Francêsguista

Francês desde o nascimento, carioca desde setembro de 2022. Brasileiro no coração, flamenguista na alma. Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte.

  • Jogos eternos #120: Remo 2×3 Flamengo 2003

    Jogos eternos #120: Remo 2×3 Flamengo 2003

    Vamos continuar a combinar o estádio do jogo do dia e do jogo eterno com mais um jogo no Nordeste, agora no Mangueirão de Belém. E como foi o caso com a penúltima crônica e o jogo contra Botafogo no Almeidão, vamos de um jogo da Copa do Brasil.

    Como em 1999, Flamengo estreou na Copa do Brasil de 2003 contra o Botafogo de Paraíba. Classificou-se sem maiores problemas, depois passou de Ceará e enfrentou nas oitavas de final mais um time do Nordeste, o Remo. Na ida no Maracanã, Flamengo fez quase todo o trabalho e venceu 4×0. Mas ainda tinha o jogo de volta em Pará e no 30 de abril de 2003, o técnico Nelsinho Baptista escalou Flamengo assim: Diego; Váldson, André Bahia, Fernando, Luciano Baiano; Fabinho, Jônatas, Cássio, Felipe; Jean, Andrezinho.

    No Mangueirão, o primeiro tempo viu a defesa do dia pelo goleiro veterano do Remo, Ivair, num chute de Andrezinho, que ia diretamente na gaveta. O segundo tempo viu muitos gols, o primeiro com Jean, bem colocado na pequena área do time paraense para fazer o gol fácil. Três minutos depois, Flamengo ampliou depois de uma jogada coletiva e um chute cruzado de Cássio. O mesmo Cássio cometeu um pênalti e o Remo reduziu a vantagem. Por pouco tempo, o golaço do dia chegou dos pés do camisa 10, craque e cérebro do Mengo, Felipe, que matou a bola com a sola do pé, abriu o espaço com um drible curto e chuto do pé esquerdo mágico. A bola foi diretamente na gaveta, Remo 1, Flamengo 3, golaço de Felipe, que jogou pouco no Flamengo, mas mesmo assim, jogou muito, com jogadaças e golaços do craque que ele era.

    O segundo gol de Remo, com carrinho de Márcio Belém, não serviu para nada, o dono do Mangueirão era o Flamengo.

  • Ídolos #29: Tita

    Ídolos #29: Tita

    Do time campeão de tudo em 1981, todos os titulares são ídolos. Claro, Tita não é exceção. Misturava como poucos raça e técnica, era o jogador ideal para acompanhar o trio de ouro AndradeAdílioZico, o artilheiro Nunes, as avançadas do lateral Leandro. Todos passando nas categorias da base do clube. Craque, o Flamengo faz em casa. Deixo já a palavra para Deus, Zico: “O Tita, pela direita, era raçudo toda vida e marcava bastante. Daí, o Leandro tinha mais proteção para avançar”.

    Milton Queiroz da Paixão nasceu no Rio de Janeiro no 1o de abril de 1958. Chegou na base do Flamengo em 1970, jogando no meio de campo. Mas quando chegou no time principal, o meio de campo estava cheio de talento: Andrade, Adílio, Zico. Não tinha espaço, a solução foi de ir na ala direita. No ataque, o estilo de jogo permitia as incursões permanentes de Leandro no campo adversário. Na defesa, o estilo de jogo permitia ao Zico de ter menos responsabilidades. E Tita também virou um ótimo goleador. No primeiro jogo com o time principal, no 28 de janeiro de 1977, uma goleada 9×0 contra Central e um gol de Tita. No segundo jogo, mais uma goleada, 7×0 contra Portela, e mais um gol de Tita.

    Mas a primeira decepção veio logo depois, no 28 de setembro de 1977. Decisão do campeonato carioca, no Maracanã, contra Vasco, com 152.059 presentes. Tita entrou no decorrer do jogo com a fama de exímio batedor de pênaltis. E na disputa final, Tita perdeu a penalidade, Flamengo perdeu o título. Mas esse time era uma família. Ainda Zico, agora no livro Zico, 50 anos de futebol, de Roberto Assaf e Roger Garcia: “ Quando perdemos aquele Estadual, saímos todos juntos no ônibus e fomos para o Barril 1800, ao lado do Jorge Ben, que fez até uma música para aquele pênalti que o juiz não deu. Ali, fizemos um acordo que não íamos deixar barato aquele negócio. Fomos até muito criticados pelo Flávio Costa e pelo pessoal da Boca Maldita. Disseram que a gente perdeu o título e foi comemorar. Nós sabíamos que tínhamos um time forte e que as coisas iam mudar. Fomos ali para dar um apoio ao Tita, que deu um tremendo azar, pois só entrara em campo porque o Coutinho sabia que ele batia pênalti muito bem”. Acrescenta Leandro, no livro Os dez mais do Flamengo, de Roberto Sander: “Nós tínhamos uma família na Gávea. Parece até que é combinado, pois todos do time daquela época falam a mesma coisa: eu, Zico, Júnior, Andrade, Tita, Adílio. Ficávamos satisfeitos de estar no clube, de manhã e à tarde. Nossa segunda casa sempre foi o Flamengo, a gente gostava daquele ambiente”.

    Tita se recuperou, fez um golaço, talvez o mais bonito da carreira dele com o Manto Sagrado, para dar a vitória ao Mengo contra o XV de Piracicaba no Brasileirão de 1978. E Flamengo finalmente conseguiu um título com a geração de ouro, o campeonato carioca 1978, com a cabeçada inesquecível de Rondinelli. Foi bi em 1979 e ainda em 1979, conseguiu o Tri. No penúltimo jogo, contra Vasco, na ausência de Zico, Tita jogou com a camisa 10 e jogou muito. Na frente de 115.934 torcedores, Tita fez 2 gols, inclusivo o gol da vitória 3×2, de cabeça. Flamengo confirmou o título uma semana depois, com um empate sem gols contra Botafogo. Na campanha, Tita fez 14 gols em 29 jogos, destaque para a vitória 3×0 contra o Americano, quando Tita fez os 3 gols do jogo. Também em 1979, fez 4 gols num jogo só, um amistoso contra ABCR, com goleada 7×0.

    Também em 1979, Tita estreou com a Seleção brasileira. E estreou no melhor estilo, na Copa América, contra o maior adversário, a Argentina, no maior palco, o Maracanã e seus 130.000 apaixonados neste dia. Zico abriu o placar com apenas 3 minutos de jogo, para o delírio da geral. A Argentina empatou e no segundo tempo, Tita brigou numa segunda bola, tomou posse, tabelou com Zico, infiltrou a grande área e, meio de bico, meio de trivela, fez um gol de cobertura, um golaço sensacional, o gol da vitória. No jogo seguinte, Tita abriu o placar na vitória 2×0 contra a Bolívia. Infelizmente, o Brasil foi eliminado na semifinal contra o Paraguai.

