Jogos eternos #298: Flamengo 2×1 Athletico Paranaense 2023

Hoje eu vou de uma lembrança nostálgica e pessoal de um jogo que aconteceu exatamente dois anos atrás. E a vida pode mudar muito em dois anos. Morei um ano no Rio de Janeiro entre 2022 e 2023 e neste início de julho de 2023, me aproximava do final de minha temporada. Não contava mais os meses que me restavam no Brasil, mas as semanas, quase os dias.

Para o final, Maxime e Julie, um casal de amigos franceses, foram me visitar. Foram no Rio de Janeiro duas semanas de muitas experiências, trocas, risadas e lembranças inesquecíveis. No dia do 5 de julho de 2023, apesar da tristeza da saída chegando, acordei com um sonho ainda vivo na minha cabeça. Faltando dois dias para meu aniversário, Maxime e Julie me ofereceram um passeio de helicóptero no Rio de Janeiro, da zona oeste até a zona sul, girando 1,5 vez em torno do Cristo. Com certeza, se o dinheiro permite, é uma das 10 coisas a fazer no Rio de Janeiro. Outra coisa que cada guia recomendaria, é assistir a um jogo do Flamengo no Maracanã.

E fui muitas vezes, sempre que podia, ao Maracanã, ver meu maior amor. Quando outros amigos franceses foram me visitar, Marco e Antoine, era o final da temporada e só conseguimos assistir ao jogo das estrelas de Zico. Outro sonho eterno, mas sem ver toda a paixão da Nação, mesmo percebendo um pouco. Com Maxime e Julie, fomos primeiramente ver o jogo contra Aucas, uma goleada para garantir a classificação nas oitavas de final, já um dia de festa. Mas sabia que o jogo contra o Athletico Paranaense seria diferente ainda.

O confronto contra o Furacão na Copa do Brasil marcava o último capítulo de uma história de cinco anos. Na Copa nacional, deu Athletico em 2019 e 2021, deu Flamengo em 2020 e 2022. E pessoalmente, também completava uma novela rubro-negra. Quando cheguei, o primeiro jogo que assisti ao Maracanã foi Flamengo x São Paulo na semifinal da Copa do Brasil, ainda na tribuna oeste. Depois, vi na arquibancada, na minha sagrada Norte, o título contra o Corinthians, em 2023, sempre da Norte, assisti a estreia (e goleada 8×2) contra Maringá na terceira fase, aos dois Fla-Flus nas oitavas e ia para meu último jogo possível da Copa, as quartas de final. Assim, com duas edições distintas, da terceira fase até a final, completava uma Copa do Brasil inteira.

Com meu 20.o jogo do Flamengo apenas no ano de 2023, eu já tinha feito do Maracanã minha segunda casa. E acolhia os amigos em casa, na tribuna Norte. Para um de meus últimos jogos no Maracanã, encontrei meu amigo Gabriel, parceiro de vários rolês, sendo o maior e melhor um jogo do Flamengo no Maracanã. Como ele tinha prometido, me ofereceu um boné da Fla Manguaça, torcida organizada que erguei a bandeira. Não lembro quem, Gabriel, Maxime ou Julie, tirou uma foto de mim que até virou contracapa de meu livro Francêsguista. Tinha no Maracanã, minha pequena tropa, dentro de uma Nação inteira.

No Maracanã, ainda mais na Norte, o pré-jogo vale às vezes tanto que o jogo, até mais. Por isso, não gosto de chegar depois dos jogadores. Chegamos só um pouco antes, já com o Maracanã cheio, em clima de decisão. Com a ajuda de Gabriel, chegamos no lugar de sempre ou quase, muito longe do campo, muito perto do coração da Nação. Um lugar de difícil acesso para os turistas, por isso eu estava feliz de oferecer isso para meus amigos. O jogo contra Aucas já tinha sido diferente de tudo que eles viveram num estádio europeu. E o jogo contra o Furacão era ainda diferente, senti a animação dentro do corpo de Maxime vendo a arquibancada e o campo. Foi um furacão de emoções que apenas o show da Nação e um “estou sempre contigo”, ou talvez um passeio de helicóptero, pode proporcionar.

