Ídolos #9: Nunes

Ídolos #9: Nunes

A camisa 9 é muito especial no futebol. Acima, só a camisa 10, ainda mais no Flamengo. É a camisa do centroavante, do artilheiro, do goleador. E Flamengo teve muitos na sua história. Para o ídolo de hoje, vamos de um artilheiro das decisões, e jogou muitas decisões, ganhou muitos títulos, fez muitos gols. Nunes, o João Danado, camisa 9 da maior geração do Flamengo.

João Batista Nunes de Oliveira nasceu no Nordeste, em Sergipe, em Cedro de São João. Chegou com 14 anos no Rio de Janeiro e chegou bem, já no infantil do Flamengo. Mas não funcionou e Nunes voltou em Sergipe, na Confiança. Nome de predestinado, faltava confiança no Flamengo, foi achar de novo a confiança no Nordeste. Ficou depois no Nordeste, num clube maior, Santa Cruz. Foi tricampeão pernambucano e estreou na Seleção brasileira num jogo não-oficial contra uma seleção fluminense em Niterói. Fez um gol, Brasil ganhou 7×0, Zico fez cinco. Estreou oficialmente no 1o de abril de 1978 contra minha França, no meu Parque dos Príncipes. Era nome quase certo para a Copa do Mundo de 1978 mas infelizmente se machucou um pouco antes da Copa.

E Nunes voltou ao Rio, infelizmente para nós flamenguistas, no Fluminense. Jogou muito bem no Fluminense, mas viu o Flamengo ganhar o tricampeonato carioca entre 1978 e 1979. E Nunes voltou no time da infância, no maior do Rio, no maior do Mundo, nosso Flamengo. Craque, o Flamengo faz em casa e o bom filho a casa torna. Nunes era do Mengão.

Nunes estreou no último jogo da primeira fase do Brasileirão de 1980, contra a Ponte Preta. E voltou com estilo, com um gol e uma assistência para Zico depois de passar vários adversários, no 2×2 contra a Ponte Preta. Fez um outro na goleada 6×2 contra Palmeiras e também marcou um contra Bangu. E Nunes não era só goleador. No 3×0 contra a Desportiva Ferroviária, ele fez as três assistências do jogo. Zico fez os três gols. Uma dupla de ouro.

No jogo de volta da semifinal, Coritiba abriu 2×0, igualando o placar agregado. Em 4 minutos, Nunes fez dois e empatou o jogo de volta. Flamengo ganhou 4×3 e se classificou para sua primeira final do Brasileirão. Era a hora de Nunes brilhar ainda mais. Flamengo perdeu 1×0 o jogo de ida, mas na volta no Maracanã, foi diferente. Zico lançou em profundidade Nunes, que abriu o placar. Reinaldo empatou, Nosso Rei Arthur marcou, Reinaldo empatou de novo. No fim do jogo, Nunes fez um dos gols mais emblemáticos do Flamengo. Uma finta sensacional sobre Silvestre, uma finalização perfeita, uma comemoração eterna. “Senti o estádio dentro da minha camisa, como se cada pessoa fosse um Nunes e eu fosse cada um daqueles torcedores”, falou depois Nunes para Manchete.

O Flamengo era campeão brasileiro pela primeira vez e Nunes se tornava um ídolo da Nação. “Acho que também mereço ter o meu dia de ídolo, pois isso com Zico já é rotina”, explicou Nunes depois desse jogo. Sim Nunes, para esse dia e para sempre, você é ídolo do Flamengo. No Jornal dos Sports, Nunes desabafou: “Eles disseram até que sou maconheiro. A reposta foi no campo e não na violência. Fizemos três gols e essa é a minha reposta. Estou muito feliz com a notícia que recebi agora da diretoria, de que serei comprado em definitivo. Isso é a prova do futebol que venho jogando e uma reposta aos que não me queriam. Futebol se ganha dentro de campo, com humildade, acima de tudo coragem, sangue, raça e muita vibração. Foi o que procurei fazer o jogo todo”. Repito Nunes, você é ídolo da Nação para sempre.

Em 1981, Nunes continuou a brilhar. Na goleada 8×0 contra Fortaleza, fez apenas 5 gols no jogo. Dois de cabeça para começar, um de pênalti, e por fim, dois de perna esquerda, a “perna ruim” que ele não tinha. Um artilheiro completo. Flamengo foi eliminado nas quartas de final do Brasileirão contra Botafogo, sem Nunes, expulso no jogo de ida. Talvez o jogo teria sido diferente com Nunes, que foi o artilheiro do Brasileirão nesse ano com 16 gols. Nunes voltou a brilhar no campeonato carioca. Contra Americano, fez 3 gols na goleada 7×0, e também jogou muito no Jogo da Vingança contra Botafogo, abrindo o placar no eterno 6×0. Na final da Libertadores, não marcou nos três jogos contra Cobreloa. Na final do Carioca, foi expulso no primeiro jogo. Flamengo perdeu os dois primeiros jogos da final contra Vasco e podia perder um campeonato considerado como quase já ganhado. No último jogo da final, Nunes fez o gol do 2×0, outro gol emblemático, outra comemoração eterna com uma cambalhota para a alegria da maioria dos 161.989 pagantes no Maracanã. Nunes se transformava como o goleador das finais.

