Francêsguista

Francês desde o nascimento, carioca desde setembro de 2022. Brasileiro no coração, flamenguista na alma. Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte.

  • Jogos eternos #197: Internazionale 1×2 Flamengo 1983

    Jogos eternos #197: Internazionale 1×2 Flamengo 1983

    Ontem, o Adriano Imperador, Imperatore para os italianos, anunciou seu jogo de despedida no Maracanã entre os dois clubes com quem brilhou mais, nosso Flamengo e a Inter de Milão. Antes de homenagear mais nosso Didico, vamos voltar ao primeiro Flamengo x Inter de Milão da história, no San Siro, em 1983.

    A competição de 1983 que reuniu Flamengo e a Inter de Milão foi amistosa, mas muito importante, e tinha como participantes só gigantes, (quase) só campeões mundiais: Flamengo, Peñarol, Milan, Internazionale e Juventus. A Copa Intercontinental, que na época valia Mundial, sem dúvida e nem pergunta, mudou de formato em 1980, com um jogo único no Japão. Não convenceu muito os italianos e o canal de televisão Canale 5 criou a Coppa Supermondiale Clubs, também chamada de Mundialito. Não se trata de um Mundial de clubes, que só existiu entre 1960 e 2004 como Copa Intercontinental e permanece desde 2005, com primeiro experimento em 2000, como Copa do Mundo de Clubes da FIFA. Porém, foi um torneio muito prestigioso, como existia nos anos 1950 e 1960, no final da temporada da Europa, com grandes times, seja da Europa, seja da América do Sul. A Inter de Milão levou a primeira edição, em 1981.

    Em 1983, o Mundialito voltou na Itália, com a participação dos três gigantes da Itália, a Internazionale, campeã mundial em 1964 e 1965, o Milan, campeão em 1969 e a Juventus, que ainda não tinha vencido o Mundial de clubes, mas era o campeão italiano 1982, ainda reforçada na temporada com dois gênios, o francês Michel Platini e o polonês Zbigniew Boniek. Do lado da América do Sul, tinha os dois últimos vencedores da Copa Libertadores, Peñarol em 1982 e nosso Flamengo em 1981.

    No 29 de maio de 1983, Flamengo derrotou Santos e conquistou seu terceiro Brasileirão em 4 anos, um jogo eterno no Francêsguista. Mas a torcida não sabia, os jogadores também não, Flamengo perdia ali seu maior craque, sua referência, a alma de seu time, Zico, vendido pelo presidente Dunshee de Abranches. A notícia chegou dias depois do título contra Santos, a torcida ficou sem acreditar, demorou a entender e ainda mais a aceitar, mas Zico não era mais do Flamengo. Com o empréstimo de Tita no Grêmio, a camisa 10 órfã ficou nas costas de quem jogou muito contra Santos, o saudoso Adílio, ainda custa muito para mim de escrever “saudoso”.

    Menos de um mês depois da saída traumática de Zico, Flamengo foi na Europa para o Mundialito e sua estreia marcou o início do torneio, contra a Inter de Milão. O time italiano tinha um grande time, o nome mais conhecido sendo o lateral Giuseppe Bergomi, que disputou toda sua carreira na Internazionale. Outro jogador do time que apenas defendeu a camisa nerazzurra durante toda a carreira é Giuseppe Baresi, sim, o irmão do lendário zagueiro Franco Baresi, que apenas jogou no grande rival, o Milan. No ataque, a Internazionale tinha o brasileiro Juary e ainda contava para o torneio com o reforço do holandês van der Gijp. Última prova do prestígio do torneio, 39.957 espectadores foram ver o primeiro jogo do torneio, o primeiro Internazionale x Flamengo da história.

    Mesmo sem Zico, Flamengo tinha um timaço. Assim, no 24 de junho de 1983, o também saudoso Carlos Alberto Torres escalou Flamengo assim: Raul; Leandro, Marinho, Figueiredo, Júnior; Andrade, Vítor, Adílio; Robertinho, Júlio César Barbosa, Baltazar. No prestigioso San Siro, Flamengo começou mal e levou o primeiro gol aos 9 minutos de jogo. O camisa 10 da Inter de Milão, Beccalossi, abriu na profundidade para o capitão Bini, que chutou do pé direito. Raul defendeu parcialmente e o brasileiro Juary, cria do Santos, chegou para abrir o placar em favor do time italiano.

    No meio do primeiro tempo, Júnior bateu o escanteio da esquerda, até a segunda trave, para a cabeçada de Leandro, que devolveu no meio e deixou vivo a jogada. Robertinho também cabeceou, oferecendo ao Flamengo o gol do empate. Já no segundo tempo, Andrade deu um bolão nas costas da defesa italiana, Baltazar chegou antes do goleiro e fez o gol da virada, o gol da vitória. Flamengo estreava no torneio de pé direito e recebeu os elogios da imprensa italiana, o Corriere dello Sport avaliando com um 7,5 o goleiro Raul e o lateral Júnior, quando o técnico Eugenio Bersellini elegia a dupla de laterais Leandro – Júnior com a maior do mundo. Com essa vitória no campo adversário contra um gigante europeu, Flamengo mostrava que, mesmo sem Zico, ainda era um time poderoso, capaz de vencer qualquer um.

  • Jogos eternos #196: Flamengo 2×1 Vasco 1987

    Jogos eternos #196: Flamengo 2×1 Vasco 1987

    Eu já falei aqui que o Fla-Flu é meu clássico favorito no futebol, mas nada supera a rivalidade entre Flamengo e Vasco, que começou em 1923 com vitória 3×2 do Flamengo, um jogo eterno no Francêsguista. Faz mais de 100 anos que os dois times lutam e disputam grandes duelos e títulos. O ápice da rivalidade, ao menos de um nível técnico, foi nas décadas de 1970 e 1980, com dois grandes ídolos, que misturavam classe dentro e fora do campo, Roberto Dinamite para Vasco e Zico para Flamengo.

    Vamos então para hoje de um Clássico dos Milhões no Brasileirão, um dos últimos combates entre Zico e Dinamite. No início de 1987, Zico ainda se recuperava de uma operação no joelho e Sócrates pendurou as chuteiras, sem brilhar muito com o Manto Sagrado. No meio do ano, Zico voltou para a reta final do campeonato carioca, mas Flamengo perdeu a final contra o Vasco de Tita e do técnico Sebastião Lazaroni, que foi demitido do Flamengo no início do ano. Após o campeonato carioca, o time realizou uma excursão nos Estados Unidos e Zico, mais uma vez lesionado no joelho, voltou a treinar com os juvenis, com toda a humildade e experiência dele. Lá, reencontrou o técnico de base que também foi interino entre Lazaroni e Antônio Lopes, um certo Carlinhos.

    No segundo semestre, veio o campeonato nacional, a polêmica Copa União, também um dos campeonatos brasileiros mais fortes da história. De novo, talvez clubes como Guarani, Bangu, Athletico Paranaense e o próprio Sport mereciam jogar a Série A, mas tinha que brigar com os gigantes no início e o quadrangular final imposto pela CBF não fazia sentido. Para a abertura do campeonato nacional, teve um Flamengo x São Paulo, em homenagem e agradecimento aos dois clubes que mais lutaram para a realização da Copa União. Hoje é até uma piada ver torcedores são-paulinos desmerecer esse torneio. Enfim, em campo, São Paulo venceu 2×0 e o técnico rubro-negro Antônio Lopes não resistiu a pressão e a fúria dos torcedores, saiu do clube.

