Jogos eternos #129: Guarani 2×3 Flamengo 1982

Sem jogo no meio de semana, vamos aproveitar da pausa para homenagear mais uma vez Zico, que completou neste domingo 71 anos. Campeão de tudo em 1981, Flamengo continuou no início de 1982, um ano histórico no Francêsguista, com o Brasileirão.

Depois de vários jogos, Flamengo chegou na semifinal, contra Guarani. Hoje na Série B, Guarani foi um time poderoso algumas décadas atrás, tornando-se o primeiro campeão brasileiro do interior, em 1978. Quatro anos depois, o time dirigido pelo José Duarte foi o melhor ataque do Brasileirão e tinha dois craques diferenciados, Jorge Mendonça e Careca.

No jogo de ida no Maracanã, Flamengo estava desfalcado de Tita e Nunes, substituídos pelos Chiquinho e Peu. No primeiro tempo, Flamengo abriu 2×0 com gols de Zico e Peu, mas quase deixou escapar a vitória no segundo tempo depois do gol de Lúcio, outro craque do time bugrino. O jogo de volta no Brinco de Ouro prometia.

O jogo prometia e o Brinco de Ouro estava cheio, com 52.002 pessoas, um recorde até hoje, provavelmente para a eternidade. Como a atuação de Zico está na eternidade. No 15 de abril de 1982, o técnico Paulo César Carpegiani escalou Flamengo assim: Raul; Leandro, Marinho, Figueiredo, Júnior; Andrade, Adílio, Zico; Tita, Lico, Nunes. Um dos maiores times da história do Flamengo, com apenas uma troca em relação ao time que conquistou o Mundial contra Liverpool, Figueiredo sendo escalado na zaga no lugar de Mozer.

E o Brinco de Ouro, ainda cheio de fumaças, pegou fogo bem no início do jogo, quando Jorge Mendonça, esquecido na segunda trave, abriu o placar num escanteio. Com esse resultado, quem chegava na final era o Guarani, apoiado pelos mais de 50 mil torcedores. E vinte minutos depois, Zico botou frio no estádio. Vale a pena voltar à jogada antes do escanteio. Zico recebeu no meio de campo, fez um drible “à la Cruyff” para escapar de um adversário, e achou de trivela Lico, que achou de volta Zico com um toque de calcanhar. Zico errou no domínio mas, antes da chegada de um defensor, se recuperou com um toque leve de bico. Era a jogada que precisava ser feita, impressionante a capacidade de adaptação de Zico, ainda mais com uma velocidade para pensar tão alta. A bola foi nos pés de Nunes, que cruzou, um adversário chegou na bola para afastar o perigo de cabeça. Escanteio para o Flamengo.

Na cobrança, Lico para o ambidextro Júnior, que dominou pé direito, cruzou imediatamente pé esquerdo. De novo, Zico foi perfeito. Percebendo a curva do cruzamento de Júnior, Zico fez um passo atrás para cabecear, sem chance para o goleiro Wendell. Apesar do gol de empate, o estádio ainda era um caldeirão. Relembra Zico no livro Zico, 50 anos de futebol, de Róger Garcia e Roberto Assaf: “Um dos jogos mais complicados foi contra o Guarani, nas semifinais, lá em Campinas. No Rio, vencemos por 2 a 1, eles começaram fazendo 1 a 0. Com a vitória iriam à decisão. Eu empatei de cabeça. Então teve um córner a nosso favor e os caras resolveram jogar tudo dentro do campo. Foi um dia em que eu apelei… com o Leandro. Ele queria bater e eu falei para ele: ‘Não vai bater o córner porra nenhuma. Sai daí’. Aí eu puxei o Leandro pra fora, voltei para dentro do campo, cheguei lá, botei a bola no córner e falei para o Carlos Rosa (o juiz gaúcho Carlos Rosa Martins), que me respeitava muito: ‘Não vamos bater esse córner enquanto não parar isso aí’. Olha, os caras xingaram muito, levei tanta latada… mas depois acalmaram”.

Guarani dominava o jogo, e Flamengo foi salvo algumas vezes pelo goleiro Raul Plassmann, mais um ídolo desse time inesquecível. Depois, Júnior abriu para Zico, que fez um gol, anulado por um impedimento muito duvidoso. E no início do segundo tempo, Zico acalmou mais uma vez a torcida do Guarani, recebendo um passe de Lico. Com 30 metros de distância, Zico chutou de primeira, fez seu segundo gol do dia, seu segundo golaço.

Flamengo estava perto da final e o zagueiro Figueiredo, que morreu precocemente em 1984 com apenas 23 anos de idade, se infiltrou na defesa bugrina num estilo inabitual, mas o juiz não marcou um pênalti que parecia evidente. E alguns minutos depois, Zico achou Tita no espaço, que achou Adílio na profundidade. O goleiro defendeu o chute, a bola voltou nos pés de Lico, que chutou na cabeça de um defensor do time de Campinas. Agora, o juiz marcou um pênalti inexistente, que não faz esquecer a grande atuação do Flamengo e de Zico. Sem tremer, Zico fez o pênalti, completou o hat-trick, botou Flamengo na final apesar do gol de Jorge Mendonça nos instantes finais, colocou o Fla perto do título, que seria efetivado num outro jogo eterno, contra Grêmio. O Flamengo era o campeão e para a eternidade, Zico seu maior ídolo.

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O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”