E no fim do ano, o maior jogo da história do Flamengo, o 3×0 contra Liverpool. Ou mais exato ainda, o maior primeiro tempo da história do Flamengo. Porque Flamengo liquidou o jogo ainda no primeiro tempo. Em dezembro de 1981, no 3×0 contra Liverpool, Nunes ficou marcado na história. Com 13 minutos de jogo, um passe genial de Zico para Nunes, para um gol emblemático do Flamengo, uma finalização perfeita, uma comemoração eterna. Flamengo 1×0 Liverpool, depois falta de Zico e gol de Adílio, Flamengo 2×0 Liverpool. E ainda no fim do primeiro tempo, posicionamento perfeito de Nunes, novo lançamento genial de Zico e chute de Nunes sem chance para o goleiro inglês, que na verdade nasceu na África do Sul e jogou na seleção do Zimbábue. Enfim, o gol só foi possível por causa do entendimento perfeito entre Zico e Nunes. E no Rio não tem outro igual, só o Flamengo é campeão mundial e Nunes, meu povo, era batizado como o Artilheiro das Decisões pelo narrador do jogo, o eterno Galvão Bueno. E para a eternidade também, Nunes era o Artilheiro das Decisões.

Como artilheiro do jogo, Nunes ganhou uma Toyota Carina. Nunes ficou com o carro, mas dividiu o valor com os companheiros campeões mundiais. Foi o fim de um ano de ouro para Nunes, que foi artilheiro do clube com 48 gols. Em 1982, jogou menos, fez menos gols, mas não perdeu a condição de Artilheiro das Decisões. Fez apenas 5 gols no Brasileirão, mas fez o mais importante de todos, no último jogo da final contra Grêmio, no Olímpico. De novo, quem fez a assistência foi o Rei Zico. A cumplicidade entre os dois era mortal para os adversários, imortal para os rubro-negros. Zico falou: “Quando eu pego na bola, a primeira coisa que faço é olhar o centroavante, que é quem está mais perto do gol. O Nunes fica sempre esperando. Na hora do gol, recebi na lateral, dei uma caneta no Vilson Taddei, ele ficou sem pai nem mãe, procurei então alguém e meti a bola entre os dois zagueiros. O Nunes entrou por ali e bateu firme”. Outro gol emblemático, outra finalização perfeita e outra comemoração eterna, agora para a filha Lívia, de três meses de idade. “Se é final, sempre apareço para conferir. Nunca me senti tão predestinado como nesta decisão”, falou depois Nunes. Sim, Nunes era predestinado.

No dia seguinte, Telê anunciou a lista dos pré-convocados para a Copa de 1982, com Nunes. Infelizmente, como em 1978, Nunes se machucou antes do torneio e foi cortado. Meu ataque de sonhos para 1982 era Reinaldo e Roberto Dinamite. Mas talvez com Nunes na frente do ataque, o tetra na Espanha teria sido realidade. Nunes não jogou mais com a Seleção, onde fez 8 gols em 13 jogos entre 1978 e 1980. Ótimos números.

Nunes foi emprestado ao Botafogo em 1983 e voltou ao Flamengo em 1984 onde de novo fez gols, o último justamente contra o antigo clube do Botafogo, com assistência de Bebeto. Foi a transição para uma outra geração de ouro, que ia ser tetracampeão brasileiro em 1987. Nunes ainda jogou no Náutico, no Santos, no Atlético Mineiro e até no Portugal, no Boavista. Mas o bom filho a casa torna e Nunes voltou ao Flamengo, justamente para a Copa União 1987. Não fez gol em 8 jogos, mas ainda assim, é tricampeão brasileiro pelo nosso Mengo. Com o Manto Sagrado, jogou 214 partidas e fez 99 gols, muitos muito importantes. Em fim de carreira, ainda jogou no Flamengo EC, em Varginha no Minas Gerais. O Artilheiro das Decisões era muito Flamengo.

Para fechar, duas lembranças mais pessoais. Com a Fla Paris, tinha oportunidade de comprar camisas autografadas de jogadores do Flamengo: Júnior, Raul Plassmann e Nunes. Comprei apenas a do Nunes, a branca do Mundial de 1981, com o nome Nunes e a camisa 9, a camisa da eternidade e da glória eterna. Outra lembrança foi na sede da Gávea, quando fui entrevistado pela Júlia Corson, que depois me ligou para me dizer que Nunes estava aqui e que podia o encontrar. Falei um pouco com o Artilheiro das Decisões e tiramos fotos. Estava perto de um ídolo eterno da Nação.

4 respostas para “Ídolos #9: Nunes”.

  1. Avatar de Jogos eternos #71: Flamengo 7×1 Rio Negro 1983 – Francesguista

    […] Negro, passe atrás de Júnior, gol de Baltazar. O Baltazar não conseguiu substituir plenamente o ídolo Nunes, mas ele fez jogos muito bons com o Manto Sagrado. Final do jogo pertence ao jogador menos […]

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  2. Avatar de Times históricos #22: Flamengo 1982 – Francesguista

    […] sempre apareço para conferir. Nunca me senti tão predestinado como nesta decisão” falou depois o ídolo Nunes, que só não fez nesse dia o gol mais importante de sua carreira porque fez outros […]

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  3. Avatar de Ídolos #29: Tita – Francesguista

    […] era o jogador ideal para acompanhar o trio de ouro Andrade – Adílio – Zico, o artilheiro Nunes, as avançadas do lateral Leandro. Todos passando nas categorias da base do clube. Craque, o […]

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  4. Avatar de Jogos eternos #139: Flamengo 3×2 São Paulo 1982 – Francêsguista, as crônicas de um francês apaixonado pelo Flamengo

    […] a lesão de Careca teria sido Roberto Dinamite, fazendo dupla com Reinaldo. E o reserva teria sido nosso ídolo Nunes, que tinha mais bola para jogar com Zico, Sócrates & Cia. Mas mesmo sem ser gênio da bola, […]

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O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”