    Para substituir Antônio Lopes, o nome de quase sempre, Mário Zagallo, foi cogitado, mas o presidente Márcio Braga preferiu um antigo ídolo como jogador, um homem que já foi técnico interino em 1983 e no próprio ano de 1987, o Carlinhos. Depois de tocar música no meio de campo do Flamengo nos anos 1960, o Violino Carlinhos era efetivado como técnico e podia ser o maestro de um time que tinha quase só craques, apesar das transferências de Mozer, Marquinho e Adílio durante o ano. O primeiro teste de Carlinhos era mais que um teste, era o clássico, de milhões e que vale ainda mais que milhões. Durante o ano de 1987, Flamengo fez 4 jogos contra Vasco sem sequer marcar um gol: 3 vezes um 0x0 e em seguida a derrota 1×0 na final do campeonato carioca.

    No 20 de setembro de 1987, para o primeiro de muitos jogos como técnico efetivo, o eterno Carlinhos escalou Flamengo assim: Zé Carlos; Jorginho, Leandro, Edinho, Leonardo; Andrade, Aílton, Zinho, Zico; Renato Gaúcho, Bebeto. O Flamengo lutou muito durante o campeonato com lesões de alguns jogadores, como Zico claro, mas também Bebeto, Edinho e Leandro, este último sofria de artrose e tendinite, o que faria dizer ao doutor Giuseppe Taranto que “cada partida que Leandro disputa é uma obra de arte do departamento médico”. Mas por ironia, o primeiro time escalado pelo Carlinhos tinha sua força máxima, ainda mais considerando que entraram no decorrer do jogo o jovem Aldair e um velho conhecido, o atacante Nunes. Foi exatamente o mesmo time que triunfou meses depois do Internacional para conquistar o Brasileirão.

    Do lado do Vasco, mesmo com as saídas na Europa de Tita e Dunga, o time era muito bom, principalmente no ataque com uma dupla de sonhos: Roberto Dinamite – Romário. Difícil de fazer melhor que esses dois juntos, mesmo com os grandes companheiros que teve Romário, Stoitchkov no Barcelona, Sávio no Flamengo ou Ronaldo e Bebeto na Seleção. Romário estava em grande forma, fazendo na primeira rodada os 3 gols da vitória 3×0 sobre Bahia. Tinha dois grandes times em campo, mas o público no Maracanã foi modesto, com 28.682 pagantes, talvez por causa da incerteza do horário do jogo, mais um conflito entre a CBF e o Clube dos Treze. Jogo começou e Flamengo dominou o início, com a dupla Renato Gaúcho – Bebeto mais destacada. Do lado vascaíno, Geovani fez um belo chute de fora da área, mas Zé Carlos defendeu. O jogo era bastante animado, só faltava um gol, que finalmente chegou no final do primeiro tempo. Mais uma vez, jogada começou do lado esquerdo, com bola nos pés de Renato Gaúcho, que infernizava a defesa do Vasco. Ganhou de Geovani na corrida e cruzou alto, enganando o goleiro Acácio. Bebeto cabeceou e abriu o placar, era o fim de uma série de mais de 900 minutos sem tomar gol para Acácio. Depois de um campeonato carioca discreto, Renato Gaúcho brilhava enfim, e muito, com o Manto Sagrado. Quanto ao Bebeto, foi um dos apenas 2 gols que fez durante a primeira fase, mas se redimiu, e muito, na fase final.

    O final do primeiro tempo foi ainda mais animado, com Geovani distribuindo socos para Edinho e Zé Carlos. O juiz Aloísio Felisberto da Silva, que substituiu o pressionado Dulcídio Wanderley Boschilia na última hora, não o expulsou. No início do segundo tempo, Luís Carlos e Vivinho combinaram na direita, Roberto Dinamite cortou o cruzamento de Vivinho, Zé Carlos desviou, bola bateu na trave e seguiu seu caminho sobre a linha do gol, sem a ultrapassar. Nem Roberto Dinamite acreditava ao gol, mas o bandeirinha achou um gol e o juiz validou erroneamente o lance. Nem toda a fúria justificada dos jogadores rubro-negros serviu para impedir o empate do Vasco.

    Mas há um Deus do futebol no Céu e um Deus do futebol na Terra, Zico. Um Deus que podia errar às vezes, Zico perdeu um gol incrível, sozinho, quase em cima da linha. Prova que até os melhores podiam errar, Romário também perdeu um gol, razoavelmente fácil para o artilheiro que era. Incrivelmente, Geovani agrediu mais uma vez Edinho e finalmente foi expulso, saindo do campo com sinal de cruz. Deus se aproximava do Maracanã. Depois da agressão, Edinho teve que sair, e Carlinhos mostrou uma primeira vez como técnico do Flamengo que era predestinado. Queria também substituir o Zinho pelo Nunes, mas o quarto juiz (o quinto?) errou e mostrou a plaqueta de camisa 9, que pertencia ao Bebeto. Já no banco, Bebeto ficou irritado, Zinho por sua vez ficou em campo. E minutos depois, Zinho roubou uma bola nos pés de Donato, acelerou, invadiu a grande área e sofreu falta de Paulo Roberto. Pênalti para Flamengo.

    E finalmente chegou Deus no Maracanã. Antes do pênalti, torcedores vascaínos invadiram o campo e, na marca do pênalti, o goleiro Acácio foi bater um papo com Zico. Não se sabe o que falou, só que Zico “não esqueceria nunca”. Finalmente o juiz apitou, Zico bateu certo, com o que precisava de precisão e potência. Gol do Flamengo. Com toda a classe habitual de Zico, o Galinho foi abraçar o goleiro Acácio. Momentos depois, o juiz apitou o fim do jogo, consagrando a vitória do Flamengo, mais uma vez graças ao Zico. Era uma estreia de gala para o técnico Carlinhos, com triunfo no Clássico dos Milhões. O início foi perfeito, o final seria ainda mais.

  • Jogos eternos #195: Flamengo 3×0 Ponte Preta 1999

    Jogos eternos #195: Flamengo 3×0 Ponte Preta 1999

    Finalmente, Flamengo volta em campo hoje, na Copa do Brasil. Na ida, derrotou Bahia 1×0 na Fonte Nova e está em boa posição para se classificar nas semifinais. Para o jogo eterno do dia, podia escolher a Copa do Brasil de 1990 ou 2000, quando Flamengo se classificou em cima do Bahia depois de jogo de ida na Fonte Nova. Mas finalmente vou de outro jogo de Copa do Brasil, quando venceu 1×0 na ida no campo do adversário, a Ponte Preta em 1999.

    Flamengo estreou na Copa do Brasil de 1999 com um 3×3 no campo do Botafogo de João Pessoa, na Paraíba, um jogo eterno no Francêsguista. Se classificou com vitória no Maracanã e na fase seguinte, derrotou na ida a Ponte Preta, Leandro Machado fazendo o único gol da partida. Para o jogo de volta, no 7 de abril de 1999, o técnico Carlinhos escalou Flamengo assim: Clemer; Pimentel, Luís Alberto, Fabão, Marco Antônio; Jorginho, Vagner, Beto, Rodrigo Mendes; Leandro Machado, Romário.

    Não aconteceu muitas coisas no primeiro tempo, vamos então diretamente para o início do segundo tempo, quando um chute de Vagner foi desviado para escanteio. Detalhe, antes do escanteio, o narrador Luiz Carlos Júnior falou isso: “O Caio gosta de treinar no gol porque ele acha que se um dia o Carlinhos já tiver feito todas as substituições, ele pode jogar no gol”. Aconteceu exatamente isso na mesma temporada de 1999, alguns meses depois, num jogo contra Gama que ainda devo eternizar aqui. Voltando ao escanteio contra a Ponte Preta, Beto cobrou, o goleiro Alexandre falhou, Luiz Alberto cabeceou e Leandro Machado esticou a perna para fazer seu terceiro gol da competição.

    No meio do segundo tempo, outro escanteio do Flamengo, agora da esquerda. De novo Beto cobrou, bola chegou até a segunda trave, Romário dominou de peito e, numa velocidade impressionante, esticou a perna antes da chegada do goleiro para fazer o segundo gol do Flamengo, quase assegurando a classificação. A rapidez do raciocínio na grande área era uma coisa de poucos, muito poucos, quase só de Romário. E na sequência do segundo gol, veio o terceiro, apenas 90 segundos depois. E, como já aconteceu várias vezes antes, como acontecerá depois, a razão dessa crônica tem apenas um nome, Romário, e um momento de glória, um golaço.