    Em 1980, na segunda fase do Brasileirão, Flamengo enfrentou outro candidato ao título, o Palmeiras. Num jogo já eternizado no Francêsguista, Flamengo se vingou da derrota 4×1 no Maracanã do ano anterior. No Morumbi, Flamengo goleou 6×2, com dobletes de Zico e de Tita, que mandou “tchau” para a torcida palmeirense. No jogo de volta, com a camisa 10, fez o gol do empate de cabeça. Quando Zico estava ausente, Tita não só pegava a camisa 10 que ele adorava, também pegava a função de Zico, organizando o time e fazendo gols, como fez contra Bangu na última rodada da segunda fase, quando Flamengo ganhou 3×0 e Tita fez os três gols, inclusive o último de falta. Isso é mais uma façanha de Tita, conseguia em alguns momentos substituir ninguém menos de que Zico. Mas podiam brilhar juntos, Flamengo conquistou em 1980 seu primeiro título brasileiro, com 9 gols em 22 jogos de Tita, segundo artilheiro do time, atrás apenas de Zico, obvio.

    Tita também fez gols na Europa, durante a excursão do Flamengo em 1980, quando marcou gols na Itália e na Espanha. De volta no campeonato carioca, brilhou ao lado de Zico na goleada 7×1 contra Niterói. Zico fez 4 gols, Tita dois. Fechou o ano com um gol contra Botafogo, mas foi Fluminense que levou o título carioca. O ano de 1981 seria diferente, e começou para Tita com a Seleção, onde foi titular no time que chegou na final do Mundialito, uma minicopa do mundo no Uruguai. Participou dos jogos de eliminatórias e no último jogo, fez 2 gols na vitória 5×0 contra a Venezuela. No final do jogo, Tita falou: “Foi meu último jogo pela ponta-direita. Daqui por diante vou disputar minha posição pelo meio”. O técnico Telê só respondeu: “Ah! Ele falou isso é?”. E nunca mais convocou Tita. Acho que foi um comentário bem infeliz do Tita, já tinha muitos craques no meio de campo e ele jogava numa posição e numa função que ele conhecia com o Flamengo, cobrindo as avançadas de Leandro, que era titular absoluto na Seleção. Talvez com o Tita, o problema da ala direita da Seleção teria sido resolvido e o Brasil tetracampeão do mundo.

    Mas mesmo assim, Tita foi campeão do mundo, com o Maior do Mundo, no 3×0 contra Liverpool. Flamengo goleou e a dupla Leandro – Tita funcionou, como escreveu Gustavo Roman no seu livro Sarriá 82: “Leandro e Tita protagonizaram um overlapping no segundo tempo de jogo, que a torcida aplaudiu como se tivesse presenciado um gol de placa”. Tita ainda ganhou o Brasileirão de 1982, fazendo um gol nas quartas de final contra Santos. Em 1983, foi emprestado ao Grêmio e continuou vencedor, conquistando uma segunda Copa Libertadores. Nem teve tempo de jogar o Mundial de clubes, Flamengo o chamou de volta, Tita virou camisa 10 com a saída de Zico e continuou goleador. No campeonato carioca, fez 11 gols em 14 jogos, infelizmente Flamengo deixou escapar o título no triangular final. No final do ano, participou do jogo de despedida de Raul no Maracanã, e fez os dois gols do Mengo na derrota 3×2.

    Tita foi artilheiro da Copa Libertadores em 1984 com 8 gols em 10 jogos e jogou no Flamengo até 1985. Fez seu último gol numa goleada 5×0 contra Bonsucesso que, para variar, viu Zico brilhar. Tita voltou no Rio Grande do Sul, agora no Internacional, e até jogou no Vasco. Não acho que essa passagem no rival manchou a história de Tita no Flamengo, como não é o caso para outros jogadores, como Andrade, Júnior Baiano ou Petkovic. No Vasco, ganhou o campeonato carioca 1987, fazendo o único gol da final contra o próprio Flamengo, e o Brasileirão de 1989, um ano de ouro para Tita, que também conquistou a Copa América com a Seleção. Entre as duas passagens no Vasco, jogou na Europa, no Bayer Leverkusen e Pescara, e encerrou a carreira em 1998 no Guatemala, depois de passar por vários clubes mexicanos.

    Mais importante, Tita voltou a vestir o Manto Sagrado em 1990, para dois jogos de despedida, de dois monstros sagrados, Zico e Nunes. Na despedida de Zico, Tita vestiu a camisa 7 eterna. Na despedida de Nunes, sem Zico mas com Leandro, Andrade e Júnior, Tita vestiu a camisa 10 e fez um gol, de cabeça, foram vários gols de cabeça durante a carreira. Com o Manto Sagrado, foram 134 gols em 391 jogos, números impressionantes, mas não suficientes para explicar toda a importância de Tita no maior time da história.

  • Jogos eternos #119: Flamengo 1×0 Eintracht Frankfurt 2019

    Jogos eternos #119: Flamengo 1×0 Eintracht Frankfurt 2019

    Flamengo continua hoje a pré-temporada nos Estados Unidos, com um jogo em Orlando. Vamos voltar alguns anos atrás como outra pré-temporada nos Estados Unidos, num ano histórico, em 2019. Flamengo começou com um empate conta o Ajax, que também fez história em 2019, chegando na semifinal da Liga dos campeões, e Fla conseguiu o ponto extra, vencendo a disputa de penalidades. Dois dias depois, Flamengo estava de novo em campo, precisando da vitória para ser campeão.

    Em 2019, Flamengo já jogava em Orlando, Florida, terra de muitos brasileiros, então de muitos flamenguistas. No 12 de janeiro de 2019, o então técnico Abel Braga escalou Flamengo assim: César; Rodinei, Rhodolfo, Rodrigo Caio, Trauco; Piris da Motta, Ronaldo, Jean Lucas, Thiago Santos; Vitor Gabriel, Henrique Dourado. Um time ainda longe de ser o time ideal da temporada de 2019, mas já pronto para conquistar um título.

    No Orlando City Stadium, hoje Inter&Co Stadium, o Eintracht Frankfurt, que ficou na 7a colocação no campeonato alemão deste ano, começou a dominar o jogo, sem muitos lances de perigo. Flamengo jogava de contra-ataque, também sem muito perigo. No meio do primeiro tempo, o capitão do Eintracht, o argentino David Abraham, foi expulso por uma cotovelada em Piris da Motta. Em seguida, Henrique Dourado foi no cara a cara com o goleiro, mas faltou velocidade para chutar no gol. Faltando dez minutos para o intervalo, Rodinei achou de pé esquerdo Jean Lucas, sozinho na segunda trave. Jean Lucas errou um pouco no chute, que finalmente enganou o goleiro Kevin Trapp e foi morrer no fundo das redes. No intervalo, vantagem de um gol para o Flamengo.

