Essa crônica é um pedido de meu amigo Kevin, também flamenguista roxo, também francês, também membro da Fla Paris. Mas claro, Adriano ia ter sua crônica no Francesguista. Porque é ídolo demais do Flamengo.
Descobri Adriano quando jogava no Parma. Nessa época, não sabia que ele tinha começado no Flamengo. Ele estava emprestado pelo Inter, onde jogava meu primeiro ídolo no futebol, Ronaldo. Jogava é uma palavra forte para Ronaldo, porque as lesões não paravam de acontecer, e quase parecia que ele estava aposentado. Eu estava privado de meu ídolo. E tinha Adriano, com muitas semelhanças, de físico e de futebol. Habilidade, velocidade e claro, potência, ainda mais do que o Fenômeno.
Vibrei com Adriano na Seleção em 2004 e 2005, e ele me impressionou com a camisa do Inter. Não era Ronaldo para mim, mas era um de meus jogadores favoritos. E mais, agora, eu sabia que ele era cria daqui, que tinha ganhado alguns títulos com o Manto Sagrado, como o campeonato carioca em 2000 e 2001.
Em 2009, Ronaldo quase foi no Flamengo, falarei desse momento num outro dia. Porque hoje é dia de Adriano. Em 2009, Adriano foi convocado com a Seleção no Brasil e nunca voltou na Itália. Teve rumores de desaparecimento, Adriano era alcoólatra, era drogado, era traficante, era morto. Mas Adriano era bem vivo e saiu do silêncio: “Resolvi dar um tempo na minha carreira, pois perdi a alegria de jogar. Não sei se vou parar dois ou três meses, para repensar minha carreira. Não gostaria de voltar a Itália. Lá a pressão é muito grande. Quero viver em paz, aqui no Brasil. Estou fazendo isso pensando em minha felicidade”. Adriano estava em paz, no Brasil, num lugar onde não tem tanta paz, Vila Cruzeiro, mas Adriano estava em casa, pronto a ser feliz.
E Adriano voltou na outra casa, a casa do Mengão. Ele não tinha outra opção: “Se eu for jogar no Brasil, tem que ser no Flamengo. Senão a minha avó me mata!”. Acho que nós flamenguistas temos essa vantagem sobre os outros torcedores, Adriano é nosso. Imperador para eles, Didico para nós. Adriano é a identificação do torcedor rubro-negro, quando tem gol do Didico, tem festa na favela, em dose dupla. Adriano é esse Flamengo que eu gosto, o Flamengo raiz, humilde, feliz com as coisas simples da vida. Na apresentação, ele quase foi nas lágrimas falando da favela e do Flamengo, queria conquistar a sua felicidade, que aconteceu quando vestiu o Manto Sagrado, com um sorriso largo, profundo, sincero.
Adriano vestia de novo a camisa do Flamengo, estreando contra o Athletico Paranaense. Estreando no Maracanã, com um gol de cabeça. Festa no Maraca, festa na favela. “O Imperador voltou” cantou o Maraca, “O Didico é nosso” cantou a favela. No fim do jogo, Adriano estava feliz: “Foi muito importante fazer o gol. Não tem dinheiro que traga tanta felicidade. Recuperei a alegria de jogar, mas sei que ainda posso fazer muito mais. Vamos devagar e com humildade”.
Adriano fez muito mais no Flamengo em 2009. Golaços contra Inter, Coritiba, Santos, decidiu o Fla-Flu sozinho, gols de cabeça, de pênalti. Fez um ano histórico, e no fim, Flamengo campeão, depois de um jogo eterno contra Grêmio. O Hexa tem a cara do Adriano, Adriano tem a cara do Flamengo, do povo. Nesse momento, todo mundo estava feliz. Já Imperador, Adriano, com essa temporada de 2009, foi coroado como um dos maiores ídolos da história do Flamengo.
Em 2020, Globo colocou Adriano como o 10o ídolo de toda a história do Flamengo. Eu tenho dificuldades para colocar nesse ranking os ídolos antigos, como Leônidas, Domingos, Zizinho, Dida, Carlinhos. Prefiro fazer um ranking a partir da Era Zico, com Zico no topo claro. Na 2a colocação, como o número de sua camisa eternizada, Leandro. E depois, terceiro, acho que vou de Adriano.
Na final de Libertadores 2019, esse milagre de Lima, teve um vídeo emocionante, o abraço entre Gabigol, Petkovic e Júnior, ídolos de três gerações. Mas teve um vídeo ainda mais emocionante para mim, não em Lima, mas no Rio, numa casa simples, Adriano, com amigos e familiares, chorando com a vitória do Mengão. Essas lágrimas são mais Flamengo do que qualquer declaração.
Por isso que Adriano é no meu top 3, ele é Flamengo. Gabigol, outro candidato possível ao top 3, tem ligação forte com a torcida, mas Adriano é a torcida, faz parte de nós. O grande Imperador pode ser apenas Didico no Flamengo, um menino simples e humilde, que vibrou com o Flamengo e fez o Flamengo vibrar. Adriano não brilhou muito em 2010 e voltou em 2012, sem sequer jogar. Não foi sempre profissional, mas nunca desrespeitou o que é Flamengo.
Adriano parou de jogar em 2016, sonhou com uma volta no Flamengo, mas não deu. Mas Didico nunca saiu do Flamengo, sempre foi Flamengo, sempre foi favela. “Adriano não sumiu nas favelas. Ele apenas voltou pra casa” concluiu Didico no seu emocionante depoimento ao Players Tribune.
Na Europa, tem a ideia que Adriano hoje é arruinado, deprimido, que virou traficante. Acho que não é o caso, tem dinheiro, mas prefere ser feliz e ser ele mesmo em casa, no Vila Cruzeiro. É apenas o que eu desejo para ele. Seja feliz Didico, que você nos deixou muito felizes.








Deixe um comentário