    Jogada começou nos pés de Caio, que abriu na direita para Romário. Já no domínio da bola, o Baixinho eliminou um adversário. Como o artilheiro que era, voltou em direção ao gol, fixou um zagueiro, o outro já driblado voltou para dar apoio. “Tá querendo mais o Baixinho” falou Luiz Carlos Júnior. E Romário fez música com as pernas, com o pé direito deixou a bola no pé direito e imediatamente fez o passe para Caio, que também ajudou na beleza da pintura. Caio entendeu a movimentação do Romário, dominou de sola e fez o passe de calcanhar para devolver ao Baixinho, ao gênio Romário. Uma finta de chute para deixar o goleiro no chão e ao mesmo tempo o chute leve, o toquinho de cobertura para fazer o golaço, mais um dele com o Manto Sagrado. “Uma conclusão de gênio, de quem sabe tudo na grande área”, um golaço que não me canso, nunca, de ver e rever, para admirar ainda mais a genialidade de Romário.

    Romário fazia duas coisas diferentes na mesma jogada, no mesmo toque, quando o jogador comum mal consegue fazer apenas uma. O Baixinho fazia a magia em campo e a alegria na geral, que não sabia que vivia seus últimos momentos. A torcida rubro-negra ainda perdeu seu ídolo antes do final da temporada, mas nunca esqueceu das jogadas geniais e dos golaços do Romário.

  • Jogos eternos #194: Olimpia 0x2 Flamengo 2001

    Jogos eternos #194: Olimpia 0x2 Flamengo 2001

    Eu vou continuar a combinar o jogo eterno do dia com o estádio do jogo da Seleção brasileira, hoje o estádio Defensores del Chaco em Assunção. Eu já eternizei há pouco um jogo eterno aqui, uma vitória 4×2 contra Cerro Porteño, com 3 gols e uma assistência de Zico no caminho da primeira Copa Libertadores do clube, em 1981. Eu vou hoje fazer um salto de 20 anos, para chegar no primeiro ano no terceiro milênio, em 2001.

    O adversário agora é Olimpia e a competição é a Copa Mercosul, que Flamengo venceu em 1999, antes de ver o arquirrival Vasco conquistar o título um ano depois. Em 2001, Flamengo começou a competição com 4 vitórias e um empate e já tinha certeza de fechar o grupo no primeiro lugar antes do jogo contra Olimpia. O técnico Zagallo, muito perto do fim da carreira, cedeu seu lugar ao preparador físico Luiz Carlos Prima, que conquistou o tetracampeonato do mundo em 1994 e escalou o time reserva do Flamengo para um jogo sem importância, ainda menos com o time lutando paralelamente contra o rebaixamento no Brasileirão. Assim, no 18 de outubro de 2001, Luiz Carlos Prima escalou Flamengo assim: Clemer; Bruno Carvalho, Leonardo Valença, Gilmar, Cássio; Jorginho, Carlinhos, Rocha, Fábio Augusto; Roma, Jackson.

    Antes do jogo, o efêmero canal de televisão PSN escolheu Roma como o jogador chave para o Flamengo. De 22 anos, o atacante paraense era chamado de Roma por causa de uma suposta semelhança com Romário. Estreou em 2000 e não chegou a jogar com o grande inspirador, mas tinha um futebol de dribles e de alguns gols, já tinha marcado na Copa Mercosul 2000, seu primeiro gol profissional, contra Vélez Sarsfield. Fez 7 gols no campeonato carioca 2001, depois disso fez apenas um gol, contra Santos, na temporada de 2001 até aqui.

    E com 32 minutos de jogo no Defensores del Chaco, Roma recebeu de Fábio Augusto, de costas resistiu a charge de Nogueira, girou, driblou um, driblou dois, e chutou de fora da área. Surpreendeu o goleiro e abriu o placar com um golaço. Ainda no primeiro tempo, Rocha abriu na esquerda para Roma, que deixou um zagueiro no chão e abriu o pé, vencendo o goleiro pela segunda vez do jogo.

    O jogador de 1,69 metro de altura fazia o 2 gols da partida e decidia o jogo sozinho, como fez tantas vezes Romário antes dele. Roma voltou a ser protagonista do Flamengo no final da temporada, fez o único gol de um jogo crucial contra Cruzeiro para se salvar do rebaixamento e, saindo do banco, fez o último gol rubro-negro do Brasileirão, segurando de vez a permanência na Série A com uma vitória contra Palmeiras. No início do ano 2002, já com a falência da ISL decretada e a saída de Edílson, Roma jogou os 120 minutos do segundo jogo da final da Copa Mercosul, contra San Lorenzo. Na disputa de penalidades, perdeu o pênalti que decretou o título para o time argentino. Existe muitos jogadores pequenos, dribladores e velozes, mas o Baixinho, apenas um…

  • Jogos eternos #193: Flamengo 2×0 Seleção Brasileira 1976

    Jogos eternos #193: Flamengo 2×0 Seleção Brasileira 1976

    Flamengo não joga esse fim de semana por causa dos jogos de seleções nacionais. Para a lembrança do dia, eu vou então de um jogo entre os dois maiores do mundo, o Flamengo e a Seleção brasileira, um amistoso que aconteceu em 1976 em homenagem ao Geraldo, que teria completado em 2024 seus 70 anos. Mas Geraldo morreu jovem, quando tinha apenas 22 anos. Uma perda gigantesca para o Flamengo e o futebol brasileiro.

    Eu já escrevi a crônica de Geraldo na categoria dos ídolos. Vamos então repetir aqui que o Geraldo Assoviador era um craque, um jogador de técnica e elegância, busto alto, cabeça erguida, olho na frente, nunca nos pés, que porém nunca se separaram da bola. No livro Grandes jogos do Flamengo, da Fundação ao Hexa, Roberto Assaf e Roger Garcia escreveram: “Em pouco tempo, Geraldo Assoviador ganhou apelido e também fama de craque. Jogava de cabeça em pé e desfilava um estilo sedutor, camisa fora dos calções, meiões arriados, colando a bola aos pés e arrebatando fã”. Era um “Beckenbauer tropical” para Rondinelli, “tinha o estilo do Didi” para Paulo César Caju, a parceria com Zico fazia renascer as tabelinhas com Pelé e Coutinho. Fala o próprio Zico no livro Zico conta sua história: “O Geraldo foi meu grande companheiro de tabelinhas. Um sabia o que o outro ia fazer e já lançava a bola apostando na capacidade do outro. Era incrível o domínio que ele tinha sobre a bola. Jogava sempre de cabeça em pé, não olhava para baixo – e a bola nunca desgrudava da chuteira dele […] Geraldo tinha fama de rebelde, de não gostar de treinar, de não cuidar da forma física. Mas era a rebeldia dele que surpreendia todo mundo em campo – principalmente os adversários. Era o que criava a jogada inesperada, aquela que saía do certinho e colocava a gente de cara pro gol, o passe de curva que encontrava o pé da gente no meio de uma moita de zagueiros, o lançamento a distância – como se fosse um milagre, com endereço do destinatário muito bem explicado. O Geraldo era um gênio”.

