De volta com os ídolos, depois de um bom tempo. O último era Júnior, camisa 5. Vou seguir a combinar número de cronicas e número de ídolos, e vou continuar com um jogador da geração de ouro, Andrade.
Andrade nasceu no 21 de abril de 1957 em Juiz de Fora, terra flamenguista. Mas nesses tempos, Andrade era botafoguense. Acontece. Depois foi na base do Flamengo, estreou com o Manto Sagrado, e logo depois foi emprestado na ULA, na Venezuela. Voltou no Flamengo em 1979, fez parte do maior meio-campo da história do Flamengo, e um dos maiores da história do futebol, talvez só atrás do Barcelona de Busquets-Xavi-Iniesta e do Real de Casemiro-Modric-Kroos. Pode ser também, sem clubismo, o maior da história, porque Andrade-Adílio-Zico era coisa de outro mundo. Andrade escreveu o primeiro grande capítulo de sua carreira em 1980.
Data, 1° de junho de 1980, palco, Maracanã, adversário, Atlético Mineiro, publico, 154.355 pagantes. Em jogo, o título do Brasileirão. Nunes abriu o placar, Reinaldo empatou no minuto seguinte. Nosso Rei Zico marcou, Reinaldo empatou de novo. No fim do jogo, Nunes desempatou, Flamengo era o virtual campeão. E no finalzinho do jogo, no fim do fim do jogo, o desconhecido Manguito, zagueiro do Flamengo, substituindo um Deus da Raça Rondinelli lesionado, fez um passe atrás, para o goleiro Raul, um passe muito curto, Pedrinho teve tempo de interceptar a bola. Se fizesse o gol, título era do Galo. Mas Andrade voltou a tempo, salvou o Flamengo, salvou o Manguito também: “Salvei a carreira do Manguito. Ele sairia crucificado do Maracanã”, falou Andrade no livro 20 jogos eternos do Flamengo de Marcos Eduardo Neves.
Andrade, como toda uma geração de ouro, foi campeão carioca, campeão brasileiro, campeão americano (com o primeiro cartão vermelho de sua carreira numa final violenta contra Cobreloa), e enfim campeão mundial. Mas deu o maior orgulho a torcida flamenguista contra o seu time de infância, Botafogo. Em 1972, Botafogo goleou Flamengo por 6×0. Doí, mas acontece. A torcida do Flamengo pediu vingança por muitos anos. Teve várias goleadas, mas nada de um 6×0. Até 1981, um ano histórico para o Flamengo. No campeonato carioca, no Maracanã, um jogo eterno. No intervalo, Flamengo 4×0 Botafogo. Mas a torcida do Flamengo queria mais, pedia o 6×0. Zico fez o quinto de pênalti. Faltava mais um. E no final do jogo, Andrade abriu no lado esquerdo para Adílio, que cruzou na grande área. A bola voltou nos pés do camisa 6 Andrade, para um chute poderoso, para um gol inesquecível, para o gol do 6×0, para uma goleada completa, para uma vingança inteira, para um momento único na carreira de Andrade: “Tive a sensação de ter saído do ar por alguns instantes. Deu um branco, tanto que na hora do gol corri para o lado errado”. Depois de 9 anos, o Flamengo era vingado, e o Botafogo tinha que esperar uma revirada, um outro 6×0. Até hoje, nunca aconteceu.
Em 1982, foi bicampeão brasileiro, contra Grêmio. No jogo de desempate, uma polêmica, uma confusão na grande área do Flamengo, com uma bola na mão de Andrade para os gremistas, com uma bola no punho do goleiro Raul para os flamenguistas. E para Andrade, “ficou aquele bate-rebate e eu estava em cima da linha quando a bola subiu. Em fração de segundos, pensei, esses caras vão me jogar com bola e tudo pra dentro do gol e o juiz vai correr pro meio, não vai nem querer saber se foi falta ou não. Pensei em colocar a mão. Mas a coisa aconteceu tão rápido que, naquele tumulto, nem sei se tirei com a mão ou de cabeça”. Vendo o lance de novo, eu também não sei, apenas sei que o Flamengo foi campeão esse ano.
O Tromba, como era chamado no vestiario do Flamengo, não é apenas bicampeão brasileiro, nem tri, depois do título contra Santos em 1983. Foi tetra em 1987, agora como veterano, sempre decisivo, com uma assistência para Bebeto no gol do título: “As pessoas esperavam que eu chutasse. Eu batia bem de fora da área, estava numa posição boa. Mas conduzi a bola de cabeça erguida, vi a movimentação do Bebeto na diagonal e a defesa saindo. O Bebeto era um jogador que, no olhar, entendia tudo. Quando meti, ele arrancou. O Taffarel tentou sair, mas hesitou. No que hesitou, o Bebeto chegou antes e deu o toquinho. A mesma alegria que ele teve com o gol, eu tive com o passe. Saí correndo que nem maluco naquele campo enlameado. Era um passe que significava o título”. Obrigado, Andrade, que honrou muito o Manto Sagrado.
Depois, foi penta em 1989, com a camisa do Vasco. Vamos esquecer essa breve passagem ainda mais rapidamente. Mas Andrade não é só penta, é hexacampeão brasileiro. Agora técnico, no início interino depois efetivado, montou um time que tinha como craques Petkovic e Adriano. No final do primeiro turno, perdeu 4×1 contra o Grêmio e depois de duas mais derrotas, o cargo estava ameaçado. Mas Andrade ficou, o Petkovic brilhou, nosso Didico brocou, o Flamengo goleou. E no jogo decisivo, contra Grêmio, que esperava uma derrota, o Flamengo estava atrás no placar. No intervalo, o Tromba deu bronca. “No intervalo, pela primeira vez vi o Andrade chateado. Concordamos com ele. Tinha que ser na raça. Precisávamos pressionar de alguma forma”, relembra o herói Ronaldo Angelim. O segundo tempo é conhecido, um jogo eterno, o Flamengo campeão, Andrade hexacampeão particular. “Foi talvez, a conquista mais importante de minha carreira. Acho que fizemos uma grande campanha e o nosso grupo foi forte. Sou uma pessoa positiva e de fé. Acho que o título estava escrito. Deus botou a mão e nos deu de presente”, emocionou-se nosso Andrade.
Para fechar, voltamos a uma injustiça. Jogou apenas 13 jogos com a Seleção. Em 1982, contra a Alemanha Ocidental no Maracanã, Telê escalou para o Brasil o meio do campo do Flamengo: Adílio, Zico e… Vitor, reserva do Andrade com o Flamengo. Uma loucura. Toninho Cerezo era craque, mas para mim, na Seleção de 1982 tão bonita, o meio-campo devia ser Zico, Sócrates, Falcão e Andrade. Talvez isso era a chave para o Tetra que o Brasil merecia.
Andrade fez apenas um gol com a Seleção, mas um autentico golaço, desfilando sua classe no meio da zaga da Áustria em 1988. Um gol que para Andrade deve ser lembrado: “Mas daqui 100 anos, as pessoas só vão falar do gol do 6×0”. Tá certo, Andrade.








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