Agora eu vou usar os números das cronicas para escolher os ídolos. E com o número 5, escolher Júnior é mais do que justo. Confesso que às vezes não sei me posicionar com o Júnior. Às vezes, acho ele muito flamenguista, e outras vezes, não tanto. Certamente por isso, ele está fora de meu top 3 dos ídolos do Flamengo desde a era Zico. Não vejo nele o rubro-negrismo que têm Zico, Leandro, Adriano, meu top 3. Mas falando de carreira, de acontecimentos com o Manto Sagrado, ele está no top 2, só atrás de Zico. E para quem duvida, só um número para relembrar: 876. 876 jogos com o Manto Sagrado. Júnior foi tudo no Flamengo. Foi de Capacete a Vovô-Garoto, foi lateral-direito, lateral-esquerdo, volante. Foi líder. Foi campeão.
Paraibano de nascimento, chegou no Rio ainda criança. Verdade que, por causa da influência do tio e do pai, era mais Fluminense no início. Virou Flamengo depois de assistir a uma vitória do Mengão contra Botafogo no Maracanã. “Gostava do Fluminense. Mas era o Flamengo que mexia comigo. Aquela força, a energia da torcida tinha muito mais a ver com a minha personalidade […] O micróbio foi parar nas minhas entranhas. A partir disso, como gosto de dizer, o Flamengo virou minha segunda pele” explicou Júnior no livre Os dez mais do Flamengo de Roberto Sander.
Júnior jogou no futebol de areia, no futsal, no futebol. Fez teste no Fluminense, fez três meses no America, mas o destino era Flamengo. Foi na base com 19 anos já, pronto a esquecer o futebol para ganhar a vida. Mas quem ganhou foi a própria vida, e toda a torcida do Mengo, mexida nas entranhas com o futebol de Júnior. Começou na base como volante, sob as ordens do Modesto Bria, que também merece um capítulo nessa categoria.
Mas depois virou lateral-direito e começou nos profissionais, em 1974. Firmou-se rapidamente no time titular, fazendo gols decisivos no fim da campanha do campeonato carioca. Contra America no triangular final, fez um gol quase do meio de campo, aquele gol que Pelé não fez, Júnior fez. Logo na primeira temporada como profissional, Júnior já era campeão. Em 1976, com a chegada de Toninho, foi na lateral-esquerda. Quando se fala de jogador ambidextro, sempre tem um pé mais forte do que do outro, o pé de origem. Júnior é talvez o mais ambidestro dos ambidestros, não parece ter pé de predileção, como se Deus tinha lhe dado dois pés já perfeitamente prontos para jogar futebol.
Júnior foi o jogador com mais participações nos 73 jogos do tricampeonato carioca 1978-1979-1979 especial. Ele fez 70 jogos, com boa margem sobre os 65 de Zico e os 63 de Adílio. Deus também tinha lhe dado pernas de atleta, aprimoradas com a prática do futebol de areia e o profissionalismo. Júnior foi campeão carioca, recusou a proposta do Real Madrid em 1981 para ser campeão do Brasil, campeão da América, campeão do Mundo. Sempre com grandes atuações. Talvez é o maior parceiro de Zico da história.
Júnior não precisava da Europa para brilhar, e mesmo assim brilhou na Europa. Brilhou na Espanha na Copa de 1982 e na Itália com Flamengo num torneio em 1984. Flamengo precisava de dinheiro e Júnior, com 30 anos, foi vendido. Brilhou durante 5 anos na Itália. Só com a primeira passagem dele no Flamengo, Júnior era uma lenda do Flamengo. Mas queria fazer mais, queria ser Maestro.