    No segundo tempo, alguns lances, sem muito perigo, e no final, Flamengo teve oportunidade de ampliar o placar, com Willian Arão, Renê, Éverton Ribeiro e Diego. Sem gol, mas sem consequência, o Flamengo manteve o 1×0 e foi o campeão. Ainda mais importante que o título, Flamengo começava a juntar as peças do time, já em campo, e também fora, com a oficialização da transferência de Gabigol e o quase acerto de Arrascaeta. Alguns rivais, até não-rivais, tentaram desmerecer a conquista, falando de uma Copa Mickey. Obvio, não era um título importante, mas era interessante de ter resultados contra times europeus. Ainda mais obvio, os rivais e não-rivais não teriam mais nada para zoações no final do ano.

  • Jogos eternos #118: Botafogo-PB 3×3 Flamengo 1999

    Jogos eternos #118: Botafogo-PB 3×3 Flamengo 1999

    Flamengo joga hoje dois jogos, um amistoso com o time principal nos Estados Unidos, e o campeonato carioca com o time reserva no estádio Almeidão, na Paraíba. Flamengo é o único time nacional do Brasil, capaz de encher qualquer estádio, em qualquer estado do Brasil. Vamos então ficar no Brasil e no Nordeste para o jogo eterno do dia, com um jogo da Copa do Brasil no Almeidão.

    Na estreia da Copa do Brasil de 1999, Flamengo foi em João Pessoa, Paraíba, para enfrentar o Botafogo local. O Almeidão estava cheio, com 34.289 pagantes, e estava rubro-negro. Impressionante a capacidade de Flamengo de levantar as multidões nos estádios, do Maracanã até qualquer lugar do Brasil, ainda mais no Nordeste, terra de flamenguistas. Foi mais uma vez o caso no 28 de fevereiro de 1999, quando o ídolo e eterno Carlinhos escalou Flamengo assim: Clemer; Pimentel, Ronaldo, Fabão, Athirson; Jorginho, Narciso, Cleisson, Beto; Leandro Machado, Romário.

    Com apenas 4 minutos de jogo, numa falta com 30 metros de distância, Beto soltou a bomba e Normando desviou a bola nas próprias redes. Explosão no Almeidão, Flamengo já na frente. Dez minutos depois, Botafogo reagiu com o próprio Normando, que se recuperou depois do gol contra e empatou com uma cabeçada. Dez minutos depois, novo gol, jogada começou nos pés de Athirson, que avançou de 20 metros na esquerda e achou na profundidade Beto. Uma finta para fixar o defensor, Beto esperou mais um pouco, esperou a chegada de Athirson, fez o passe certinho, Athirson fez o cruzamento certinho e Romário, acontecia também, se atrapalhou na hora de fazer o gol. Mas com um pouco da sorte dos craques, Romário se recuperou e fez o gol do pé esquerdo. O estádio só não reclamou de uma bola na mão do Baixinho porque era inteiramente rubro-negro.

    No segundo tempo, mais um gol chegando de uma falta, e depois de uma bola na trave, o outro zagueiro do Botafogo, Freitas, chegou e empatou mais uma vez para o time da casa. Botafogo até teve a oportunidade da virada com um pênalti, mas Clemer se avançou um pouco e defendeu a cobrança de Vivi. Mais uma explosão no Almeidão. E em seguida, o verdadeiro time da casa voltou mais uma vez na frente no placar. No meio de campo, um passe de Narciso que só não foi mais perfeito que a finalização de Romário. O Baixinho foi mais uma vez cirúrgico, do momento do domínio da bola, já na direção do gol, até a finalização, precisa e certa, sem qualquer esperança para o goleiro. Romário realmente era um jogador diferente, pena que não teve mais time ao seu lado para disputar títulos mais importantes.

    Botafogo chegou mais uma vez no empate, de novo com um gol depois de bola parada, Vivi se recuperando do pênalti perdido com um gol num escanteio. O 3×3 foi o placar final, Flamengo passou da primeira fase com vitória no Maracanã na volta, ainda passou em cima da Ponte Preta e de Grêmio, mas parou nas quartas de final contra Palmeiras, fracassando nos últimos momentos do jogo no Parque Antártica. Uma pena, para qualquer rubro-negro, do Rio de Janeiro até o Nordeste.

  • Jogos eternos #117: Flamengo 6×0 São Cristóvão 1978

    Jogos eternos #117: Flamengo 6×0 São Cristóvão 1978

    Hoje, Flamengo finalmente volta em campo com o início do campeonato carioca. Vamos então para o jogo eterno do dia de uma abertura do campeonato carioca, um campeonato que mudou a história do Flamengo, quando finalmente conquistou o título em 1978 depois de várias decepções e iniciou a melhor era de sua história, com uma geração de ouro.

    O campeonato carioca de 1978 começou contra o São Cristóvão, um time que hoje, e faz tempo, não joga mais na primeira divisão do campeonato carioca, mas um time tradicional, que viu passar Leônidas da Silva, Fio Maravilha e, além de tudo, revelou o Ronaldo Fenômeno. Em 1978, São Cristóvão ainda era um bom time do campeonato carioca e no 3 de setembro de 1978, Cláudio Coutinho escalou Flamengo assim para o início do campeonato carioca: Raul; Toninho Baiano, Manguito, Nelson, Júnior; Paulo César Carpegiani, Adílio, Zico; Tita, Cláudio Adão, Cleber.

    No Maracanã, na frente de 36.802 pagantes e uma geral que ainda era uma geral, Flamengo não tardou a brilhar. Na direita, Tita para Zico que, com um toque só mas um toque do gênio que era, deixou Cláudio Adão sozinho na frente de gol, que só tinha a vencer o goleiro para abrir o placar. Logo depois, na esquerda, uma tabelinha certinha entre Adílio e Cleber, que fez o segundo gol do dia.

    No segundo tempo, um toque de Cleber para Cláudio Adão, que teve tempo, muito tempo, para chutar e fazer o gol fácil. Depois, o gol mais bonito do dia. Uma dupla tabelinha entre Júnior e Adílio e a bola sobrou nos pés de Zico na grande área. Nosso Rei driblou um e achou o pequeninho espaço no cantinho para fazer o gol. Um gol só para Zico, o espaço entre a trave e o goleiro era menor do que a própria bola, mas Zico achou um jeito de fazer o gol. E Zico fez o doblete, depois de cruzamento de Cláudio Adão, Zico deixou a bola cair uma vez no gramado e voleiou sem chance para o goleiro. A goleada estava cada vez maior, agora Flamengo 5×0 São Cristóvão.

