Ídolos #29: Tita

Ídolos #29: Tita

Do time campeão de tudo em 1981, todos os titulares são ídolos. Claro, Tita não é exceção. Misturava como poucos raça e técnica, era o jogador ideal para acompanhar o trio de ouro AndradeAdílioZico, o artilheiro Nunes, as avançadas do lateral Leandro. Todos passando nas categorias da base do clube. Craque, o Flamengo faz em casa. Deixo já a palavra para Deus, Zico: “O Tita, pela direita, era raçudo toda vida e marcava bastante. Daí, o Leandro tinha mais proteção para avançar”.

Milton Queiroz da Paixão nasceu no Rio de Janeiro no 1o de abril de 1958. Chegou na base do Flamengo em 1970, jogando no meio de campo. Mas quando chegou no time principal, o meio de campo estava cheio de talento: Andrade, Adílio, Zico. Não tinha espaço, a solução foi de ir na ala direita. No ataque, o estilo de jogo permitia as incursões permanentes de Leandro no campo adversário. Na defesa, o estilo de jogo permitia ao Zico de ter menos responsabilidades. E Tita também virou um ótimo goleador. No primeiro jogo com o time principal, no 28 de janeiro de 1977, uma goleada 9×0 contra Central e um gol de Tita. No segundo jogo, mais uma goleada, 7×0 contra Portela, e mais um gol de Tita.

Mas a primeira decepção veio logo depois, no 28 de setembro de 1977. Decisão do campeonato carioca, no Maracanã, contra Vasco, com 152.059 presentes. Tita entrou no decorrer do jogo com a fama de exímio batedor de pênaltis. E na disputa final, Tita perdeu a penalidade, Flamengo perdeu o título. Mas esse time era uma família. Ainda Zico, agora no livro Zico, 50 anos de futebol, de Roberto Assaf e Roger Garcia: “ Quando perdemos aquele Estadual, saímos todos juntos no ônibus e fomos para o Barril 1800, ao lado do Jorge Ben, que fez até uma música para aquele pênalti que o juiz não deu. Ali, fizemos um acordo que não íamos deixar barato aquele negócio. Fomos até muito criticados pelo Flávio Costa e pelo pessoal da Boca Maldita. Disseram que a gente perdeu o título e foi comemorar. Nós sabíamos que tínhamos um time forte e que as coisas iam mudar. Fomos ali para dar um apoio ao Tita, que deu um tremendo azar, pois só entrara em campo porque o Coutinho sabia que ele batia pênalti muito bem”. Acrescenta Leandro, no livro Os dez mais do Flamengo, de Roberto Sander: “Nós tínhamos uma família na Gávea. Parece até que é combinado, pois todos do time daquela época falam a mesma coisa: eu, Zico, Júnior, Andrade, Tita, Adílio. Ficávamos satisfeitos de estar no clube, de manhã e à tarde. Nossa segunda casa sempre foi o Flamengo, a gente gostava daquele ambiente”.

Tita se recuperou, fez um golaço, talvez o mais bonito da carreira dele com o Manto Sagrado, para dar a vitória ao Mengo contra o XV de Piracicaba no Brasileirão de 1978. E Flamengo finalmente conseguiu um título com a geração de ouro, o campeonato carioca 1978, com a cabeçada inesquecível de Rondinelli. Foi bi em 1979 e ainda em 1979, conseguiu o Tri. No penúltimo jogo, contra Vasco, na ausência de Zico, Tita jogou com a camisa 10 e jogou muito. Na frente de 115.934 torcedores, Tita fez 2 gols, inclusivo o gol da vitória 3×2, de cabeça. Flamengo confirmou o título uma semana depois, com um empate sem gols contra Botafogo. Na campanha, Tita fez 14 gols em 29 jogos, destaque para a vitória 3×0 contra o Americano, quando Tita fez os 3 gols do jogo. Também em 1979, fez 4 gols num jogo só, um amistoso contra ABCR, com goleada 7×0.

Também em 1979, Tita estreou com a Seleção brasileira. E estreou no melhor estilo, na Copa América, contra o maior adversário, a Argentina, no maior palco, o Maracanã e seus 130.000 apaixonados neste dia. Zico abriu o placar com apenas 3 minutos de jogo, para o delírio da geral. A Argentina empatou e no segundo tempo, Tita brigou numa segunda bola, tomou posse, tabelou com Zico, infiltrou a grande área e, meio de bico, meio de trivela, fez um gol de cobertura, um golaço sensacional, o gol da vitória. No jogo seguinte, Tita abriu o placar na vitória 2×0 contra a Bolívia. Infelizmente, o Brasil foi eliminado na semifinal contra o Paraguai.

Em 1980, na segunda fase do Brasileirão, Flamengo enfrentou outro candidato ao título, o Palmeiras. Num jogo já eternizado no Francêsguista, Flamengo se vingou da derrota 4×1 no Maracanã do ano anterior. No Morumbi, Flamengo goleou 6×2, com dobletes de Zico e de Tita, que mandou “tchau” para a torcida palmeirense. No jogo de volta, com a camisa 10, fez o gol do empate de cabeça. Quando Zico estava ausente, Tita não só pegava a camisa 10 que ele adorava, também pegava a função de Zico, organizando o time e fazendo gols, como fez contra Bangu na última rodada da segunda fase, quando Flamengo ganhou 3×0 e Tita fez os três gols, inclusive o último de falta. Isso é mais uma façanha de Tita, conseguia em alguns momentos substituir ninguém menos de que Zico. Mas podiam brilhar juntos, Flamengo conquistou em 1980 seu primeiro título brasileiro, com 9 gols em 22 jogos de Tita, segundo artilheiro do time, atrás apenas de Zico, obvio.