    Geraldo estreou no Flamengo em 1973, foi campeão carioca em 1974, estreou na Seleção brasileira em 1975. E veio o choque em 1976. Geraldo devia ser operado das amígdalas, uma operação simples, que Zico e Júnior passaram um pouco antes sem problema. Mas Geraldo tinha medo, escapou duas vezes da operação. Finalmente foi operado no 26 de agosto de 1976, quatro dias depois da morte do ex-presidente Juscelino Kubitschek num acidente automobilístico, que já deixou o Brasil em choque. E Geraldo morreu, aos 22 anos, na cadeira de dentista, de um choque anafilático. Foi um choque completo para o Brasil todo e o time do Flamengo em especial. Ainda Zico: “Estávamos em Fortaleza – o Flamengo havia disputado um amistoso. De repente, escutamos no rádio a notícia: o Geraldo, que havia ficado no Rio para extrair as amígdalas, morrera num acidente cirúrgico. Logo ele, que adiou essa operação o quanto pôde, que só topou fazer quase obrigado pelo clube. O Geraldo, meu melhor amigo na época… Não conseguia acreditar na notícia, até chegar de volta ao Rio, até ver o corpo dele sendo velado no Flamengo”.

    Zico é craque dentro e fora do campo, e para ajudar a família do amigo Geraldo, pediu a organização de um jogo amistoso entre Flamengo e a Seleção Brasileira no Maracanã, com renda destinada a família de Geraldo. No 6 de outubro de 1976, para a nomeada Taça Geraldo Cleofas Dias Alves, o técnico Cláudio Coutinho, ainda novato e que adorava Geraldo, escalou Flamengo assim: Cantarele; Dequinha, Rondinelli, Jayme, Júnior: Merica, Tadeu, Zico; Luís Paulo, Paulinho, Luisinho. Claro, vale repetir a escalação toda do Brasil: Félix; Carlos Alberto Torres, Marinho Peres, Piazza, Marco Antônio; Clodoaldo, Rivelino, Pelé; Paulo César Caju, Edu Coimbra, Jairzinho. Destaque para a participação de Edu Coimbra, irmão de Zico, e Pelé, que voltava na Seleção pela primeira vez desde a despedida em 1971, já que o jogo de despedida de Garrincha em 1973 não foi oficializado pela CBF.

    Em sinal de luto, Flamengo jogou com calções pretos. Inclusive, estou em favor de manter essa tradição, que começou com a morte do presidente Gilberto Cardoso em 1955, para jogos de luto, principalmente nesse ano de 2024, onde já perdemos Denir, Zagallo, Washington Apolinho e Adílio, todos ilustres rubro-negros em várias funções. No Maracanã, foram 142.404 pagantes, até o presidente Ernesto Geisel marcou presença na Tribuna de Honra. Era um jogo eterno, entre o maior clube do mundo e a maior seleção do mundo. E Flamengo atropelou a Seleção Brasileira, com apenas 5 minutos de jogo, Zico deixou Paulinho em condições ideais para fazer o gol e o atacante não decepcionou, vencendo Félix em apenas um toque. Seis minutos depois, vindo da esquerda, Luís Paulo repetiu a dose e fez o segundo gol do Flamengo. Talvez até Flamengo levou o pé para não envergonhar a seleção tricampeã do mundo num jogo que era, acima de tudo, para homenagear Geraldo. Mas também mostrou que Flamengo era um clube diferente, capaz de derrotar a maior seleção do mundo. Flamengo era uma própria seleção, ainda mais no segundo tempo quando entraram Júlio César Uri Geller, Andrade e Adílio. O maior time da história do clube ainda estava em formação.

    No segundo tempo, nenhum gol foi marcado e maior lance foi a pressão de Pelé, que ameaçou de parar de jogar enquanto a renda não for anunciada. E falou o alto-falante do Maracanã: 2 milhões e 382 mil cruzeiros. A família de Geraldo recebeu a ajuda financeira prometida, sem compensar a perda tão precoce de Geraldo, que teria sido uma peça tão importante e elegante no Flamengo que venceu tudo e todos, inclusive a Seleção de Pelé.

  • Jogos eternos #192: Coritiba 1×2 Flamengo 1996

    Jogos eternos #192: Coritiba 1×2 Flamengo 1996

    Sem jogo do Flamengo essa semana eu vou aproveitar do jogo da Seleção brasileira para escolher o jogo eterno do dia. A Seleção joga hoje no Couto Pereira e como Flamengo está perto de se classificar nas semifinais da Copa do Brasil, eu vou de um jogo da Copa do Brasil, no Couto Pereira, contra Coritiba.

    O ano é 1996 e o jogo valia para as oitavas de final da Copa do Brasil. Flamengo estreou na competição sem susto contra Linhares e continuou o caminho com jogo em Curitiba. Eu já escrevi sobre jogos no Couto Pereira, com gols de Zico em 1980 e 1988, com golaço de Romário em 1998. Dois anos antes, o Baixinho não participou do início da campanha na Copa do Brasil e no 28 de março de 1996, Joel Santana escalou Flamengo assim: Roger; Alcir, Jorge Luís, Ronaldão, Gilberto; Márcio Costa, Mancuso, Marques, Nélio; Sávio, Amoroso.

    O primeiro tempo foi equilibrado e os dois times tentaram de longe, o que não acontece tantas vezes nos dias de hoje. E no final do primeiro tempo, o Jorge Antônio chutou de longe, Roger falhou e Coritiba abriu o placar. Após o intervalo, o Coritiba teve oportunidades de fazer o segundo gol, sem fazer. Com hora de jogo, Marques invadiu a grande área, Gralak fez entrada criminosa e o juiz logicamente apontou o pênalti para o Flamengo. Na cobrança, o goleiro saiu do lado certo, mas Sávio foi perfeito, com o que precisava de precisão e potência para fazer o gol.

    E 13 minutos depois, Gralak, que passou depois na minha França jogando pelo Bordeaux, não aprendeu de seus erros. Pior, piorou. Bola chegou nos pés do Sávio e Gralak cometeu outro pênalti, vencido pela velocidade do Anjo Loiro. Gralak ganhou o cartão amarelo e ainda piorou, possuído pelo demônio, deu peitada no juiz, que o logicamente expulsou. No pênalti, Sávio trocou de lado, o goleiro também, de novo escolhendo o lado certo. Mas Sávio de novo perfeito, um chute forte, um chute preciso, um doblete.

    Flamengo ganhava de virada, mais uma vez com o ídolo Sávio fazendo a diferença.

  • Jogos eternos #191: Flamengo 3×2 Athletico Paranaense 2020

    Jogos eternos #191: Flamengo 3×2 Athletico Paranaense 2020

    O Pedro se machucou com a Seleção brasileira e está fora da temporada. No início, até achei que era uma fake news, uma piada de mau gosto depois de já tantas lesões no Flamengo nestas últimas semanas. Mas não, Pedro, artilheiro do Brasileirão com 11 gols e da temporada do futebol brasileiro com 30 gols, se rompeu o ligamento, vai faltar entre 9 e 12 meses de competição. Resta se lamentar e relembrar o passado. Queria homenagear Pedro com um golaço dele. Quatro meses atrás, o próprio jogador elegeu para a Fla TV seu top 10 de gols. Do top 3 de gols, 2 já foram eternizados no Francêsguista: de cavadinha contra La Calera e de bicicleta contra o Athletico Paranaense. O outro, de calcanhar contra Palmeiras, foi numa derrota que não quero lembrar. Eu vou então de outro jogo eterno, de outro golaço.

    Como quando fez o gol de bicicleta em 2022, o adversário do dia era o mesmo, o Athletico Paranaense, a competição era a mesma, a Copa do Brasil. Em 2020, Pedro chegou ao Flamengo para reforçar uma ataque que fez magia em 2019, com Éverton Ribeiro, Arrascaeta, Bruno Henrique e Gabigol. Era difícil ser titular e Pedro começou como reserva de luxo. Mas quando teve a chance de titular, não decepcionou, com 2 gols contra Bahia, numa vitória 5×3 eternizada há pouco tempo no blog. E depois, aproveitando da lesão de Gabigol, Pedro arrebentou, em 12 jogos como titular, fez 10 gols. Porém, não marcou contra o Athletico Paranaense no jogo de ida, quando Bruno Henrique fez o único gol na Arena da Baixada.