    E o sexto e último gol foi o mais fácil, o mais bizarro também. Jogada começou com Zico no meio de campo, que tentou lançar Adílio, o zagueiro do São Cristóvão interveio e recuou para o goleiro Geraldão, que soltou no chão com bola na mão, e já bola não mais na mão. Geraldão deixou escapar a bola e Adílio só teve a empurrar nas redes. Flamengo estreava bem num campeonato que terá um final ainda mais feliz, com o gol eterno do Deus da Raça, Rondinelli.

  • Times históricos #25: Flamengo 1955

    Times históricos #25: Flamengo 1955

    Ainda homenageando Zagallo, vamos voltar ao ano de 1955, um dos maiores da história do Flamengo. Zagallo já era titular nesse time, que tinha um dos ataques mais poderosos de sua história, com craques, apenas craques, só craques. Ainda tinha Rubens que desfilava sua classe no meio de campo. Nesse período, a temporada ia um pouco além do calendário gregoriano e Flamengo ainda visava o bicampeonato carioca 1954 no início de 1955.

    O ano de 1955 do Flamengo começou então já no 2 de janeiro, com um empate 1×1 contra o America no Maracanã, gol de Benítez. Flamengo tinha um toque de Paraguai, com também o técnico Fleitas Solich, trazido pelo presidente Gilberto Cardoso, que tomou posse em 1951. Gilberto Cardoso está para mim no top 3 dos presidentes da história do Flamengo ao lado de José Bastos Padilha, que abriu o Flamengo ao povo nos anos 1930 e Márcio Braga, que conquistou o mundo nos anos 1980. Nos anos 1950, Gilberto Cardoso abriu Flamengo ao mundo, com excursões na Europa e contratações de craques e técnico estrangeiros.

    No 12 de fevereiro de 1955, de virada contra Vasco, o “Rolo Compressor” do Flamengo conquistou o campeonato carioca 1954. Era tempos de carnaval, Flamengo festejou o título no Maracanã alguns dias depois com uma goleada contra a Estrela Vermelha da Iugoslávia, doblete de Evaristo de Macedo, gols de Zagallo e Babá. O último jogo do campeonato carioca também virou uma festa, uma das mais impressionantes da história do Maracanã. Pela primeira vez, a escola da Mangueira desfilou no Maracanã, com a presença de Marta Rocha, primeira Miss Brasil eleita e segunda colocada na eleição de Miss Universo 1954, e de duas atrizes americanas mais famosas da época, Ginger Rogers e Elaine Stewart. E mais, a Samba Rubro-Negro de Wilson Batista virou hit no Rio de Janeiro e não posso faltar de lembrar a letra: “Flamengo joga amanhã, eu vou pra lá, vai haver mais um baile, no Maracanã, o Mais Querido tem Rubens, Dequinha e Pavão, eu já rezei pra São Jorge, por Mengão ser campeão”. E para uma festa completa, Flamengo goleou 5×1 Bangu, o Flamengo era o dono da cidade.

    No Torneio Rio – São Paulo, Flamengo estreou com goleada 5×1 contra Santos e mais um doblete de Evaristo de Macedo. Flamengo finalmente fechou a competição no quarto lugar, três pontos a menos do que o campeão, a Portuguesa. Em pleno Centenário de Montevidéu, Flamengo derrotou 3×2 o Peñarol, mais uma vez com um doblete de Evaristo de Macedo. No comando de Jayme de Almeida e com um time reserva, mas que tinha entre outros Índio, Hermes e Henrique Frade, Fla conquistou na Bahia a Taça da Amizade. E Flamengo voltou a maltratar os uruguaios, conquistando o Troféu Marechal Eurico Gaspar Dutra com duas vitórias 3×2 sobre o Nacional no Maracanã. Na ida, gols de Esquerdinha, Índio e Evaristo de Macedo. Na volta, gols de Evaristo de Macedo, Duca e Joel. Flamengo tinha um timaço, foram muitos gols, 155 em 1955 em apenas 60 jogos, com Zagallo já ajudando na marcação e dando mais liberdade aos outros jogadores do ataque.

    No Torneio Internacional Charles Miller, entre o Maracanã e o Pacaembu, Flamengo perdeu contra o America e o Corinthians, mas derrotou os dois time estrangeiros, Benfica 1×0 gol de Evaristo, Peñarol 2×1 doblete de Joel. No campeonato carioca, Flamengo estreou com vitória, 2×0 contra Canto do Rio, gols de Rubens e Paulinho, e goleou em seguida Madureira, Bonsucesso e a Portuguesa. Ainda venceu Botafogo, antes de conhecer a primeira derrota no campeonato, no Fla-Flu. O grande ídolo Rubens jogou um pouco menos, entre lesões e conflito com Fleitas Solich. Duca e Paulinho passaram a jogar mais, e ainda reinava no meio de campo Dequinha, que substituiu Modesto Bría e será substituído pelo Carlinhos, só craques, só ídolos. Evaristo de Macedo, artilheiro da temporada com 34 gols, rompeu os ligamentos do joelho e foi substituído por um jovem atacante alagoano, futuro craque e ídolo, Dida, que fez vários gols, inclusive um hat-trick contra Canto do Rio. Flamengo tinha um timaço e Fleitas Solich recebeu o apelido de “Feiticeiro” por revelar tantos jovens jogadores.

    Infelizmente, o Flamengo não foi só vitórias, craques e festa no Maracanã. No 26 de novembro, Flamengo perdeu seu presidente, de forma dramática. No ginásio do Maracanazinho, Gilberto Cardoso assistia a um jogo de basquete de nosso Flamengo e Guguta fez no último segundo a cesta que ofereceu ao Flamengo a vitória 45-44 contra Sírio e Libanês. O coração rubro-negro de Gilberto Cardoso não aguentou, o presidente morreu de uma parada cardíaca fulminante. Tinha apenas 49 anos. Escreveu Henrique Pongetti: “Gilberto Cardoso foi vítima de um acidente sentimental. Os cardiologistas podem dar um nome complicado ao acidente reduzindo-o a um mero caso fisiológico. Eu acho que foi amor ao rubro-negro num coração insuficiente, coração de qualquer outro ser humano. Doença não havia: havia falta de espaço”. Além do presidente, Flamengo perdeu uma torcedora ilustre, a atriz Carmen Miranda, que se apaixonou pelo Mengo ao mesmo tempo que se apaixonou por um remador do clube, Mário Augusto Pereira da Cunha, já em 1925. Carmen Miranda fez sucesso nos Estados Unidos, mas deu sorte ao Flamengo quando assistiu ao jogo contra Vasco no fevereiro de 1955, com vitória de virada do Mengo e bicampeonato carioca. Carmen Miranda faleceu em agosto de 1955, também jovem, com apenas 45 anos.