Tita também fez gols na Europa, durante a excursão do Flamengo em 1980, quando marcou gols na Itália e na Espanha. De volta no campeonato carioca, brilhou ao lado de Zico na goleada 7×1 contra Niterói. Zico fez 4 gols, Tita dois. Fechou o ano com um gol contra Botafogo, mas foi Fluminense que levou o título carioca. O ano de 1981 seria diferente, e começou para Tita com a Seleção, onde foi titular no time que chegou na final do Mundialito, uma minicopa do mundo no Uruguai. Participou dos jogos de eliminatórias e no último jogo, fez 2 gols na vitória 5×0 contra a Venezuela. No final do jogo, Tita falou: “Foi meu último jogo pela ponta-direita. Daqui por diante vou disputar minha posição pelo meio”. O técnico Telê só respondeu: “Ah! Ele falou isso é?”. E nunca mais convocou Tita. Acho que foi um comentário bem infeliz do Tita, já tinha muitos craques no meio de campo e ele jogava numa posição e numa função que ele conhecia com o Flamengo, cobrindo as avançadas de Leandro, que era titular absoluto na Seleção. Talvez com o Tita, o problema da ala direita da Seleção teria sido resolvido e o Brasil tetracampeão do mundo.

Mas mesmo assim, Tita foi campeão do mundo, com o Maior do Mundo, no 3×0 contra Liverpool. Flamengo goleou e a dupla Leandro – Tita funcionou, como escreveu Gustavo Roman no seu livro Sarriá 82: “Leandro e Tita protagonizaram um overlapping no segundo tempo de jogo, que a torcida aplaudiu como se tivesse presenciado um gol de placa”. Tita ainda ganhou o Brasileirão de 1982, fazendo um gol nas quartas de final contra Santos. Em 1983, foi emprestado ao Grêmio e continuou vencedor, conquistando uma segunda Copa Libertadores. Nem teve tempo de jogar o Mundial de clubes, Flamengo o chamou de volta, Tita virou camisa 10 com a saída de Zico e continuou goleador. No campeonato carioca, fez 11 gols em 14 jogos, infelizmente Flamengo deixou escapar o título no triangular final. No final do ano, participou do jogo de despedida de Raul no Maracanã, e fez os dois gols do Mengo na derrota 3×2.

Tita foi artilheiro da Copa Libertadores em 1984 com 8 gols em 10 jogos e jogou no Flamengo até 1985. Fez seu último gol numa goleada 5×0 contra Bonsucesso que, para variar, viu Zico brilhar. Tita voltou no Rio Grande do Sul, agora no Internacional, e até jogou no Vasco. Não acho que essa passagem no rival manchou a história de Tita no Flamengo, como não é o caso para outros jogadores, como Andrade, Júnior Baiano ou Petkovic. No Vasco, ganhou o campeonato carioca 1987, fazendo o único gol da final contra o próprio Flamengo, e o Brasileirão de 1989, um ano de ouro para Tita, que também conquistou a Copa América com a Seleção. Entre as duas passagens no Vasco, jogou na Europa, no Bayer Leverkusen e Pescara, e encerrou a carreira em 1998 no Guatemala, depois de passar por vários clubes mexicanos.

Mais importante, Tita voltou a vestir o Manto Sagrado em 1990, para dois jogos de despedida, de dois monstros sagrados, Zico e Nunes. Na despedida de Zico, Tita vestiu a camisa 7 eterna. Na despedida de Nunes, sem Zico mas com Leandro, Andrade e Júnior, Tita vestiu a camisa 10 e fez um gol, de cabeça, foram vários gols de cabeça durante a carreira. Com o Manto Sagrado, foram 134 gols em 391 jogos, números impressionantes, mas não suficientes para explicar toda a importância de Tita no maior time da história.

4 respostas para “Ídolos #29: Tita”.

  1. Avatar de Jogos eternos #135: Flamengo 4×1 Santos 1984 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] na cabeça de Tita, que fez o gol do 4×1. A camisa 10 do Flamengo estava órfã de Zico, mas Tita, outro ídolo no Francêsguista, foi um dos maiores sucessores possíveis, capaz de fazer uma tarefa impossível de fazer, honrar a […]

    Curtir

  2. Avatar de Jogos eternos #158: Flamengo 1×0 Bayer Leverkusen 1988 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] ou internacional, com a Copa UEFA, a antiga Europa League. No time, tinha um ídolo do Flamengo, Tita, que acabou não jogando a final da Copa Kirin. O Bayer tinha a vantagem do empate, mas Flamengo […]

    Curtir

  3. Avatar de Jogos eternos #165: Cerro Porteño 2×4 Flamengo 1981 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] curto de Baroninho para Tita. Uma finta para voltar no pé direito e mais um cruzamento de Tita, ídolo do Flamengo, ídolo no Francêsguista. Zico chegou, voleiou, golaçou. O goleiro paraguaio, Roberto Fernández, pai de Gatito Fernández […]

    Curtir

  4. Avatar de Ídolos #36: Jorginho – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] brasileira, mas faltou a Copa América por causa de uma lesão no joelho. Ele seguiu os passos de Tita, outro ídolo do Flamengo e no Francêsguista, e assinou com o Bayer Leverkusen. Com toda a técnica, capacidade de desarmes e visão de jogo, […]

    Curtir

Deixar mensagem para Ídolos #36: Jorginho – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo Cancelar resposta

O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”