Na sua biografia Minha paixão pelo futebol, Júnior explica que ele estava perto de renovar o contrato na Itália: “Estava inclinado a renovar o contrato, e o faria se meu filho, Rodrigo, involuntariamente, não tivesse interferido. Certo dia, estávamos todos assistindo a alguns jogos históricos em uma velha fita de videocassete. Com a camisa de número 5, vimos passagens em que eu dava passes certeiros para os companheiros do Flamengo. Meu filho, no auge da curiosidade de seus cinco anos, disparou: ‘Pai, quando eu vou ver você jogar no Maracanã?’ Não pensei duas vezes. Desliguei a televisão, olhei para Heloísa e disse: ‘Está na hora de voltar para casa!’ Era mais do que uma decisão. Era uma promessa ao meu primogênito”. Júnior era Flamengo de novo.
E como 15 anos antes, quando começou como profissional, Júnior não esperou muito antes de brilhar com o Manto Sagrado. Virou Vovô, porque já estava velho, com cabelos grisalhados, e virou Vovô-Garoto, porque tinha mais forma de quem tinha 25 anos. De novo, Júnior foi campeão, da Copa do Brasil, a primeira da história do clube, do campeonato carioca 1991, onde ele abraçou o filho: “No fim do campeonato carioca de 1991 vivi um momento de glória e particularmente emocionante porque havia um convidado especial assistindo àquele Fla-Flu. Quis ainda o destino que eu protagonizasse o quarto e último gol da partida. Quando faltavam três minutos para o fim do jogo, olhei para o meu convidado, próximo à beira do campo, sentadinho, ansioso para ouvir o sonoro apito final. Mal o juiz levou o apito à boca, Rodrigo se levantou e disparou chorando em direção ao meu abraço. Vinha comemorar como se ele fosse um dos jogadores. Entre soluços, me disse: ‘Pai, nós ganhamos, somos campeões.’ Naquele abraço apaixonado, eu honrava, finalmente, a promessa, feita ainda em Pescara, de que meu filho me verá jogar no Maracanã. A alegria de um abraço no fim de um jogo vitorioso só o futebol traduz. Mas, dessa vez, a comemoração extrapolara o lado esportivo. Era um encontro mágico entre pai e filho”.
E em 92 a falta foi de Júnior. Em 1992, o que não faltou, foi Júnior. Em 1992, Júnior fez de tudo. Se tornou líder de um time jovem, cheio de craques e promessas. Jogou no meio de campo com maestria. Fez gols de falta, matando a saudade do craque e do amigo de sempre. Talvez o pentacampeonato é o Brasileirão conquistado pelo Flamengo com a maior ligação a um jogador. 1992 vem com Júnior, e Júnior vem com 1992, como ele vem com 1974, 1978, 1979, 1980, 1981, 1982, 1983, 1990, 1991 até pendurar as chuteiras em 1993. Júnior foi campeão, quase todos os anos, Júnior campeão, e até depois de parar de jogar, Júnior ainda campeão do mundo, no futebol de areia tão amado, com um amigo, craque e Rei, Zico. “Sempre foi muito fácil jogar com o Léo. Nós nos entendíamos só no olhar. Um já imaginava o que o outro ia fazer e aí era só se preparar para receber a bola. Treinávamos também muitas jogadas e, quando aparecia a oportunidade, era só realizá-las” explica o Rei no livro Os 11 maiores laterais do futebol brasileiro, de Paulo Guilherme.
Comecei essa crônica na dúvida sobre o rubro-negrismo de Júnior, e agora estou conquistado, pelo futebol e pela carreira do Vovô-Garoto com o Manto Sagrado. Deixo então a palavra para o próprio Maestro, que escreveu o prefácio do livro Grandes jogos do Flamengo, da fundação ao Hexa, de Roberto Assaf e Róger Garcia: “Algumas pessoas me perguntam como foi jogar no Flamengo. Não dá para descrever. Até hoje não encontrei uma palavra, uma frase, que possa definir a sensação de entrar no Maracanã lotado, seja decisão ou não, vestindo o Manto Sagrado. É uma responsabilidade […] O Flamengo sempre será minha segunda casa e sua camisa, a segunda pele”.








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