    No sepultamento de Gilberto Cardoso, o padre Góes, outro nome ilustre na história do Flamengo, prometeu o tricampeonato carioca. Mas só chegará no início de 1956, quando Flamengo passou a usar um calça preta em homenagem ao seu querido presidente. Gosto do uniforme tradicional de calça branca, mas também acho muito lindo com a calça preta, ainda mais com essa homenagem ao Gilberto Cardoso, que tinha o rubro-negro no corpo e na alma. Deixo o jogo do título, com goleada contra America e atuação magistral de Dida, para uma outra crônica. Flamengo fez seu último jogo do campeonato carioca em 1955 contra Fluminense. O tricolor Didi abriu o placar, mas depois foi só Flamengo, apenas Flamengo. Com hat-trick de Paulinho, doblete de Dida, gol de Joel, Flamengo goleou 6×1. A goleada foi tão imoral que os jogadores do Fluminense foram multados pela diretoria.

    No final do ano, Gilberto Cardoso, que merecidamente deixou seu nome ao ginásio do Maracanazinho, mesmo no céu rubro-negro, fez outro milagre: reuniu Flamengo e Vasco. No 23 de dezembro, um combinado Flamengo-Vasco enfrentou um time que juntava também dois inimigos, o Racing e o Independiente da Argentina. Com camisa rubro-negra e calça preta, o combinado Fla-Vasco abriu o placar graças ao Paulinho. Os argentinos empataram, e no início do segundo tempo, Dida deixou de novo os cariocas na frente, antes do terceiro gol assinalado pelo vascaíno Parodi. Os quatro times jogaram depois o Torneio Internacional do Rio de Janeiro, também chamado de Torneio Internacional Gilberto Cardoso. Na semifinal, Flamengo derrotou o Racing 2×1, gols de Dida e Babá. No 30 de dezembro de 1955, no Maracanã, Flamengo conquistou facilmente o título, com vitória 3×0 contra o Independiente, gols de Milton, Dida e Duca. Assim acabava o ano de 1955, com mais um sucesso contra um time estrangeiro, confrontos de quem o Gilberto Cardoso foi um dos maiores incentivadores. Na presidência de Gilberto Cardoso entre 1951 e 1955, Flamengo fez 49 jogos contra times estrangeiros, da Europa e da América do Sul, com um retrospecto incrível: 31 vitórias, 15 empates e apenas 3 derrotas. Assim era o Flamengo do início dos anos 1950, Rolo Compressor e campeão, mesmo nas tristezas mais pesadas.

  • Jogos eternos #116: Flamengo 2×3 São Paulo 2001

    Jogos eternos #116: Flamengo 2×3 São Paulo 2001

    Vamos continuar às homenagens ao Zagallo com esse jogo entre Flamengo e São Paulo de 2001. E olha a ironia, homenageando um dos maiores vitoriosos do futebol brasileiro com, pela primeira vez no Francêsguista, um jogo eterno que acabou com uma derrota do Flamengo. Mas a derrota não impediu o título do Flamengo, o último da carreira de Zagallo, mais uma vez campeão, então tudo está na ordem.

    Eu já escrevi sobre a competição, a Copa dos Campeões, com campeões de várias competições estaduais e nacionais, e o jogo de ida da final, uma chuva de gols entre Flamengo e São Paulo no Almeidão de João Pessoa. No final, um jogo eterno aqui e uma vitória 5×3 do Flamengo. Três dias depois, as duas equipes ficaram para o jogo de volta no Nordeste, desta vez em Maceió, no estádio Rei Pelé. O estádio foi chamado assim porque a inauguração aconteceu poucas semanas depois do tricampeonato da Seleção, Pelé fazendo show nos gramados mexicanos, sob a maestria do técnico Zagallo. E mais, jogo aconteceu em Maceió, cidade natal de Zagallo. O ciclo estava quase fechado, só faltava o título.

    No 11 de julho de 2001, Zagallo escalou Flamengo assim: Júlio César; Alessandro, Juan, Gamarra, Cássio; Leandro Ávila, Rocha, Beto, Petkovic; Edílson, Reinaldo. Flamengo se classificou para a Copa dos Campeões como campeão carioca, com o gol eterno de Pet contra Vasco, também um jogo eterno no Francêsguista. Já o São Paulo se classificou graças a vitória no Torneio Rio – São Paulo e a grande atuação de um jovem craque, Kaká. São Paulo tinha um timaço, ao lado de Kaká, tinha Rogério Ceni e Belletti, que também foram pentacampeões do mundo um ano depois. O Tricolor tinha uma dupla de ataque poderosa com França e Luís Fabiano, e ainda tinha Júlio Baptista no banco. Um timaço, mas Flamengo tinha um maestro na armação do jogo, Petkovic, e um maestro no banco, Zagallo.

    Precisando da vitória, São Paulo partiu ao ataque, sem fazer o gol. Flamengo reagiu, também sem fazer o gol. São Paulo insistiu, ainda sem fazer o gol. O jogo estava longe da chuva de gols do jogo de ida, até o finalzinho do primeiro tempo, quando França recebeu a bola na esquerda, avançou e achou Kaká. Bem ao seu estilo, Kaká fez um drible curto, e chutou bem, chutou forte, chutou preciso, bola na gaveta, São Paulo na frente no jogo, mas Flamengo ainda campeão.

    São Paulo podia acreditar ao título no intervalo, momento para os técnicos de achar as palavras certas para incentivar o time. Zagallo era um mestre neste quesito. Com apenas dois minutos no segundo tempo, uma falta para Flamengo, na direita. Petkovic era um mestre neste quesito. Pet cruzou, a curva foi sensacional, Juan cabeceou, a bola foi nas redes. Flamengo empatou no jogo e estava bem perto do título.

    O título se aproximou ainda mais dez minutos depois, com uma falta a 25-30 metros do gol são-paulino. Petkovic eternizou-se na história do Flamengo com o golaço de falta na hora do Tri contra Vasco, no minuto 43 no Maraca. Mas alguns cegos, loucos, burros tiveram a ousadia de dizer que foi sorte. Não, era trabalho, talento, dedicação, era um gol com a cara do Flamengo, do Petkovic. Então Petkovic fez um gol bis, a mesma corrida, o mesmo chute, a mesma força, o mesmo ângulo. E Rogério Ceni virou Helton, só conseguindo se aproximar da bola, sem impedir o golaço. E mesmo com os dois gols de França e a vitória parcial de São Paulo, Flamengo virou campeão, voltou na Libertadores quase dez anos depois da última participação. Assim, foi, na sua cidade natal, o último título de Zagallo, concluindo uma das carreiras mais vitoriosas de todos os tempos.

