Jogos eternos #186: Peñarol 3×2 Flamengo 1999

Flamengo jogou 8 vezes na Bolívia e ganhou apenas 2 jogos, um já eternizado no Francêsguista, contra Jorge Wilstermann em 1981. Assim, para o jogo contra Bolívar, era importantíssimo de fazer uma diferença já na ida no Maracanã, o que foi o caso com a vitória 2×0. Para o jogo eterno do dia, na vou na Bolívia, mas no Uruguai, onde também sempre foi difícil jogar, contra Peñarol, que espera agora nas quartas de final o vencedor do duelo entre Flamengo e Bolívar.

E eu vou de uma competição continental com Flamengo campeão no final. Já escrevi muito sobre essa competição com jogos eternos contra Colo-Colo e Universidad de Chile na primeira fase, e os dois jogos da final contra Palmeiras, 4×3 no Maracanã, 3×3 no Parque Antártica com gol de Lê. Entre os jogos contra os chilenos e os contra Palmeiras, a fase de mata-mata, uma goleada contra Independiente para ir na semifinal, disputada contra Peñarol. Na ida no Maracanã, Flamengo atropelou Peñarol com uma vitória 3×0. Porém, a classificação estava longe de ser assegurada e Fla precisava confirmar a vantagem no ambiente hostil do Centenário.

No 9 de dezembro de 1999, o eterno Carlinhos escalou Flamengo assim: Clemer; Maurinho, Célio Silva, Juan, Athirson; Leandro Ávila, Jorginho, Marcelo Rosa, Leonardo Inácio; Caio, Leandro Machado. Jogo começou tenso, na verdade era tenso até antes do apito inicial. Relembra Caio para GloboEsporte: “Começou na chegada ao estádio. Nosso ônibus foi apedrejado. Era normal naquela época. Mas sentimos um clima estranho no aquecimento. Não nos deixaram aquecer em campo e nos mandaram para um local embaixo das arquibancadas, um cimentão. Cerca de 15 membros da torcida organizada do Peñarol passaram nos encarando, chutaram as bolas. Esperavam uma reação nossa”. Com o apoio do público, Peñarol dominou o primeiro tempo. Clemer falhou duas vezes em bolas aéreas, sem maiores consequências para o Flamengo. Pouco antes do intervalo, Peñarol finalmente abriu o placar graças a um belo gol de falta do capitão Pablo Bengoechea.

No segundo tempo, Flamengo reagiu com a entrada em campo de Reinaldo, que provocou um pênalti cometido pelo lateral brasileiro Cafú, que passou quase toda a carreira no Uruguai. Na cobrança, depois de se desentender com um jogador do Peñarol, Athirson foi cirúrgico e empatou no jogo, deixando ampla vantagem para Flamengo no placar agregado. Oito minutos depois, Reinaldo fez o golaço do dia, começou a jogada na sua parte de campo, avançou 20 metros sem ser muito contestado e soltou a bomba de 35 metros. A classificação do Flamengo era quase decretada, mesmo com gol do Peñarol no minuto seguinte.

Nos instantes finais, Peñarol teve um pênalti, Bengoechea permitiu ao time uruguaio de vencer o jogo, sem impedir a eliminação e a raiva dos companheiros. No apito final, os jogadores uruguaios partiram para cima e começou aqui uma das brigas generalizadas mais pesadas do futebol. Relembra agora Clemer: “Foi um jogo complicado por tudo o que aconteceu fora de campo. Eles armaram para nós… Só que nosso time estava voando. A confusão começou por causa do Athirson, que estava numa fase muito boa. Ele infernizou os caras pelo lado esquerdo. Acabou com o jogo, e o cara acertou a cara dele. Nosso time era muito novo. O Romário tinha saído. Eu, Célio Silva, Caio e Maurinho éramos os mais experientes. O resto era tudo guri. Eu estava do outro lado do campo. Fecharam para cima dos guris e fui correndo ajudar. O bicho pegou. Todo mundo tomou pancada, soco para todo lado […] Tomei uma pancada forte nas costas. Quando levantei, não vi mais nenhum rubro-negro. A garotada correu, fiquei sozinho. Fui ajudar os caras e me deixaram na furada”.

No intervalo do jogo, o time de futsal do Peñarol tinha recebido uma homenagem e os jogadores ficaram à beira do campo. Assim, foi uma briga com desvantagem numérica e o goleiro reserva Júlio César entrou para ajudar. Ainda Caio: “Não era uma briga de 11 contra 11. Mas de 50 contra 11 ou 18. Depois, nas imagens, dá para ver que o Clemer quebrou uns três caras. Ele lutava capoeira. Alguns tomaram socos, mas era uma briga desigual. Depois de muito tempo chegou o policiamento no vestiário. Esperamos mais de uma hora para sair do estádio”. Foi uma briga marcante para quem assistiu ao vivo e até para quem, como eu, viu no replay, anos depois. No Flamengo, igual talvez só tem a briga contra Bangu na final do campeonato carioca 1966 e a contra Vélez Sarsfield em 1995, outro jogo eterno no Francêsguista. Os jogadores do Flamengo conseguiram fugir nos vestiários, mas a briga permitiu de fortalecer um grupo ainda jovem, órfã de Romário, e de o preparar para a grande final contra Palmeiras. Relembra Athirson, agora para Lance!: “Alguns jogadores, como Clemer e Fabão, tentaram segurar a onda, mas todos corremos para o vestiário. Entrou a polícia, a torcida e os próprios jogadores batendo e buscamos nos proteger, mas foi um acontecimento histórico, onde nos fortalecemos muito para a final e conseguimos ser campeões”.

Foi um dia bizarro em Montevidéu, Flamengo perdeu mas se classificou, brigou mas correu, e no final, foi campeão.

4 respostas para “Jogos eternos #186: Peñarol 3×2 Flamengo 1999”.

  1. Avatar de Jogos eternos #198: Flamengo 3×0 Peñarol 1999 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] é um dos mais gigantes da América do Sul, o Peñarol. Escrevi há pouco sobre o jogo de volta na Copa Mercosul de 1999, contra Peñarol, que acabou com pancada e derrota do Flamengo, mas classificação do Flamengo, que tinha feito a […]

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  2. Avatar de Times históricos #29: Flamengo 1999 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] Francêsguista. Na semifinal, uma vitória 3×0 sobre Peñarol no Maracanã na ida, e na volta, uma derrota, uma briga, mas uma classificação e uma vingança possível contra Palmeiras depois da eliminação traumática na Copa do Brasil no […]

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  3. Avatar de Jogos eternos #223: Flamengo 0x1 Bahia 1996 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] seu último título como técnico, apesar da derrota contra São Paulo. A segunda, uma briga e uma derrota lá no Uruguai, mas no final a classificação no caminho da Copa Mercosul de 1999. Hoje é diferente, o torcedor rubro-negro espera a derrota do próprio […]

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  4. Avatar de Jogos eternos #229: Flamengo 3×4 Independiente 1939 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] A primeira foi o último título de Zagallo em 2001, a segunda foi pancada contra uruguaios e classificação na final da Copa Mercosul de 1999, a terceira, pouco tempo atrás, torcendo para um rebaixamento do Fluminense que não […]

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O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”