Jogos eternos #152: Vélez Sarsfield 2×3 Flamengo 1995

Ontem, apesar da goleada 4×0 contra Bolívar na Copa Libertadores, foi um dia triste para o Flamengo. O jornalista Washington Rodrigues, o Apolinho, morreu aos 87 anos. Sua maior paixão era o Flamengo, mas ele era tão bom como profissional que tinha o respeito das torcidas dos 4 times de Rio. Era um profissional apaixonado, trabalhou até o fim da vida. Mesmo com um câncer no fígado, ainda atuava na Rádio Tupi e participou de seu último jogo na ida contra o mesmo Bolívar. No jogo de volta, Washington Rodrigues morreu, partiu com sua grande paixão em campo. Em 2001, segundos antes do gol do Tri de Petkovic, Apolinho profetou: “E acaba de chegar São Judas Tadeu”.

Washington Rodrigues era chamado de Apolinho por causa do microfone que usava, que lembrava o Apolo 11. O apelido foi dado pelo locutor Celso Garcia, outro jornalista eternizado na história do Flamengo. Em 1967, Celso Garcia indicou ao Flamengo uma joia franzina de 14 anos, um Galinho de Quintino, Zico. Apolinho Rodrigues também eternizou bordões, entre meus favoritos “chocolate”, “geraldinos e arquibaldos” e “briga de cachorro grande”. Imitando outro jornalista, João Saldanha, Washigton Rodrigues também virou técnico de futebol, só que não dirigiu a Seleção que deu o tricampeonato ao Brasil, fez mais, treinou sua grande paixão, o Maior do Mundo, Flamengo.

Em 2015, vinte anos depois da passagem, Apolinho lembrou para UOL um jantar com o presidente do Flamengo: “Kleber Leite me convidou para encontrá-lo em um restaurante. Imaginei que queria conselhos sobre o momento do time e fui preparado para sugerir a contratação do Telê Santana. Ninguém queria pegar o Flamengo. O papo varou a madrugada. Até que por volta das 3h30 havia um prato virado na mesa e sem uso. O Kleber me disse que tinha um nome e pediu para que virasse o prato. Quando vi que era o meu tomei um susto e perguntei se ele estava brincando. Pensei rápido e aceitei, já que o Flamengo é uma convocação”. A frase dele, “o Flamengo não convida, o Flamengo convoca o rubro-negro” também está para a eternidade na história do Flamengo.

O ano era 1995, ano de centenário, ano das maiores ambições, com o maior ataque do mundo, Romário, Edmundo, Sávio, ano também das primeiras frustrações, com a perda do campeonato carioca num final dramático contra Fluminense. O técnico Vanderlei Luxemburgo foi substituído pelo Edinho, que também não deu muito certo. E Kleber Leite convidou – não, convocou, Apolinho Rodrigues para ser o técnico do Flamengo. A escolha surpreendeu, tanto pela profissão de Washington Rodrigues que as críticas dele sobre Romário, falando que “talvez ele decida suar a camisa tanto quanto sua camisinha”. De novo Apolinho Rodrigues para UOL: “O Romário foi a primeira pessoa que me ligou para dar os parabéns. Terminamos as desavenças imediatamente. Brigávamos pelo jornal. Eu o convidei para que estivesse comigo na apresentação. Queria acabar com aquilo na frente de toda a imprensa. Ele aceitou e na primeira pergunta disse que tinha esquecido a briga. Respondi que era bom ele me abraçar ou sairíamos na porrada. Resolvemos o problema no primeiro momento…”.

Eu já eternizei no Francêsguista dois jogos dirigidos pelo Apolinho, o segundo dele como técnico, com doblete de Sávio contra o Juventude e um jogo da primeira fase da Supercopa Libertadores, o jogo de volta contra Vélez, marcado por um gol para cada membro do trio infernal Romário, Edmundo, Sávio, e uma briga sensacional no final do jogo. Para a homenagem ao Apolinho, vamos então no jogo de ida, que também foi o jogo da estreia do técnico. No 14 de setembro de 1995, o técnico-jornalista Washington Rodrigues escalou Flamengo assim: Paulo César; Agnaldo, Cláudio, Ronaldão, Lira; Pingo, Márcio Costa, Djair; Nélio, Sávio, Edmundo. Um jogo sem Romário então, como lembrava Apolinho para UOL: “O ataque dos sonhos jogou pouquíssimas vezes junto. É preciso destacar isso. Praticamente não contei com os três juntos para escalá-los”.