  • Ídolos #28: Zagallo

    Ídolos #28: Zagallo

    O início do ano de 2024 do Flamengo começa de maneira muito difícil, alguns dias depois do falecimento de Denir, Mário Jorge Lobo Zagallo morreu aos 92 anos e se juntou no céu aos outros ídolos da primeira Copa do Mundo conquistada pelo Brasil, em 1958. Porque Zagallo não é só um ídolo do Flamengo, é um dos maiores brasileiros de todos os tempos, uma referência do futebol no mundo, ainda hoje, é provavelmente por muito tempo, talvez a eternidade, o único a ter quatro Copas do Mundo.

    Mário Jorge Lobo Zagallo nasceu no 9 de agosto de 1931 em Maceió, Alagoas, terra também de Marta, e chegou antes de seu primeiro aniversário no Rio de Janeiro. Ingressou a base do Flamengo e fez seu serviço militar, assistindo como soldado no campo a maior tragédia da Seleção, o Maracanaço em 1950. Um ano depois, foi lançado no time principal do Flamengo pelo Flávio Costa numa goleada 6×0 contra Goytacaz num amistoso. Seu primeiro jogo no campeonato carioca só chegou no início de 1953, quando o técnico era Jayme de Almeida. Um mês depois, fazia seu primeiro gol com o Manto Sagrado, contra Boca Juniors no Maracanã. Fez apenas um jogo do campeonato carioca de 1953, suficiente para ser campeão no comando de Fleitas Solich. Já no início da carreira, Zagallo conhecia grandes treinadores e o que ele parecia só saber fazer: ser vitorioso, ser campeão.

    Em 1954, Zagallo virou titular num ataque que tinha mais craques do que vagas: Rubens, Joel, Índio, Evaristo, Benítez, Dida e o próprio Zagallo, que fez 3 gols durante o campeonato carioca. Mas Zagallo era muito mais que os gols, ao lado de Telê no Fluminense, foi um dos primeiros pontos recuados, ajudando na marcação no meio de campo, ajudando os companheiros do ataque a ter mais liberdade. Zagallo foi um soldado do futebol, disciplinado e vitorioso. Conquistou o bicampeonato carioca em 1954, o tricampeonato em 1955, o segundo tri da história do Flamengo. Em 1956, o tetra não veio, mas Zagallo fez neste ano seu único doblete com o Manto Sagrado, numa vitória 6×2 contra Monte Alegre.

    Em 1957, Zagallo fez gol nas goleadas 7×0 e 8×0 contra Canto do Rio e Madureira, fez gol contra o Santos de Pelé e contra o Botafogo de Garrincha. O primeiro foi goleado 4×0, com gol de Zagallo no primeiro minuto de jogo, o segundo conseguiu o empate 3×3 no Maracanã. Zagallo não brilhou só no Rio de Janeiro, também fez gol na Europa, na vitória 4×0 contra Burnley no Nou Camp, um jogo eternizado no Francêsguista. No Torneio Rio – São Paulo 1958, Flamengo goleou Botafogo 4×0 e Zagallo jogou muito. Algumas semanas depois, Zagallo estreava na Seleção Brasil, com 26 anos, pouco antes da Copa do Mundo, e estreou muito bem, com 2 gols contra o Paraguai. Tinha na sua posição jogadores mais craques, mais gênios, com Pepe e Canhoteiro. Mas Zagallo era diferente. Explica o próprio Zagallo no livro As melhores seleções brasileiras de todos os tempos, de Milton Leite: “Eu era um jogador de 100 metros, fazendo aquele vai e vem, ajudando na marcação e na armação, já era assim no Flamengo. Pepe e Canhoteiro eram as duas forças para irem à Copa, mas eu acabei conquistando o lugar por jogar de outro jeito”. E Zagallo foi na Copa, virou titular, fez gol na final, e o Brasil foi campeão, mudou sua história.

    E Zagallo, único flamenguista a ser campeão do mundo como titular, o Brasil tinha Dida, Joel e Moacir na reserva, mudou de clube. Zagallo era um jogador diferente, também um homem diferente. Aceitou no Flamengo um salário menor para ser dono de seu passe no fim do contrato, o passe impedia vários jogadores de mudar de clube, mesmo em fim de contrato. Não para Zagallo, que tinha propostas de Palmeiras e da Portuguesa. Mas, esperto, esperou a Copa, se valorizou ainda mais, e teve propostas ainda maiores. E, contra a vontade dos dirigentes rubro-negros, mas conforme ao desejo da mulher que queria ficar no Rio de Janeiro, Zagallo assinou com o Botafogo de Didi, Garrincha, Nílton Santos e muitos outros, onde conquistou mais dois campeonatos cariocas, em 1961 e 1962. No Flamengo foram 218 jogos e 26 gols, o último, como o primeiro, contra um time argentino, num 3×3 contra o Racing na Bombonera.

    Zagallo não era mais do Flamengo, mas ainda era ídolo, do Flamengo, e do Brasil, conquistando em 1962 uma segunda Copa do Mundo, de novo como titular. Talvez sem Zagallo, o Brasil não teria brilhado tanto, Zagallo sendo o equilíbrio do time. “O Zagallo era o único atacante que ajudava o meio-campo” explicou o primeiro capitão campeão do mundo, Bellini. Depois, Formiguinha como era chamado por causa da atividade na defesa, teve algumas lesões e aposentou-se no Botafogo aos 34 anos. Mesmo discreto, Zagallo era um líder dentro do campo, tinha que ser fora, virou treinador, ficou o homem vitorioso que ele sempre foi. De novo com Botafogo, conquistou o bicampeonato carioca 1967-1968 e o Torneio Roberto Gomes Pedrosa 1968, que depois virou um Brasileirão. E mais, Zagallo virou técnico da Seleção, confirmou Pelé como titular, Tostão também, parece obvio hoje mas não era na época, e recuou Piazza na zaga. E de novo, foi campeão. Antes dos 40 anos, Zagallo se tornou o primeiro homem da história do futebol a ser campeão do mundo como jogador e como técnico.

    Zagallo repetiu a dupla de sucesso do Tri com o então preparador físico Carlos Alberto Parreira, conquistando com Fluminense o campeonato carioca 1971 que parecia muito perdido. E Zagallo voltou no Flamengo, agora como técnico, em 1972. E Zagallo de novo ganhou o campeonato carioca, já o quarto como treinador depois de ter conquistado cinco como jogador. Porém, Zagallo deixava no banco um jovem promissor que tinha estreado um ano antes no time principal, um certo Zico. Com Zagallo, Zico disputou apenas 8 dos 74 jogos do Flamengo em 1972. Relembra Zico no livro Zico, 50 anos de futebol, de Roger Garcia: “Eu poderia ter saído por causa do Zagallo. E só permaneci em atividade mesmo porque o Antoninho apareceu na Gávea pedindo para eu jogar no juvenil. O Zagallo de fato raras vezes me solicitou, e quando o fez, me botava 15, 20 minutos, fora da minha posição, na ponta-direita, no meio-campo, na ponta-esquerda”.