No 5 de julho de 2023, o técnico Jorge Sampaoli escalou Flamengo assim: Matheus Cunha; Wesley, David Luiz, Fabrício Bruno, Ayrton Lucas; Erick Pulgar, Victor Hugo, Gerson; Arrascaeta, Everton Ribeiro, Pedro. E o jogo, num Maracanã cheio com 66.505 pagantes, começou mal para o Flamengo, com apenas 6 minutos de jogo, Canobbio venceu o cara a cara com Cunha e abriu o placar para o Athletico. Maxime e Julie só tinham conhecido o Maracanã uma vez, com vitória 4×0 do Mengo, ou seja, sem gol tomado. E descobriam aqui uma tradição da Nação. Quando Fla toma um gol, a torcida não se abate, ela se reergue, canta a plenos pulmões o hino, e depois um “Oh, meu Mengão eu gosto de você”. E com 10 minutos, já era a hora de honrar os garotos do Ninho, dez estrelas a brilhar. A torcida do Flamengo é diferente e envolve até quem não tem o contexto, quem não solta uma palavra de português. Em campo, Arrascaeta quase fez um golaço de falta, mas a bola escapou da gaveta. No intervalo, o Athletico vencia 1×0, na tribuna Norte era o momento de respirar um pouco, pegar mais uma cerveja, falar em francês com os amigos, sobre Flamengo claro. Em duas semanas no Rio de Janeiro, morando comigo na Rocinha, eles tinham vivido já muitas coisas. Mas o jogo do Flamengo, sobretudo o clima da arquibancada, era umas das coisas mais marcantes da viagem.

No início do segundo tempo, Arrascaeta quase fez, mas Bento defendeu mais uma vez. Aos 7 minutos, Madson fez falta leve no Arrascaeta e depois de intervenção do VAR, o juiz marcou o pênalti. Explosão de alegria no Maracanã. Sempre vale a pena comemorar um pênalti como um gol, já que não sabe se ele vai ser transformado, melhor comemorar duas vezes que nenhuma. No seu estilo particular, Pedro fez o gol de pênalti e empatou no jogo. Explosão completa no Maraca, que agora cantava “Vamo virar Mengo”. Se fze um gol, pode fazer dois.

Na metade do segundo tempo, Bruno Henrique entrou no jogo ao som de “Ah! É Bruno Henrique!”. Quatro minutos depois, uma falta no lado direito, num lugar que me proporcionou uma de minhas maiores alegrias no Mara, o gol de Willian Arão no Fla-Flu de 2017 que acabou em 3×3 e classificação do Flamengo. Seis anos depois, o ídolo Arrascaeta cobrou na segunda trave, apareceu outro ídolo Bruno Henrique, que cabeceou e desempatou. Flamengo virou, o Maraca explodiu de vez, a Nação, que nessa hora já contava mais dois franceses em seu seio, irradiava de felicidade.

O final do jogo foi de muitos cantos, de “Mengão é paixão”, de “Acima de tudo rubro-negro”, de “Você pagou com traição”, de “Vou festejar”. De muitos vídeos também para Maxime, que registrava os momentos com os olhos alucinados e calor no coração, apenas a barreira da língua o impedia de cantar mais. Até hoje, não posso falar sobre o Flamengo sem que Julie solta um “Flameeeengo” no ar do “Outra vez vou te apoiar” . O Maracanã mudou sim, se elitizou, mas ainda tem o poder de seu maior patrimônio, a torcida do Flamengo. Há dois dias de meu aniversário, mesmo com minha saída do Brasil se aproximando cada vez mais, o 5 de julho de 2023 foi um dos dias mais felizes de minha vida, começado no céu do Rio de Janeiro, acabado no coração do Rio de Janeiro, o Maraca e sua Nação rubro-negra.

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O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”