No estádio José Amalfitani de Buenos Aires, o juiz começou apitando um pênalti contra o Flamengo por uma falta de Ronaldão. O zagueiro argentino Roberto Trotta bateu forte e abriu o placar. Ainda no primeiro tempo, vindo da direita, o lateral Agnaldo cruzou alto e Edmundo teve tempo e espaço para ajustar o goleiro e empatar o jogo. Agora no segundo tempo, o Vélez teve outro lance, bola bateu na trave, Marcelo Herrera, que entrou no decorrer do jogo, desempatou. Vélez estava de novo na frente e, até o minuto 42 do segundo tempo, parecia que ia sair com a vitória.

E no minuto 42 do segundo tempo, Sávio, com a agilidade dele, a facilidade dele, a ousadia dele, driblou na direita e cruzou. Edmundo quase fez seu segundo gol do dia de cabeça mas o goleiro Chilavert, um de meus maiores ídolos quando era mais jovem, defendeu. Bola ainda viva e Chilavert, com a loucura dele, saiu nos pés de Lira. Só nos pés mesmo, Chilavert tocou tudo, menos a bola. Sávio, com a tranquilidade dele, a precisão dele, venceu Chilavert no contrapé e fez o gol antes de partir para o abraço com o Apolinho. O empate já era bom para o Flamengo.

Apolinho Rodrigues, que se via mais como um psicólogo do que um mestre tático, já fez uma primeira escolha decisiva, logo no primeiro jogo de sua carreira, fazendo entrar em campo Rodrigo Mendes no lugar de Djair. E num contra-ataque no tempo adicional, Edmundo abriu na esquerda para Rodrigo Mendes, que chutou cruzado, venceu Chilavert, contra-virou, deu a inesperada vitória ao Flamengo. “Gol do Brasil, gol do Flamengo” narrou Luciano do Valle, outro jornalista histórico, que também se arriscou na carreira de treinador, na Seleção brasileira de Masters. Em Buenos Aires, Sávio nem foi comemorar com Rodrigo Mendes, que estava longe na frente, mas com o banco, de novo nos braços do Apolinho. Washington Rodrigues tinha um carisma diferente e parecia que tinha estrela também, vencendo seu primeiro jogo num roteiro incrível. Em 2021, ele falou sobre esse jogo para Lance: “Contra o Vélez, que foi a minha estreia como técnico do Flamengo, nós perdíamos por 2 a 1 até os 42 minutos do segundo tempo, quando reagimos e viramos o jogo. Uma das maiores emoções da minha vida, quase morri do coração”.

Infelizmente, Apolinho morreu de verdade ontem e juntou-se a vários ídolos do Flamengo no céu rubro-negro. Mesmo sem nunca jogar no Flamengo, Apolinho Rodrigues, ao lado de outros como Celso Garcia que faleceu em 2008, mostrou durante décadas de trabalho e de um profissionalismo exemplar, o que era ser Flamengo. Pode descansar em paz senhor Apolinho, Flamengo ainda está vivo na Libertadores e não faltaria de lhe dedicar o título caso vencer. Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte.

Uma resposta para “Jogos eternos #152: Vélez Sarsfield 2×3 Flamengo 1995”.

  1. Avatar de Jogos eternos #153: Flamengo 5×2 Cerro Porteño 1981 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] jornalismo esportivo está de luto. Anteontem, Apolinho Rodrigues, que homenageei com o jogo de sua estreia como técnico do Flamengo, contra Vélez Sarsfield. E ontem, num dia negro que também viu o falecimento de Antero Greco, o […]

    Curtir

Deixar mensagem para Jogos eternos #153: Flamengo 5×2 Cerro Porteño 1981 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo Cancelar resposta

O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”