    Na volta, Flamengo podia até empatar no Maracanã e se classificar para as quartas de final da Copa do Brasil. No 4 de novembro de 2020, Doménec Torrent escalou Flamengo assim: Hugo Souza; Matheuzinho, Léo Pereira, Thuler, Filipe Luís; Willian Arão, Thiago Maia, Gerson; Éverton Ribeiro, Bruno Henrique, Pedro. Num Maracanã ainda vazio por causa da Covid, Flamengo precisou de 24 minutos para abrir o placar, Pedro precisou de 24 minutos para fazer magia. Na direita, Matheuzinho cruzou, o zagueiro do Athletico Pedro Henrique falhou, Pedro dominou, girou, chutou. Foi um tapa de craque, um chute perfeito, com o que precisava de ângulo para achar o ângulo, uma curva perfeita, com bola que morreu na gaveta, sem chance para Santos. Golaço.

    Dez minutos depois, de novo bola na direita, agora nos pés de Everton Ribeiro, que achou na grande área Matheuzinho, que cruzou, quem sabe chutou, certeza é que Santos apenas tocou levemente na bola, e Pedro estava na zona do artilheiro que é, para fazer o gol fácil, para fazer o doblete. No final do primeiro tempo, um golaço de Erick permitiu ao Athletico Paranaense de acreditar na virada.

    No segundo tempo, o golaço de Thiago Maia foi anulado pelo VAR e Pedro cedeu seu lugar no final do jogo, para a entrada em campo de Michael. E 4 minutos depois, Bruno Henrique tabelou com Lincoln, abriu o pé, mas não achou o mesmo ângulo que Pedro. Santos defendeu de forma parcial, Michael chegou e fez o gol certo da classificação, mesmo com gol de Bissoli para o Furacão no final do jogo.

    Flamengo estava nas quartas de final, mas o resto da história parece ser um prenúncio sombrio. Dois dias depois do golaço contra o Athletico Paranaense, Pedro era convocado na Seleção para suprir a ausência de Neymar por lesão. Uma convocação que foi muito mal recebida pela torcida rubro-negra, já que com calendário cheio, Pedro ia faltar os dois jogos das quartas de final da Copa do Brasil. Flamengo foi eliminado pelo São Paulo e pior, Pedro estreou com a Seleção brasileira, mas voltou machucado. Causou até um conflito entre Flamengo e a CBF, já que a confederação anunciou uma lesão leve, o que de fato não era tanta leve. No Flamengo, Pedro voltou a ser reversa do luxo, fez apenas 3 gols até o fim da temporada, mas Flamengo acabou sendo campeão. Agora titular absoluto, Pedro vai fazer muita falta essa temporada, mas estou de um otimismo completo quando se trata do Flamengo, e quero acreditar que pode ser a vez do Gabigol, quero acreditar que Flamengo no final vai ser o campeão.

  • Jogos eternos #190: Corinthians 1×3 Flamengo 1992

    Jogos eternos #190: Corinthians 1×3 Flamengo 1992

    Hoje Flamengo joga contra o Corinthians no campo deles, onde já ganhou várias vezes na história do Brasileirão. Com quase dois terços do campeonato já jogados e 4 pontos a menos que o líder, Flamengo não pode tropeçar e cada jogo é importante. Para trazer sorte, vamos de um campeonato com Flamengo campeão no final, o Brasileirão de 1992.

    No Brasileirão de 1992, Flamengo começou bem com 3 vitórias e 2 derrotas, mas depois passou 6 jogos sem vencer, o último uma derrota contra o Vasco de Edmundo e Bebeto. Era uma outra época do futebol brasileiro e todos os gigantes de Rio e São Paulo tinham grandes jogadores e times competitivos. Com a vitória ainda valendo apenas 2 pontos e a primeira fase de apenas um turno, o campeonato era muito, muito equilibrado. Vasco liderou a primeira fase com 26 pontos, 2 a mais que o segundo, Botafogo. E entre Botafogo e o 14o colocado, Fluminense, teve apenas 6 pontos de diferença. Os 8 primeiros se classificavam para as quartas de final, assim a vitória era muito cara, a derrota ainda mais.

    Flamengo reagiu com uma vitória sobre o Athletico Paranaense antes de ir para São Paulo, no Pacaembu. No 12 de abril de 1992, o técnico Carlinhos escalou Flamengo assim: Gilmar; Charles Guerreiro, Wilson Gottardo, Júnior Baiano, Fabinho; Marquinhos, Júnior, Uidemar, Zinho; Luís Antônio, Tôto. Do outro lado, tinha nomes como Ronaldo Giovanelli, Paulo Sérgio, Neto e Viola. O Flamengo ficava 4 pontos atrás do Corinthians e a classificação era longe de ser uma certeza. A vitória era obrigação.

    Esse jogo tem a marca de um Maestro, não mais de Capacete mas de cabelos grisalhos, um Vovô-Garoto, um ídolo no Francêsguista e no Flamengo, Júnior. Ao pedido do filho, voltou a vestir o Manto Sagrado em 1989, conquistou a Copa do Brasil em 1990, conquistou o campeonato carioca em 1991. Faltava conquistar o Brasileirão, que nesta altura, parecia mais um sonho impossível que uma possibilidade real. Mas era Júnior, craque de sempre e para sempre. Uma prova, aos 38 anos, voltou a ser convocado na Seleção brasileira para um amistoso contra a Finlândia, marcado três dias depois do jogo contra o Corinthians.

    E no Pacaembu, Júnior mostrou que ainda no tinha futebol nas pernas, com bola rolando ou na bola parada. Aos 23 minutos de jogo, uma falta a 30 metros de distância, bem no centro. O ambidestro Júnior usou a perna direita, a bola descolou, a curva foi perfeita, a bola pousou na parte interna da trave, morreu no gol. “A gente sabe da trajetória da bola, a gente sabe muitas vezes o que vai acontecer” falou simplesmente depois do jogo o veterano que sabia tudo da bola. Júnior fazia assim seu terceiro gol no campeonato, já um bom número para adicionar com as 5 assistências até então, mas a partir desse momento passou a ser ainda mais decisivo para chegar a um nível excepcional na reta final do campeonato.

    Dois minutos depois, Fabinho e Zinho tabelaram na esquerda, bola caiu nos pés de Marquinhos, bola saiu forte em direção do gol. Ronaldo tocou, sem impedir o gol. Ainda no primeiro tempo, de novo uma bola parada para o Maestro Júnior. Essa vez, tocou rápido para Zinho, de pivô para Fabinho, que colocou a bola diretamente na gaveta de Ronaldo. A torcida rubro-negra, que compareceu em bom número no Pacaembu, podia comemorar e relaxar, a alegria e a tranquilidade da torcida se misturavam com as do Violino Carlinhos, Flamengo tinha 3 gols de vantagem.

    No final do jogo, o Corinthians fez um gol, sem ameaçar Flamengo de perder os 2 pontos da vitória. O homem do jogo, claro, foi Júnior, que também foi o homem do campeonato. Foi tudo no Brasileirão de 1992, artilheiro e garçom, líder e capitão, Maestro e Vovô-Garoto, professor e exemplo. Liderou o time e a garotada ao penta, depois de dois jogos eternos na final contra Botafogo, 3×0 na ida, 2×2 na volta. Das bolas de ouro do Brasileirão desde 1971, Júnior fez em 1992 uma das campanhas mais marcantes, ao lado de Falcão em 1979, Zico em 1982 e Renato Gaúcho em 1987 par nós flamenguistas, Edmundo em 1997 e Romário em 2000 para os vascaínos, Alex em 2003 e Rogério Ceni em 2008 para os anos mais recentes. Com uma diferença, Júnior tinha 38 anos no passaporte, 20 anos nas pernas e séculos e séculos no conhecimento do futebol.