    Em 1973, Zico jogou muito mais jogos, mas quase sempre como reserva. Zagallo saiu do Flamengo no final do ano, Zico virou titular absoluto e campeão carioca em 1974. E o técnico Joubert, que tinha jogado com Zagallo no Flamengo nos anos 1950, dedicou o título ao próprio Zagallo: “Foi ele quem me incentivou, quem acreditou no meu trabalho e que me indicou para substituí-lo”. Com a Seleção, Zagallo ficou na quarta colocação na Copa do Mundo de 1974, um resultado ruim para ele, e passou por vários clubes entre Rio de Janeiro, onde dirigiu os quatro gigantes, e o futebol árabe. Em 1994, voltou a fazer a dupla de sucesso com Carlos Alberto Parreira, agora na função de coordenador técnico da Seleção. Era a quarta Copa do Mundo de Zagallo, um recorde até hoje, talvez para sempre. Em 1998, Zagallo voltou na final da Copa, mas foi derrotado pelo meu país, a França. Como já falei várias vezes nesse blog, descobri o futebol com 6 anos durante a Copa do Mundo de 1998 e me apaixonei diretamente pelo Brasil. Zagallo, na época um senhor de 67 anos, foi então o técnico do primeiro time de meu coração. E claro, na época, estava longe de saber o quanto ele era um monumento do futebol.

    Zagallo foi, ainda é, um monumento do futebol. Não é exagero considerar ele ao lado de Pelé o personagem mais importante do futebol brasileiro. Vale a pena deixar um trecho do livro Os 100 melhores jogadores brasileiros de todos os tempos de André Kfouri e Paulo Vinicius Coelho: “Não há brasileiro mas intimamente ligado à Seleção. Hoje em dia, quando alguém diz que determinada camisa ‘é minha segunda pele’, é quase impossível acreditar. Mas imagine Zagallo falando dessa forma sobre a camisa de Seleção Brasileira de futebol e diga se não soa absolutamente autêntico”. E depois de todos os sucessos com Botafogo e a Seleção, Zagallo voltou no Flamengo no final de 2000. Na final do campeonato carioca 2001, Flamengo perdeu o jogo de ida com falta do jovem Juan nos dois gols vascaínos. Mas Zagallo manteve sua confiança no Juan, falando para ele que ia chegar até a Seleção, e em todos os outros jogadores. Escreve Marcos Eduardo Neves no seu livro 20 jogos eternos do Flamengo: “O time confiava no que dizia Zagallo. Sem vaidade, aos 69 anos de idade, o comandante vibrava feito menino, conclamando cada um a dar o melhor de si. Como, por sinal, houvera feito em abril de 1956, quando conquistou o Tri dentro de campo para o clube. Em referência ao brasileiro campeão mundial de boxe, Zagallo pedia onze ‘Popós’ em campo. Com sete pratas da casa entre os titulares – o goleiro, os quatro zagueiros, o meia Rocha e o atacante Reinaldo –, personalidade e identificação não iriam faltar”.

    E no 27 de maio de 2001, claro um jogo eterno no Francêsguista, com estátua de Santo Antônio no bolso de Zagallo, com bola na gaveta de Pet, Flamengo foi campeão, Vasco vice, Flamengo tricampeão. No final do ano, Zagallo chegou aos 281 jogos como técnico do Flamengo. Ainda é hoje o quarto com mais jogos na história do clube atrás de Flávio Costa, que lançou Zagallo como profissional, Fleitas Solich, técnico no tricampeonato 1953-1955 com Zagallo no time, e Carlinhos, que estreou no time principal em 1958, ano da saída de Zagallo do clube. Mas de todos os 281 jogos, o mais marcante é sim o jogo do título contra Vasco, maior alegria de toda uma geração de rubro-negros. Falou um exaltado, quase alucinado Zagallo no final do jogo: “Era minha última oportunidade de conquistar um novo Tri. Este tricampeonato, na minha vida, valeu como se eu tivesse ganho outra Copa do Mundo”. Assim foi a prova final de um dos maiores ídolos do futebol mundial em geral e do Flamengo em particular.

  • Jogos eternos #115: Flamengo 1×0 Goiás 1990

    Jogos eternos #115: Flamengo 1×0 Goiás 1990

    O time sub-20 do Flamengo estreou na Copinha, competição de juniores que Flamengo ganhou pela primeira vez em 1990, com um dos melhores times, se não o melhor, da história da competição. Para o jogo de hoje, um jogo profissional como sempre, mas já com alguns jogadores da base, um título também inédito de 1990, a final da Copa do Brasil contra Goiás.

    A Copa do Brasil só foi criada em 1989 e neste ano, Flamengo perdeu na semifinal contra o futuro campeão, Grêmio. Um ano depois, Flamengo voltava na competição, classificado como vice-campeão do campeonato estadual. Na época, tinha apenas 32 times na Copa do Brasil e faltava assim vários grandes times. Flamengo não vencia o campeonato carioca 1986, mas mesmo assim, conseguiu a vaga para a Copa do Brasil de 1990.

    Flamengo estreou na competição com duas goleadas contra Capelense, a primeira um jogo eterno no Francêsguista. Passou de Taguatinga, time do Distrito Federal, Leonardo fazendo gol tanto na ida do que na volta. Flamengo eliminou Bahia com gol de Aílton no final do jogo, e quase ganhou o ingresso para a final já no jogo de ida da semifinal, com vitória 3×0 contra Náutico, Gaúcho fazendo dois gols no segundo tempo. O 2×2 na volta, gols de Djalminha e Renato Gaúcho, serviu para anunciar o placar agregado da final do Brasileirão dois anos depois, 3×0 e 2×2 contra Botafogo, e para chegar na final da Copa do Brasil como invicto.

    Flamengo podia pela segunda vez neste ano de 1990 conquistar um título inédito depois da Copinha. Piá e Djalminha jogaram as duas finais, Nélio também entrou no jogo na volta da Copa do Brasil. Ainda tinha Júnior Baiano, Rogério Lourenço e Marquinhos, que não jogaram nenhuma das finais, mas que são campeões dos dois torneios. Por causa de obras no Maracanã, a final da Copa do Brasil de 1990 aconteceu no estádio Mario Helênio de Juiz de Fora, também palco do último jogo de Nosso Rei Zico com o Manto Sagrado, um 5×0 no Fla-Flu, também eternizado no blog.

