Jogos eternos #269: Flamengo 6×2 Vasco 1943

Flamengo vem de uma goleada contra Juventude e pode conhecer outra hoje, já que joga contra Vasco, no Maracanã. No ano passado, Vasco também mandou seu jogo contra Flamengo no Maraca e se deu mal: vitória 6×1 do Flamengo, maior goleada do rubro-negro na história do Clássico dos Milhões. Desde lá, Flamengo não perdeu contra Vasco e já são 10 jogos invictos contra o maior rival. Vamos voltar para hoje à precedente maior goleada rubro-negra em cima do Vasco, em 1943.

Em 1943, um ano histórico no Francêsguista, Flamengo também tinha uma longa série invicta contra Vasco. Não perdia contra o cruzmaltino desde 1941, ou seja, 12 jogos invictos. Porém, eram só vitórias apertadas, a maior um 3×1 na Gávea. Outra série invicta do Mengo era no campeonato carioca de 1943. Não perdia desde uma derrota 2×1 contra America no início do primeiro turno, ou seja, também 12 jogos invictos. Flamengo também vinha de outra goleada, um 5×1 sobre Bonsucesso, com 3 gols de Pirillo, um de Zizinho, um de Perácio.

Flamengo era ainda mais avassalador com a chegada de um jovem paraguaio, que se tornou ídolo no Flamengo e no Francêsguista, Modesto Bria. Estreou no Fla-Flu e fez outros dois jogos antes de conhecer seu primeiro Clássico dos Milhões. No 3 de outubro de 1943, o técnico Flávio Costa escalou Flamengo assim: Jurandyr; Domingos, Newton Canegal; Biguá, Modesto Bria, Jayme de Almeida; Zizinho, Jacir, Vevé, Pirillo, Perácio.

O jogo aconteceu no General Severiano e já antes do match como se falava na época, Flamengo parecia ser o dono do jogo. Escreveu no Jornal dos Sports o imortal Mário Filho: “Diante de mim passaram os jogadores. Por onde eles passavam acordavam palmas de entusiasmo. Parecia que só havia Flamengo em General Severiano. Eu observara isso antes, quando o Vasco entrara em campo. As palmas que o Vasco recebeu não foram muitas. Bastou que o Flamengo aparecesse para que os braços se agitassem no ar”. Flamengo dominou o início do jogo, sem fazer o gol. Vasco reagiu e quem brilhou foi o também imortal zagueiro Domingos e suas eternas domingadas, como lembrou Mário Filho: “Domingos pôde realizar duas jogadas semelhantes ao dribling de Dorado em 1931, por ocasião da primeira Copa Rio Branco. Já todo o mundo se levantara: Lelé estava a cinco passos de Jurandyr, pronto para desferir o shoot. Domingos, aparentemente vencido, tomou-lhe a bola no instante do shoot e saiu andando com ela. Na segunda vez, nas mesmas circunstancias, Domingos tomou a bola de Isaías”.

Flamengo voltou a dominar o jogo e Vasco resistiu, quase até o final do primeiro tempo. Quase. Sem vídeo do jogo, confio na crônica de Mário Filho: “Vasco resistiu bastante tempo. Enquanto teve esperanças de vencer o match o Vasco entrou mostrando certa articulação. O goal de Vevé, aos trinta e nove minutos, não o abalou. Foi um goal perfeito o de Vevé. A bola viera de Pirillo, abrindo a defesa do Vasco. Vevé dominou a bola, avançou, shootou quando tinha cem probabilidades de marcar o goal. Vevé soube prender a bola, soube dar um corte em Rubens para ficar só diante de Oncinha. E já só esperou, desequilibrando o keeper do Vasco, mandando a bola com violência para o outro canto”. O Flamengo tinha um gol de vantagem e mandava inteiramente o jogo. O segundo tempo prometia mais.

E logo no início do segundo tempo, Perácio fez dois gols, quase matando o Vasco. “Perácio ampliou o score com um tiro de trinta metros bem no canto. Não foi frango. Oncinha atirou-se, na verdade, um pouco atrasado. Se defendesse teria feito uma intervenção milagrosa. De qualquer maneira o dois a zero no placard modificou o panorama do match. Ainda a sorte da peleja não fora decidida. Perácio se encarregou disso logo depois, com um goal inteiramente seu […] Oncinha e Rubens se chocaram, a bola apareceu de repente diante de Perácio que a mandou para o fundo das redes. Domingos atravessou o campo para abraçar Perácio. Fora-se a última esperança do Vasco. Bastou que o match recomeçasse para que se visse o Vasco inteiramente nas mãos do Flamengo”.

Eu não resisto a vontade de continuar a citar a maravilhosa crônica de Mário Filho, ainda mais com um Vasco na agonia: “Até então o Vasco se defendera bem ou mal, se armara como um team de football. Depois se desarticulou inteiramente, ficou à mercê do Flamengo. O domínio do Flamengo tornou-se absoluto. O placard de três a zero prometia multiplicar-se. O Vasco não podia mais opor grande resistência. E aí se viu o seguinte: o Flamengo trabalhando para dar um goal a Pirillo. Perácio fizera dois goals. Só, diante de Oncinha, ele não shootou, deu a bola para Pirillo empurrar para as redes. O delírio do Flamengo chegou ao auge”. Dois minutos depois, Pirillo fez outro gol, o quinto do Mengo, e a torcida vascaína já saía do General Severiano, faltando o gol de honra se pode se chamar assim, inscrito por Chico.

Fecho a crônica, que foi mais um trabalho de escrivão, com as palavras de Mário Filho, sobre o gol vascaíno e o final do jogo: “Ouviu-se um ó de desapontamento. A torcida do Flamengo queria o zero até o fim. O zero não ficou até o fim, mas o Flamengo foi para a frente e Zizinho, de cima da área, shootou com força no canto direito de Oncinha. Era o sexto gol do Flamengo […] O Flamengo parou mandando-se. Por isso os ataques do Vasco no fim do match não representaram uma reação. O Flamengo se deixou atacar, desinteressando-se, por assim, dizer, da partida. O goal de Lelé foi uma consequência do desinteresse do Flamengo. Com seis a dois o Flamengo só queria ouvir o apito do juiz”. O juiz finalmente apitou o final do jogo, encerrando a demonstração do Flamengo, o calvário do Vasco.

“O único team que passara em todos os exames com distinção e louvor fora o Flamengo. Na hora de decidir o Flamengo decidiu o Flamengo decidira mesmo” ainda escreveu Mário Filho. Uma semana depois, com outra goleada sobre Bangu, Flamengo confirmava o título carioca, aprimorava a goleada em cima do Vasco. Repito, o 6×2 de 1943 foi a maior goleada rubro-negra no Clássico dos Milhões durante 81 anos.

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O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”