  • Ídolos #37: Fio Maravilha

    Ídolos #37: Fio Maravilha

    A crônica de hoje é sobre um cara que tem a cara do Flamengo. Basta ver uma foto dele e todo mundo vai perceber a mesma coisa: o grande sorriso, a boca larga e uma dentição nada comum. Mais que a cara do Flamengo, era a cara da geral, tão cheia de vida na época que jogou. Era o geraldino que busca a alegria no Maraca para esquecer das tristezas da vida. Mas reduzir Fio Maravilha a um sorriso seria um grande erro. Fio Maravilha foi um grande jogador, artilheiro e ídolo do Flamengo.

    João Batista de Sales nasceu no 19 de janeiro de 1945 em Conselheiro Pena, Minas Gerais. Nasceu numa família de futebolistas, seu irmão mais velho começou a carreira no Flamengo, onde jogou entre 1959 e 1962 antes de passar pelo Milan e Palmeiras. Quando Germano ainda jogava no Flamengo, Fio Maravilha, que apelido foda, chegou na Gávea, aos 15 anos. Estreou profissionalmente aos 20 anos na Fonte Nova, com derrota 3×0 contra Bahia. Fez seu primeiro gol no 1o de setembro de 1965, num 2×2 no Fla-Flu, na Taça Guanabara, na época torneio diferente do campeonato carioca. Uma semana depois, outro Fla-Flu, outro 2×2, outro gol de Fio Maravilha, agora no Torneio Rio – São Paulo.

    Fio Maravilha fez apenas 8 jogos no ano de 1965, nenhum no campeonato carioca, conquistado pelo Flamengo antes de um longo jejum. Em 1966, começou a chamar atenção, fazendo gols em amistosos no Brasil e até fora do país. Emelec, Barcelona de Guayaquil, Alianza Lima, Belenenses do Portugal ou West Bromwich Albion da Inglaterra foram algumas das vítimas do Fio. Em 1967, repetiu a dose contra times estrangeiros, incluindo o grande Barcelona, agora da Espanha, quando fez o único gol da partida, logo no primeiro minuto do jogo. No final do ano, Flamengo decepcionou no segundo turno do campeonato carioca, onde jogavam entre si os 8 melhores da primeira fase. Flamengo ganhou nenhum dos 6 primeiros jogos e corria o risco de fechar a fase na última colocação. Na última rodada, Fio foi o grande herói do Fla-Flu, seus 2 gols e 2 assistências para Dionísio e Reyes levaram Flamengo a uma vitória 4×1 e um sexto lugar, um pouco menos vergonhoso.

    Em 1968, um ano histórico no Francêsguista, Fio passou a fazer grande dupla com outro ídolo da Nação, o também negro Silva Batuta. Na biografia do jogador, Marcelo Schwob escreve: “Segundo Silva, Fio era um jogador surpreendente, fazendo jogadas de gênio e outras inexplicáveis. Em 1968, fizeram treinos de cobrança de falta: Fio partia para a bola e fingia que iria chutar, Silva vinha e finalizava. Nos treinos, deu certo, mas na partida contra o Botafogo, Fio tropeçou na bola e caiu… No entanto, faria uma grande partida. Deixava desconcertados mesmo os criticos de futebol, que não sabiam como analisá-lo. Numa jogada de contra-ataque num Fla-Flu, entrou livre e podia ter chutado, mas dificultou, driblou dois jogadores e só assim fez o gol. Aos poucos, a torcida percebia a afinidade de seu estilo louco e imprevisível com o sentimento rubro-negro”.

    Era assim o Fio, um jogador imprevisível porque jogava de improviso. “Eu faço firulas no jogo porque sei que quem escala a gente é a torcida e ela adora um passezinho de calcanhar…” falou uma vez o mineiro, já carioca na alma. Para Band, ainda falou: “Eu gostava muito de jogar com toques rápidos, algo que criava muito problema, pois nem sempre o toque rápido sai da maneira que esperávamos. Muitos não gostavam, achavam que eu queria inventar, mas era como eu gostava de jogar”. Fio enganava os adversários, os próprios companheiros e a torcida. Mas a torcida tinha certeza de alguma coisa: Fio era ídolo da Nação, principalmente por causa do estilo de jogo, cheio de ginga, de dribles e de erros. A torcida adora o craque que desequilibra com uma finta só, adota o perna de pau que joga com raça. Se Fio era craque ou perna de pau ninguém sabe, mas repito, Fio era ídolo da Nação.

    Fio voltou a fazer gol contra o Barcelona, agora no Camp Nou, e conheceu seu maior ano no Flamengo em 1970, fazendo 21 gols durante a temporada. O técnico era o autoritário Yustrich, adorava Fio e o chamava do “Bom Crioulo”. Fio brilhou já no início do ano, no tradicional Torneio internacional do Rio de Janeiro, quando abriu o placar na goleada 6×1 contra o time argentino de Independiente. Flamengo também goleou 4×1 a seleção romena, que jogou meses depois a Copa do Mundo, perdendo de forma honrosa 3×2 contra a Seleção de Pelé, Jairzinho & Cia. Com uma vitória 2×0 contra Vasco, Flamengo conquistou o Torneio internacional do Rio de Janeiro. Meses depois, agora na Taça Guanabara, Flamengo venceu de novo Vasco 2×0, com show de Fio, que fez os dois gols da partida. Na época, a Taça Guanabara ainda era uma competição à parte do campeonato carioca e Flamengo chegou na última rodada precisando de um empate contra Fluminense para ser campeão. E no Fla-Flu, na frente de 106.515 pagantes no Maraca, o “Bom Crioulo” abriu o placar, no final do primeiro tempo. Apesar de um gol de Jair para Fluminense, Flamengo conquistou a taça, que amenizou um pouco a seca de títulos no campeonato carioca. No campeonato nacional, ainda chamado de Torneio Roberto Gomes Pedrosa, Fio foi artilheiro do Flamengo com 7 gols, inclusive um golaço contra São Paulo e os dois gols da vitória 2×0 contra o Santos de Pelé, Carlos Alberto & Cia. Porém, Flamengo perdeu a classificação no quadrangular final por um miserável gol de diferença no saldo de gols para o benefício do Fluminense, que acabou sendo o campeão.

    Com esses gols, dribles, tropeços, bolas perdidas em campo, esses sorrisos e beijos para a torcida, Fio já era ídolo da massa flamenguista, aglutinada na geral. No Torneio do Povo 1971, que reunia o clube de maior torcida dos 4 grandes estados do futebol brasileiro, Flamengo começou muito mal, com nenhum gol nos 5 primeiros jogos! Na última rodada, Flamengo finalmente marcou, com 2 gols de Fio no 3×3 contra o Atlético Mineiro, Fio salvando de novo um campeonato decepcionante para Flamengo. No meio do ano, Fio se eternizou na história do Flamengo, ao lado de um jovem estreante, Arthur Antunes Coimbra, Nosso Rei Zico. O palco é o Maracanã, o adversário é o Vasco. Para seu primeiro jogo, Zico já foi decisivo, fazendo a assistência para Nei abrir o placar, mas o vascaíno Rodrigues empatou no final do primeiro tempo. O primeiro jogo de Zico merecia a vitória, ainda mais em cima do Vasco, e no minuto 45 do segundo tempo, Fio ainda não maravilha, mas já maravilhoso, chegou, desempatou, ofereceu a vitória ao Flamengo num jogo eterno.

    E Fio, como a mãe o chamava antes de toda uma Nação, virou Fio Maravilha, com data bem precisa, no 15 de janeiro de 1972. Era o início de uma nova década e, apesar da ditadura estar nos seus momentos mais duros e repressivos, havia esperança. Escreve Marcel Pereira em seu livro A Nação, como e por que o Flamengo se tornou o clube com a maior torcida do Brasil: “Embalada pela melodia dos dribles de Fio, a geração dos anos 70 começava a desabrochar em busca de mais liberdade de expressão, de maior ousadia sexual. Mais do que nunca o espírito contestador e abusado da juventude reluzia na sociedade. Com dinheiro no bolso, por conta do mais longo e mais intenso período de crescimento da economia do país, a rapaziada reluzia o carro novo, a namorada com o belo corpo a mostra nas praias e o orgulho pelo time de coração guardado para reluzir nas tardes de domingo no Maracanã. Em cada esquina, em cada praia, em cada botequim, em cada passeio no parque, vivia-se a intensidade de ser Flamengo. Em todos os lados se encontrava um flamenguista ou outro para ser feito de desconhecido íntimo”.