    No Minas Gerais, Flamengo enfrentou para um título inédito Goiás, que tinha eliminado nas fases anteriores dois gigantes mineiros, Cruzeiro e o Atlético Mineiro. No 1o de novembro de 1990, Jair Pereira escalou Flamengo assim: Zé Carlos; Aílton, Vitor Hugo, Fernando, Piá; Júnior, Marquinhos, Zinho, Djalminha; Renato Gaúcho, Gaúcho. Um time de craques e ídolos, prontos para escrever a história. Flamengo dominou o primeiro tempo, Renato Gaúcho parecia estar envolvido em cada lance perigoso do Flamengo, mas o placar não saía do 0x0. No intervalo, nada de gol, nada de título decidido.

    No segundo tempo, Goiás voltou melhor e chegou a levar perigo na área do Flamengo, com um goleador nato, Túlio Maravilha. Mas Zé Carlos foi bem, tanto na linha do gol que nas saídas. Com uma hora de jogo, Djalminha abriu na esquerda para Piá, que chegou em velocidade e sofreu falta dura de Richard, merecidamente avertido pelo juiz. Na cobrança, de novo Djalminha, craque e filho de craque, Djalma Dias. Djalminha cruzou de pé esquerdo, a curva foi perfeita, a chegada na segunda trave de Fernando também, o zagueiro cabeceou e fez o gol de um título que se aproximava.

    Flamengo venceu 1×0 e Fernando, expulso no final do jogo de ida, não viu o jogo de volta. E o Serra Dourada não viu gols, mas viu o Flamengo ser campeão, pela primeira vez e como invicto, da Copa do Brasil. Pena que essa geração de jovens craques da casa não foi mais longe, mas deu alegrias e títulos, a Copa do Brasil de 1990, o campeonato carioca de 1991 e o Brasileirão de 1992.

  • Jogos eternos #114: Flamengo 2×1 Volta Redonda 2021

    Jogos eternos #114: Flamengo 2×1 Volta Redonda 2021

    O ano de 2024 começou com uma notícia muito ruim para o Flamengo, o falecimento de Denir, histórico massagista do clube. O jogo eterno de hoje não é para o jogo mesmo, mas para Denir, que levantou neste dia de 2021 a taça de campeão, quase 40 anos depois de sua chegada no Flamengo.

    No 24 de abril de 2021, para o jogo contra Volta Redonda, Rogério Ceni escalou Flamengo assim: Diego Alves; Matheuzinho, Bruno Viana, Gustavo Henrique, Renê; Willian Arão, Gerson; Michael, Vitinho, Gabigol, Pedro. Um time misto, por causa dos jogos da Copa Libertadores no mesmo período. Porém, o jogo estava importante e decidia o vencedor da Taça Guanabara, o primeiro turno do campeonato carioca. Com dois pontos atrás de Volta Redonda, Flamengo precisava absolutamente da vitória para ser campeão.

    Num Maracanã vazio por causa da pandemia de Covid, Flamengo dominava o jogo, ainda sem marcar, apesar de duas boas oportunidades de Gabigol. No final do primeiro tempo, aproveitando de um passe muito bom de Gustavo Henrique e da semi-falha do goleiro adversário, Michael abriu o placar. Mas Volta Redonda empatou ainda antes do intervalo, Bruno Barra fazendo o gol num escanteio. Com uma hora de jogo, Matheuzinho recebeu a bola no campo do Flamengo, acelerou e ganhou 30 metros até fazer um passe para Vitinho, que teve tempo suficiente para ajustar o goleiro e fazer o gol do título com um belo chute.

    Flamengo era o campeão e quem levantou a taça foi Sr Adenir Silva, o Denir. O massagista tinha se afastado no Flamengo no final de 2020 por causa dos casos positivos de Covid no clube. Deixou muitas saudades entre os jogadores, que fizeram depois essa linda homenagem com Denir levantando a taça de campeão depois de voltar ao seu dia a dia. Um dia a dia de quase 40 anos, Denir chegou no Flamengo em 1981. Talvez não coincidentemente, Flamengo levantou sua primeira taça de campeão da Copa Libertadores menos de um mês depois da chegada de Denir.

    Denir viu de perto a geração de Zico e de todos os craques da década de 1980, depois vários ídolos passaram entre as mãos de Denir, como Romário, Sávio, Petkovic, Adriano, até a geração multicampeã de 2019, entre outros Bruno Henrique, Filipe Luís, Diego e Gabigol, que costumava beijar as mãos de Denir, em sinal de respeito e gratidão. O Denir foi campeão de tudo com o Maior de todos e ainda ganhou a Copa do Mundo 2002 com a Seleção. Mas o legado de Denir vai além dos títulos.

    No Flamengo, tudo muda, a diretoria, os jogadores, até a torcida. E às vezes, a ligação do Flamengo com o povo, traço histórico do clube, fica mais distante. Com Denir, o povo se sente representado no Flamengo. Denir tinha essa humildade que não podia ser forçada ou disfarçada, uma humildade que se vê no sorriso, na atitude simples, uma humildade que conquista todos. Por isso, era ídolo dos torcedores rubro-negros.

    Outro massagista histórico do futebol brasileiro, Mário Américo escreveu nas suas memórias: “O massagista, no futebol, tem que ser um psicólogo, porque o jogador recorre mais a ele que ao médico, e o torna seu confidente”. Por isso, Denir era amigo dos jogadores, trazia um pouco de simplicidade e autenticidade no dia a dia irreal dos jogadores. Denir trabalhou com o mesmo profissionalismo e a mesma dedicação durante 40 anos. Por isso, era respeitado até pelos torcedores rivais.

    Diagnosticado com um câncer no cérebro em 2022, voltou no Ninho do Urubu para uma homenagem depois da cirurgia em 2023. Recebeu uma placa e deveria virar busto na Gávea de tanto um patrimônio histórico do clube ele é. Hoje, Denir se juntou no céu rubro-negro ao Jorginho, outro massagista histórico do Flamengo e falecido em 2020 por causa da Covid, e aos 10 garotos do Ninho, de quem Denir vai cuidar com a mesma atenção que ele teve durante mais de 40 anos no Flamengo. Descanse em paz Denir, você vai deixar muitas saudades.

    Para fechar a crônica, deixo a nota oficial do Flamengo sobre o falecimento de Denir: “Hoje, o Flamengo chora. Perdemos um dos nossos. Adenir Silva, o nosso Deni, nos deixou aos 75 anos. Um pilar de nossos valores, um símbolo máximo do rubro-negrismo, um griô em vermelho e preto. Poucas são as palavras capazes de definir um homem que se tornou ídolo da Maior Torcida do Mundo sem jamais ter entrado em campo como atleta do clube. Desde 26 de outubro de 1981 – até a eternidade –, o Flamengo foi e é Deni. Por 42 anos, dois meses e cinco dias, o Manto Sagrado foi cuidado com o capricho, a altivez e a sabedoria de um guardião apaixonado por nossas cores e por quem somos. Que sempre nos lembremos de Deni quando nos lembrarmos do Flamengo – sempre foram e para sempre serão sinônimos”.

O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”