Hoje é o dia, pela lei estadual, das embaixadas e dos consulados do Flamengo, um projeto muito lindo, de qual tenho o orgulho de fazer parte com a Fla Paris. E o dia escolhido não é por acaso, no 13 de dezembro de 1981, Flamengo jogava o que é para mim o seu maior jogo da história.
Claro, tem o Milagre de Lima, sobre qual já escrevi aqui. Mas Mundial é Mundial. E era realmente o caso na época, apesar de ser um confronto apenas entre o campeão europeu e o campeão sul-americano, os times dos outros continentes não podiam entrar na conversa. Era o que se fazia do melhor no mundo, principalmente o Flamengo. No 13 de dezembro de 1981, Paulo César Carpegiani escalou Flamengo assim: Raul; Leandro, Marinho, Mozer, Júnior; Andrade, Adílio, Zico; Tita, Lico, Nunes. Um time histórico, o melhor da história, para um jogo eterno, o maior da história.
O Liverpool era o favorito e os jogadores sequer conheciam os jogadores do Flamengo, com exceção de Zico e Júnior. E não era para menosprezar o time, era alguns meses antes da Copa de 1982, Leandro não era titular da Seleção e ainda hoje os jogos do futebol sul-americano não são retransmitidos nas televisões da Europa. Então imagina em 1981…
Liverpool não menosprezou o Flamengo, ou talvez não, mas riu do Flamengo. Quem escreve agora é Eduardo Monsanto, escritor do livro 1981, o ano rubro-negro: “Carpegiani deu o recado, e antes do aquecimento, houve tempo para um pouco mais de samba à beira do gramado. Figueiredo, Adílio, Peu, Zico, Anselmo e Júnior ainda faziam som quando tiveram o primeiro contato visual com os ingleses, que estranharam ver os adversários cantando e batucando antes do jogo, algo inimaginável na terre de Sua Majestade”. Depois, os jogadores do Flamengo rezaram juntos, e os jogadores do Liverpool riram juntos. Um choque de cultura ainda visível quando europeus não entendem que os jogadores da Seleção comemoram os gols com dança. Mas Zico usou o argumento do rir e reuniu todos os jogadores do Flamengo: “Quem ri por último, ri melhor. Vamos entrar concentrados. Nossa reposta vai ser dada dentro de campo”.
E Flamengo deu a reposta, com juros, bônus, extra e tudo mais. No estádio Nacional de Tóquio, construído para os Jogos Olímpicos de 1964, na frente de 62.000 torcedores, Flamengo abriu o placar com apenas 12 minutos de jogo. Um passe perfeito de Zico, uma finalização perfeita de Nunes. Quando é perfeito, não precisa de outras palavras para dizer que é perfeito. É apenas perfeito. Flamengo 1×0 Liverpool.
Era a primeira reposta, mas ainda faltava os juros. Numa falta de Zico, o goleiro defendeu, mas com dificuldades e não segurou a bola. Adílio foi o mais rápido, o mais determinado, o mais abençoado. Com um detalhe não muito conhecido: Adílio não deixou Rio para Tóquio com o resto da delegação por uma razão simples e importante: estava em lua de mel. Por isso mandou beijos nas arquibancadas para comemorar o gol. Para o livro 1981, o ano rubro-negro, Adílio fala do momento do gol, homenageando o técnico Cláudio Coutinho, que tinha falecido alguns meses antes: “Passou de tudo pela cabeça! Eu cheguei lá em lua de mel, a responsa para mim era maior. Quando veio o gol, aí foi a realização, missão cumprida! Eu agradeci a Deus, era isso que o Coutinho queria que acontecesse. Foi uma causa bem espiritual. Claro que Coutinho estava com a gente! A toda hora, a todo momento. Era desejo dele; ele queria ver isso de perto”.
Cláudio Coutinho foi o técnico tricampeão carioca 1978-1979-1979 Especial e campeão brasileiro 1980. Se o Flamengo jogou tão bem nesse momento, foi graças aos jogadores sim, mas também graças a ele, com liberdade para os laterais, liberdade para o gênio Zico, e ideias de jogo como o overlapping e a polivalência dos jogadores. E acho também que ele teve uma grande influência na tão mítica Seleção de 1982. No 13 de dezembro de 1981, o rubro-negro Cláudio Coutinho estava em paz, e feliz, como milhões de outros rubro-negros.
O capitão inglês Thompson devia marcar o Zico. Ele não fez uma partida ruim, apenas a tarefa era demasiado difícil. Se você dá a missão para alguém de parar o vento, ele tem boas chances de fracassar. Porque no estádio Nacional, Zico voava em campo. Antes do intervalo, Zico fez mais um lançamento perfeito para o Nunes. Galvão Bueno antecipou o gol de quem ele ia chamar o “artilheiro das decisões”, com toda justiça. Flamengo 3×0 Liverpool. “Esse Zico é mesmo infernal, é um jogador de sonho. Estive atrás dele o tempo todo, e mesmo assim ele armou a maior confusão na nossa defesa, com lances absolutamente imperdíveis. É um monstro”, falou Thompson depois do jogo.
O segundo tempo não serviu para muitas coisas. Flamengo levou o pé, Liverpool ficou abaixo do chão. Era tarde demais para Liverpool para rezar, Flamengo podia rir, podia dançar, podia comemorar. É uma das Copas intercontinentais mais marcantes, com o Santos – Benfica de 1962 e o São Paulo – Barcelona de 1992. Porque o Liverpool era gigante na Europa, ganhando 3 das últimas 4 Copas europeias. Mas o Flamengo era gigante no Rio, no Brasil, na América do Sul, e agora no Japão. Flamengo era o maior do Mundo.
Depois de ter o melhor clube do mundo, faltava eleger o melhor jogador da partida. Os jornalistas japoneses escolheram Zico com 22 votos, um pouco na frente dos 19 votos para Nunes. Adílio recebeu um voto, e também o goleiro Raul, provavelmente de um jornalista que tinha entendido que precisava eleger quem menos apareceu no jogo. “Fiquei meio frustrado porque não participei do jogo. Só veio uma bola. O Flamengo podia ter jogado sem goleiro, que seria 3 a 1”, explicou Raul no livro 20 jogos eternos do Flamengo de Marcos Eduardo Neves.
Zico ganhou do sponsor Toyota um carro Cellica zero-quilômetro, e o artilheiro Nunes um Toyota Carina. Os dois ficaram com os carros mas ofereceram para os outros jogadores o valor compartilhado do carro. Era também isso esse Flamengo de 1981, era mais do que 11 jogadores em campo jogando juntos, era a perfeição mais perfeita de um time de futebol.








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