    O jogo que eternizou Fio Maravilha já foi eternizado no Francêsguista. O palco é o Maracanã, o adversário é o Benfica de Eusébio, sem Eusébio. E Flamengo andava sem Fio. “O Zagallo não era muito simpático ao meu futebol, ao meu estilo. Eu estava na reserva” explica Fio no livro Grandes jogos do Flamengo, de Roberto Assaf e Roger Garcia. Mas como falou o próprio Fio, às vezes é a torcida que escala. E a torcida flamenguista pediu Fio em campo, a Nação rubro-negra exigiu a presença de seu ídolo, Zagallo obedeceu, Fio entrou. Entrou e desequilibrou. Desequilibrou as pernas, os adversários, o jogo. Escreveram Roberto Assaf e Roger Garcia: “Aos 33 do segundo tempo, Samarone lançou Rogério, na direita. O ponteiro tabelou com Fio, que cortou Rui Rodrigues e Messias. Na saída do goleiro Zé Henrique, Fio deu mais uma finta, para ficar com a mera escancarada e marcar o gol da vitória”. Era o gol da vitória, o golaço, Flamengo era o campeão e Fio ainda mais o ídolo da Nação.

    E Fio virou Fio Maravilha, com um cansão composta pelo Jorge Ben Jor, presente no Maracanã neste dia e que eternizou o ídolo com uma letra que vale ser repetida integralmente aqui: “E novamente ele chegou com inspiração / Com muito amor, com emoção, com explosão em gol / Sacudindo a torcida aos 33 minutos do segundo tempo / Depois de fazer uma jogada celestial em gol / Tabelou, driblou dois zagueiros / Deu um toque, driblou o goleiro / Só não entrou com bola e tudo / Porque teve humildade em gol /Foi um gol de classe, onde ele mostrou sua malícia e sua raça / Foi um gol de anjo, um verdadeiro gol de placa / Que a galera, agradecida, se encantava / Foi um gol de anjo, um verdadeiro gol de placa / Que a galera, agradecida, se encantava / Filho Maravilha, nós gostamos de você / Ih-ih-ih-ih-ih-ih-ih / Filho Maravilha, faz mais um pra gente ver / Ih-ih-ih-ih-ih-ih-ih”. Na minha França, o cansão foi regravada, já no ano seguinte em 1973, pela cantora Nicoletta, apenas com o refrão “Fio Maravilha”, sem outra referência ao gol ou ao jogador ídolo do povo. Recentemente, em 2024, foi o grupo electro Bon Entendeur que fez outro cansão e prolongou a eternidade de “Fio Maravilha”.

    Depois do sucesso, teve briga na justiça entre Fio Maravilha e Jorge Ben Jor sobre direitos autorais, como explica o Fio: “Havia um amigo, já falecido, o Joaquim Reis, que era advogado de alguns jogadores, como o Jairzinho, o Rodrigues Neto e meu também. Um dia me perguntou: ‘O autor da música te botou como parceiro? Posso entrar em contato com ele para você ganhar alguma coisa?’. Disse que podia. Pouco depois, fui jogar em Vitória. Quando cheguei ao Rio, já estava um burburinho tremendo. Não tinha a intenção de processar. Mas não culpo o advogado. Se alguém cometeu um engano, fui eu, não ele, que era uma pessoa maravilhosa […] Contra o Benfica foi especial, porque disseram que o Fio fez gol de Pelé. Adorei, porque eu era comparado com um monte de perna-de-pau. Depois do meu pai, Pelé foi o meu maior ídolo”. No cansão, Fio Maravilha virou Filho Maravilha, mas o que importa é isso, Fio ficou maravilhoso para a Nação e teve sua noite de Pelé.

    Fio Maravilha fez em seguida um gol contra a Seleção da Hungria, mas passou depois 10 meses sem fazer gol! Reencontrou o caminho das redes no final do ano 1972 durante o Brasileirão e fez seu último gol com o Manto Sagrado contra CRB, no estádio Rei Pelé. Ainda jogou um pouco na temporada seguinte e fez seu último jogo com o Manto Sagrado no 7 de fevereiro de 1973, contra Bahia na Fonte Nova. Por coincidência, o mesmo adversário e o mesmo estádio que no primeiro jogo, no 21 de abril de 1965. O ciclo era completo e fechado, acabado com 294 jogos e 84 gols, e mais, uma ligação muito especial com a torcida.

    Fio ainda passou por vários clubes brasileiros e voltou nas lembranças do torcedor rubro-negro em 1975, num Flamengo x São Cristóvão no Maracanã. Flamengo abriu 2×0 com 2 gols de Zico, mas Fio liderou o time do São Cristóvão para uma vitória 3×2, fazendo as assistências para os 3 gols do time! O Fio ainda era uma Maravilha… Fechou a carreira nos Estados Unidos e ficou no país do Tio Sam, onde trabalhou numa pizzaria como entregador. O ídolo do povo era humilde. Também selou a paz com o Jorge Ben Jor, o ídolo do povo não era vingativo, e Filho Maravilha voltou a ser Fio Maravilha.

    Fio Maravilha, ao lado de Silva Batuta e Doval, foi o maior ídolo da Nação numa época que era órfã de títulos importantes. Antes de acompanhar o surgimento do maior ídolo de todos os tempos, Zico, Fio era um motivo para chegar ao Maracanã, vibrar na geral, se maravilhar com suas maravilhas. Fio Maravilha foi mais que um ídolo para a Nação, já um privilégio de poucos, ele foi a personificação do torcedor rubro-negro, façanha de muitos poucos. Obrigado Fio Maravilha, nós gostamos de você.

  • Jogos eternos #189: Bahia 3×5 Flamengo 2020

    Jogos eternos #189: Bahia 3×5 Flamengo 2020

    Flamengo joga hoje contra Bahia, na Copa do Brasil, na Fonte Nova. Já escrevi durante a semana sobre um jogo na Fonte Nova, primeiro gol de Zico com o Manto Sagrado, em 1971, mas vou repetir a dose, com um jogo mais recente. O jogo de hoje marca mais um reencontro entre Flamengo e Éverton Ribeiro, que já recebeu linda e justa homenagem da torcida rubro-negra em junho. Mas escrevi pouco sobre o Miteiro, então vou escolher um jogo em Salvador, onde brilhou com o Manto Sagrado.

    Éverton Ribeiro ficou às vezes um pouco atrás do trio Arrascaeta – Bruno Henrique – Gabigol. Foi menos decisivo, mas tão importante. Éverton Ribeiro é um facilitador das coisas, não é por acaso que Bahia faz uma grande temporada esse ano. Além disso, o futebol de Éverton Ribeiro tem uma beleza plástica para mim até superior à de Arrascaeta. Já falei que adoro acompanhar o futebol brasileiro para ver as jovens promessas em acensão na carreira, que depois vão brilhar na Europa, e também para continuar a ver os antigos craques, de volta ao Brasil depois do sucesso na Europa. Mas também me sinto privilegiado aos demais europeus para ver jogadores diferentes, com ainda alma do futebol brasileiro, mesmo alguns sendo gringos.

