo ficou irregular durante a campanha do campeonato carioca, incluindo uma derrota 1×0 no Fla-Flu, onde o Jornal dos Sports promoveu um concurso de torcidas, com balões, confetes e batucada. O recém Maracanã transformava mais uma vez o Fla-Flu. Além da presença no estádio do presidente Getúlio Vargas, o jogo marcou também a estreia de mais um novo ídolo do Flamengo, o atacante Joel, futuro campeão do mundo 1958. Flamengo também se ofereceu mais amistosos de prestígio. No 15 de novembro, dia do aniversário do clube, Flamengo jogou pela primeira vez contra Boca Juniors, e mesmo sem vitória, Flamengo iniciou esse confronto clássico de maneira linda, um empate 2×2 com gols de Hermes e Rubens. Também jogou contra outro time argentino, Independiente, também um empate, mas com ainda mais gols, um 5×5, dobletes de Hermes e Adãozinho e gol de Esquerdinha para Flamengo.

Flamengo fechou o ano já sem esperança do título no campeonato carioca mas com três vitórias, uma contra Bangu que finalmente ajudaria Fluminense a conquistar o título, mais um sucesso 2×0 contra Vasco, gols de Joel e Rubens, e no 29 de dezembro de 1951, uma goleada 5×2 sobre Olaria. Flamengo não conquistou títulos em 1951, mas conquistou a Europa. Flamengo não conquistou troféus em 1951, mas conquistou novos ídolos, como Pavão, Adãozinho, Índio, Joel e Rubens, que escreveram algumas das páginas mais lindas da história do Flamengo nos anos seguintes.

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O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”