    Nas minhas peladas, gosto de jogar como camisa 10, fazer meus passes e meus dribles, jogar de sola, de bico, de trivela, de três dedos. Fazer o chapéu, a matada de peito, a caneta, roleta, corta-luz. É meu estilo de futebol e adoro ver o futebol de Raphael Veiga e Ganso hoje, de Darío Conca e Jorge Valdivia uma década atrás. E para nós flamenguistas, outros dois gringos, Arrascaeta hoje, Petkovic uma década atrás. São jogadores quase, ou às vezes absolutamente, não conhecidos na Europa, assim me sinto privilegiado para o futebol desses jogadores, de os conhecer, de ver e rever as magias que fizeram em campo. Éverton Ribeiro faz parte desse tipo de jogadores, sem carreira na Europa, mas um jogador que faz a diferença com um toque, um domínio, um chute, um passe, um drible. É o jogador que vale a pena de acordar no meio da noite, pesadelo dos brasileiros que moram na Europa, para assistir ao futebol dele. É o jogador que vale a pena de pagar o ingresso para ir ao estádio. Já quando foi bicampeão brasileiro com o Cruzeiro, eu adorava Éverton Ribeiro, e passei a adorar ainda mais quando assinou com o Flamengo, em 2017.

    E Éverton Ribeiro ganhou tudo com o Flamengo, conquistou todos com seu futebol de classe, de inteligência, de técnica, mesmo sem ser muito decisivo. Em 2020, antes do jogo contra Bahia, passou 13 jogos consecutivos sem nenhum gol ou assistência. O Flamengo começou o Brasileirão 2020 de forma bem mediana: 2 vitórias, 2 empates, 2 derrotas. No 2 de setembro de 2020, o técnico espanhol Domènec Torrent, que chegou no clube um mês antes com a tarefa difícil, talvez impossível, de substituir Jorge Jesus, escalou Flamengo assim: Gabriel Batista; Isla, Rodrigo Caio, Léo Pereira, Renê; Willian Arão, Thiago Maia, Arrascaeta; Éverton Ribeiro, Pedro Rocha, Pedro.

    E no Pituaçu, Flamengo começou muito bem, no primeiro minuto do jogo, o próprio Éverton Ribeiro teve grande oportunidade do gol, mas chutou para fora. Na saída da bola, Fortaleza saiu muito mal, a Globo ainda mostrava o replay do chute de Éverton Ribeiro quando Pedro pressionou nos pés do goleiro e se jogou nos pés dele para tocar a bola e abrir o placar. Pela primeira vez, Pedro era titular num jogo do Brasileirão com a camisa do Flamengo e não decepcionava a torcida, fazendo gol com apenas 2 minutos de jogo. E com 15 minutos, Arrascaeta achou Pedro, na meia-lua. Pedro fez o domínio absolutamente perfeito, se distanciando um pouco do zagueiro para abrir espaço. Pedro chutou, bola tocou na trave esquerda, tocou na trave direita e finalmente entrou no gol. Golaço, o goleiro apenas olhou, Pedro já fazia o doblete.

    Bahia reagiu e fez o gol com mais um bate-bate, o chute de Rodriguinho tocou no travessão, quicou no chão e finalmente entrou no gol. E a chuva impressionante na Bahia se transformou em chuva de gols no Pituaçu. Cinco minutos depois do gol do Rodriguinho, um golaço coletivo para Flamengo. Jogada começou nos pés do Éverton Ribeiro, para Pedro, em um toque de calcanhar para Isla, em um toque para Éverton Ribeiro. E o Miteiro mágico mostrou mais uma vez que era um jogador diferente, de improvisação e de imprevisibilidade . Em um toque de três dedos, completou a tabelinha alta na grande área para Isla que cruzou, de novo em um toque, para a cabeçada vitoriosa de Arrasca. Um autêntico golaço, 5 passes, 5 toques e marca de gênio de Éverton Ribeiro. Ainda no primeiro tempo, o goleiro flamenguista Gabriel Batista falhou duas vezes e Élber aproveitou para fazer o gol. O intervalo serviu para secar um pouco as roupas e respirar depois de 45 minutos de futebol de alta qualidade.

    E segundo tempo voltou com chuva, voltou com gol, voltou com golaço. Se no primeiro tempo o golaço foi coletivo, no segundo tempo, o golaço, com apenas 3 minutos de bola rolando, foi individual. E de novo, teve a inspiração genial de Éverton Ribeiro, que recebeu a bola na direita. Cercado por Zeca e Daniel, Éverton Ribeiro mostrou seu repertório infinito de futebol. Toque de bico, drible curto, finta sem tocar a bola, toque de calcanhar, pedalada, o Miteiro eliminou os dois sem os deixar tempo de reagir, nem de entender o que aconteceu. Juninho chegou bem na bola e chutou para fora, impedindo Éverton Ribeiro de brilhar mais. Por segundos apenas. Na lateral de Isla, Éverton Ribeiro foi cercado de novo por Zeca e Daniel. E passou de novo com a mesma facilidade. No domínio de joelho, domínio reservado apenas aos craques, Éverton Ribeiro levantou a bola, girou e passou em cima do adversário. Com apenas um toque, Éverton Ribeiro eliminou dois jogadores. Deixou a bola cair uma vez no chão e chutou curvado, encobrindo o goleiro. Um golaço, mais um para Éverton Ribeiro, que no final da temporada, recebeu o prêmio do gol mais bonito do Brasileirão 2020. E mais impressionante é que não foi por esse gol, mas por um gol marcado apenas três dias depois, o de cavadinha contra Fortaleza. Esse gol contra Bahia também merecia o prêmio, pode assistir mil vezes, como pode assistir mil vezes aos dribles no mesmo lance, vai se maravilhar mil vezes.

    E mais, Éverton Ribeiro dedicou o gol contra Bahia ao filho recém-nascido, Antônio nasceu apenas uma semana antes do jogo. Claro, a Nação rubro-negra, já apaixonada pelo primeiro filho de Éverton Ribeiro e Marília, o Baby Guto, ainda não sabia quantas alegrias ia trazer o Totói, torcedor símbolo do Flamengo, para alguns a reencarnação de uns dos 6 remadores. Conquistou todos com seu amor natural pelo Flamengo e suas provocações aos rivais. Confesso que estava em favor da renovação do Éverton Ribeiro no Flamengo para, além do futebol dele, ter mais um ano Totói na torcida. Ainda jovem, eu tinha medo de ele perder esse amor pelo Flamengo. Mas sua alma é colorida de rubro-negro, mesmo longe de Rio, ainda tem esse amor pelo clube, mostrou isso já na presentação de Éverton Ribeiro no Bahia quando cantou o hino do Flamengo, mostrou depois, com comemoração à la Gabigol, provocação ao Botafogo com o chororô, volta ao Maraca para “ver o papai e o Flamengo”. Totói ainda é nosso, ainda é Flamengo. Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte.

    Voltando ao jogo contra Bahia, Flamengo só precisou esperar cinco minutos depois da obra de arte de Éverton Ribeiro para fazer o quinto gol do dia, com Arrascaeta no início e na conclusão, o craque uruguaio tabelou na grande área com Pedro Rocha e finalizou sem chance para o goleiro Anderson. No finalzinho do jogo, Daniel deixou a derrota baiana um pouco menos severa, com outro belo gol, um chute na gaveta de Gabriel Batista. O placar final 5×3, o jogo foi tão bom que fez esquecer que se jogava sem público. O jogo de volta, no Maracanã no final do ano, também foi um jogaço, um jogo eterno no Francêsguista, com vitória 4×3 do Flamengo. E no final do campeonato, Flamengo foi campeão, Éverton Ribeiro se juntou a uma lista que tem Júnior, Andrade e Diego, para citar apenas rubro-negros, dos jogadores que conquistaram 4 vezes o Brasileirão. Éverton Ribeiro brilhou durantes anos no futebol brasileiro, durante 394 jogos com o Manto Sagrado, e continua a brilhar, agora longe do Flamengo. Mas como o filho Totói é para a eternidade flamenguista, Éverton Ribeiro é para sempre ídolo do Flamengo.

O autor

Marcelin Chamoin, francês de nascimento, carioca de setembro de 2022 até julho de 2023. Brasileiro no coração, flamenguista na alma.

“Uma vez Flamengo, Flamengo além da morte”